Os recursos que questionam a anulação do júri da Boate Kiss serão enviados ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília. A 2ª Vice-Presidência do TJ-RS admitiu os recursos (Especial e Extraordinário) do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) que questionam a anulação do júri, ocorrida em 3 de agosto de 2022, pela 1ª Câmara Criminal da Corte. Com isso, caberá às Cortes Superiores (STJ e STF) decidirem sobre os pleitos da acusação, que busca manter validada a condenação dos quatro réus.
O anúncio foi feito pelo 2º Vice-Presidente do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, desembargador Antonio Vinicius Amaro da Silveira, que recebeu nesta terça-feira (28) cinco representantes da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM) durante audiência na sede do Tribunal, em Porto Alegre. O envio dos recursos para as Cortes Superiores deve acontecer nos próximos dias.
Os integrantes da associação colocaram quatro banners na calçada do Tribunal na avenida Borges de Medeiros com as seguintes mensagens: "A Tragédia da Boate Kiss: A vergonha do Poder Judiciário do RS" e "Andrielle: Nossos pais lutam por justiça, para que vocês não sejam as próximas vítimas". Do outro lado da avenida, na praça em frente ao Poder Judiciário, foi colocada a faixa: "10 anos da Kiss: Até quando??. O incêndio na casa noturna em Santa Maria no dia 27 de janeiro de 2013 resultou na morte de 242 pessoas e deixou 636 feridos.
Silveira, que é responsável por analisar o enquadramento do juízo de admissibilidade dos recursos às Cortes Superiores, informou aos familiares sobre a decisão, que já está publicada, e destacou que o Tribunal gaúcho, sem adentrar ao mérito, é sensível às questões que envolvem a sociedade, e a que se refere a tragédia ocorrida na Kiss, está entre as mais importantes. Flávio Silva, ex-presidente da AVTSM e pai da jovem Andrielle, disse que os familiares e amigos das vítimas pretendem realizar um acampamento em Brasília com o objetivo de que as Cortes Superiores analisem os recursos com urgência. "Vamos ficar em vigília no STJ em Brasília por tempo indeterminado", ressaltou.
Silva lembrou que Andrielle havia feito vestibular para Desenho Industrial e que junto com mais quatro amigas comemorava o seu aniversário de 22 anos - na festa realizada no dia 26 de janeiro de 2013. "O sofrimento é muito grande nesses dez anos. Estamos aqui lutando por memória e justiça e pedindo ao STJ prioridade no julgamento dos recursos", acrescentou. Na frente do prédio do Tribunal, Silva afirmou que todos lutam pela dignidade do nome e da memória dos filhos vítimas da tragédia. Ele estava acompanhado da esposa, Ligiane Righi, pela advogada da Associação, Tâmara Soares, e pela vice-presidente da Associação, Marilene Santos Soares.
O caso Kiss
No dia 27 de janeiro de 2013 a Boate Kiss sediou a festa universitária denominada “Agromerados”. No palco, se apresentava a Banda Gurizada Fandangueira, quando um dos integrantes (o vocalista) disparou um artefato pirotécnico, atingindo parte do teto do prédio, que pegou fogo. O incêndio, que se alastrou rapidamente, causou a morte de 242 pessoas e deixou 636 feridos. As responsabilidades são apuradas em seis processos judiciais. O principal tramitou na 1ª Vara Criminal da Comarca local, foi dividido e originou outros dois (falso testemunho e fraude processual).
No processo criminal, os empresários e sócios da Kiss, Elissandro Callegaro Spohr e Mauro Londero Hoffmann, o vocalista da Banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos e o produtor musical Luciano Bonilha Leão, respondem por homicídio simples (242 vezes consumado, pelo número de mortos; e 636 vezes tentado, número de feridos). Foi concedido o desaforamento (transferência de julgamento para outra comarca) a três réus - Elissandro, Mauro e Marcelo - para serem julgados em uma Vara do Júri da Comarca de Porto Alegre. Luciano foi o único que não manifestou interesse na troca, mas, através de um Pedido de Desaforamento do Ministério Público, o TJ-RS determinou que ele se juntasse aos outros, em um julgamento único, na Capital.
No dia 1° de outubro de 2021 teve início o júri do caso Kiss. Os quatro réus foram condenados pelo Conselho de Sentença do Tribunal do Júri, no dia 10 de dezembro às seguintes penas: Elissandro Callegaro Spohr: 22 anos e 6 meses; Mauro Londero Hoffmann: 19 anos e 6 meses; Marcelo de Jesus dos Santos: 18 anos; e Luciano Bonilha Leão: 18 anos. As partes apelaram e, no dia 3 de agosto de 2022, a 1ª Câmara Criminal do TJ/RS anulou o júri e revogou a prisão dos quatro acusados. O processo se encontra em fase recursal.