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Saúde

- Publicada em 11 de Julho de 2022 às 19:28

Endometriose e DIU: entenda como o método contraceptivo pode auxiliar no tratamento do distúrbio

Para alguns casos, o DIU hormonal pode ser utilizado para amenizar os sintomas da endometriose

Para alguns casos, o DIU hormonal pode ser utilizado para amenizar os sintomas da endometriose


Image Point Fr/Shutterstock/JC
Na última semana, a cantora Anitta levantou o debate sobre uma questão central para a saúde da mulher: a endometriose. Ao compartilhar que foi diagnosticada com a doença inflamatória, a artista deu o estopim a uma conversa nas redes sociais sobre possíveis tratamentos e formas de amenizar os sintomas causados pelo distúrbio. Um deles é a cirurgia - que é o caminho pelo qual Anitta seguirá - e, em alguns casos, o Dispositivo Intrauterino (DIU) pode auxiliar as mulheres na luta contra a endometriose.
Na última semana, a cantora Anitta levantou o debate sobre uma questão central para a saúde da mulher: a endometriose. Ao compartilhar que foi diagnosticada com a doença inflamatória, a artista deu o estopim a uma conversa nas redes sociais sobre possíveis tratamentos e formas de amenizar os sintomas causados pelo distúrbio. Um deles é a cirurgia - que é o caminho pelo qual Anitta seguirá - e, em alguns casos, o Dispositivo Intrauterino (DIU) pode auxiliar as mulheres na luta contra a endometriose.
A endometriose acontece quando o tecido que reveste a cavidade do útero - o endométrio - começa a migrar para fora do órgão, e vai em direção aos ovários, trompas, bexiga ou intestino. Os principais sintomas dessa alteração ginecológica são cólicas menstruais intensas, dor durante as relações sexuais e no período menstrual e dificuldade de engravidar.
O problema atinge 10% das brasileiras em idade reprodutiva, segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Uma das formas de tratar a endometriose é por via cirúrgica, com a realização da videolaparoscopia, que consiste em fazer pequenos buracos no abdômen para inserir instrumentos que permitem que se retire ou queime o tecido endometrial que está danificando outros órgãos.
Porém, para alguns casos, o DIU hormonal pode ser utilizado para amenizar os sintomas da endometriose. A médica ginecologista Rosana Perin explica que o DIU hormonal não irá bloquear a função ovariana, mas atrofiar a camada interna do útero. “Então eles não têm essa função de bloqueio de ovulação, muitas mulheres vão ter o ciclo bem marcadinho: a percepção da ovulação, a diferença de muco, só não tem o sangramento, na maioria das mulheres usuárias de DIU hormonal”, explica a ginecologista.
Atualmente, os dispositivos intrauterinos disponíveis no mercado se dividem entre hormonais e não-hormonais. “Hoje, a gente tem os DIUs hormonais, que são dois basicamente: o Mirena e o Kyleena, que duram cinco anos os dois. E tem os DIUs não-hormonais: o clássico DIU de cobre e tem o de prata e cobre, que são muito semelhantes de uso, mas tem tempos de durabilidade diferentes. O DIU de cobre vai durar dez anos, que é o de maior tempo, e o DIU de prata e cobre, cinco”, afirma Rosana.
As mulheres que possuem endometriose precisam optar pelo DIU hormonal, que libera pequenas quantidades de hormônios e provoca uma atrofia da camada interna do útero, o que inibe o desenvolvimento do tecido endometrial e provoca uma regressão dos problemas causados pelo distúrbio. O dispositivo também bloqueia a ovulação e, na maioria dos casos, a menstruação.
 

DIU foi caminho escolhido por Ester para diminuir sintomas da endometriose

DIU foi caminho escolhido por Ester para diminuir sintomas da endometriose


Ester Bertozzi/Arquivo Pessoal/Reprodução/JC
Foi essa função que fez com que a estudante Ester Bertozzi, que tem endometriose, optasse pelo DIU hormonal. Ester fazia uso da pílula anticoncepcional desde 2019 e, em setembro de 2021, trocou o método contraceptivo. “Parar de menstruar sempre foi o meu objetivo, até com a pílula. E a pílula não estava mais cumprindo o papel, e eu também não era muito fã de pílula por causa da quantidade de hormônios, então o DIU veio para ajudar em vários fatores”, conta a estudante.
“Foi uma ótima escolha porque eu não tenho que ficar lembrando de tomar pílula, porque é um investimento a longo prazo, então só daqui a cinco anos eu vou ter que fazer essa manutenção. E, para mim, era uma incomodação ter que ficar comprando pílula todo mês, eu odiava, só comprar eu já odiava. Eu não menstruo mais, isso é muito bom, e eu não sinto os efeitos de TPM, nem nada”, relata Ester.

Exames pré-colocação

No geral, são requisitados exame físico, que avalia as genitálias e confere possíveis alterações menstruais; o Papanicolaou, que investiga as células do colo do útero; e a ultrassonografia transvaginal, que avalia as dimensões anatômicas do útero.

Colocação do DIU

O DIU é um pequeno objeto em formato de T, inserido no útero por ginecologistas em consultório ou hospital. “A colocação do DIU, a princípio, se dá por um procedimento super simples, que tem, na grande maioria das vezes, uma tranquilidade da gente conseguir fazer ambulatorialmente, ou seja, em consultório, e não necessitar de internação laboratorial, com sedação”, afirma a ginecologista Rosana Perin.

Cuidados pós-inserção

“Os maiores cuidados são no início da adaptação. A gente sempre orienta umas 48h de abstinência sexual, para acomodação, e evitar esforços físicos maiores também nessas 24 ou 48h, mais por adaptação, porque a gente pode ficar com um desconfortinho. Eu brinco com as pacientes e digo 'tu vai ficar com a sensação de que tu tem útero', porque normalmente a gente não sente ele”, explica a médica.

Informação para a saúde da mulher deve ter amplo acesso, diz oficial das Nações Unidas

O relato de Anitta fez com que muitas mulheres falassem sobre os problemas e questões relacionadas à saúde reprodutiva e sexual que enfrentam. Porém, o debate sobre saúde da mulher ainda é silenciado na esfera pública, e muitos tabus estão envolvidos quando se trata dos cuidados ginecológicos. Esse assunto foi pauta de uma conversa da reportagem com Nair Souza, Oficial de Programa do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), que pode ser conferida abaixo.
Jornal do Comércio - Muitas vezes, nas primeiras consultas ginecológicas as mulheres são apresentadas à pílula como o método mais seguro para evitar a concepção; qual a importância de se ter o esclarecimento quanto aos outros métodos?
Nair Souza - Primeiramente, agradeço a oportunidade da gente dialogar sobre essa temática tão importante que é a questão do acesso aos métodos contraceptivos e trazendo a visão do Fundo de População das Nações Unidas, que considera a garantia dos direitos reprodutivos essenciais. E o que seria essa garantia dos direitos reprodutivos? Nada mais é do que o direito de decidir, livre e responsavelmente, sobre ter ou não ter, quanto ou quantos filhos ter. E essa concepção dos direitos reprodutivos engloba também o direito de ser informada, o direito de ter acesso aos métodos eficientes, seguros, aceitáveis. E frisar que mulheres jovens, com maior acesso ao planejamento reprodutivo, de fato, têm maior controle e autonomia sobre seus corpos. É preciso a gente reconhecer que empoderar e informar jovens e mulheres para que elas consigam tomar decisões conscientes sobre sua vida sexual e reprodutiva é crucial. Por isso a importância da gente ter esse esclarecimento quanto aos métodos.
JC - Na consulta ginecológica, mulheres poucas vezes têm espaço para falar sobre qual método preferem. Como estabelecer esse diálogo para que possa ser feita a escolha que faça mais sentido para a paciente?
Souza - O Fundo de População da ONU trabalha para garantir que a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos permaneçam no centro do desenvolvimento. Nessa lógica, é essencial que as mulheres e jovens possam ter esse direito de decidir, de forma livre e responsavelmente, sobre ter ou não ter, quanto e quantos filhos ter. A grande questão, aqui, é que o SUS disponibiliza esses métodos e, ao disponibilizá-los, ele também fornece o aconselhamento por profissionais de saúde, que podem munir a paciente de todas as informações necessárias que permitam a ela a livre escolha do método, o método mais apropriado a sua vida. Existem algumas situações específicas que necessitam, realmente, de um olhar mais cauteloso por parte do profissional quanto a esse aconselhamento. São a população de mulheres hipertensas, obesas, diabéticas. Uma outra questão é que esse método, quando a pessoa escolhe, não precisa ser o método para toda a sua vida, ela pode querer mudar em algum momento esse método. De repente, hoje eu faço uso da pílula; amanhã ou daqui um ano, não quero mais, ou talvez eu ache que seria mais fácil para mim o DIU. Então isso é uma escolha sua, você deve escolher o método que considere mais adequado para sua vida. Portanto, a decisão de escolha quanto ao método cabe somente à pessoa, à mulher, à jovem, isso é importante a gente ter em mente.
JC - O DIU é oferecido pelo SUS, mas a iniciativa ainda é pouco divulgada. Como é possível as mulheres terem acesso a esse método de maneira gratuita pelo Sistema?
Souza - Hoje, no Sistema Único de Saúde no Brasil, a gente encontra o DIU de cobre. No Brasil, realmente, o DIU é pouco utilizado, menos de 2%, quando comparado com outros países da região, em que sua porcentagem de uso chega a mais de 20%. Talvez a falta de informação, a falta de uma campanha mais efetiva, seja um motivo do desconhecimento desse método. Mas o que é o DIU de cobre? Ele é um método contraceptivo reversível de longa duração. São métodos de alta eficácia, e esse é o mais utilizado no mundo inteiro, e são bastante antigos. Entre os métodos disponíveis no Sistema Único, é o que tem mais tempo de adesão; isso significa que as mulheres que aderem a esse método tendem a ficar muito tempo usando o método. O DIU de cobre tem validade de dez anos. E como a gente tem acesso a esse DIU? É importante você buscar a unidade de saúde mais próxima para saber informações sobre a disponibilidade do DIU, pois ele se encontra na Atenção Básica. Então é preciso que você vá até a Atenção Básica e aí encontre e se informe sobre a disponibilidade desse método e como você poderia fazer para fazer a inserção do DIU.
JC - Ainda que evitem a concepção, tanto o DIU quanto a pílula não protegem contra Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs). Apesar de parecer óbvio, essa informação não é tão reforçada quando se fala em métodos anticoncepcionais e prevenção a doenças. No Brasil, a senhora percebe que é feita uma campanha efetiva nesse sentido?
Souza - De fato, a mulher quando está usando o método contraceptivo, ela está se protegendo de ter uma gravidez indesejada. Mas ela não está se protegendo de uma infecção sexualmente transmissível. Você pode estar fazendo uso de uma pílula, de um DIU, ou de um contraceptivo injetável, mas você está vulnerável para poder contrair a infecção sexualmente transmissível. E o que é essa infecção sexualmente transmissível? É a infecção que você pode pegar por meio de uma relação sexual. Como, por exemplo, sífilis, gonorreia, hepatite B, ou até mesmo HIV, que é o vírus da AIDS. Portanto, é imprescindível que toda relação sexual tenha uma dupla proteção. Ela precisa ter a proteção contra a gravidez e a proteção contra infecções sexualmente transmissíveis. E que tipos de métodos contraceptivos a gente tem que trazem essa dupla proteção? São os preservativos masculinos e os preservativos femininos, que também estão disponíveis no Sistema Único de Saúde. E de fato é preciso a gente dialogar mais sobre essa dupla proteção e os métodos contraceptivos, trazer mais dados e informações sobre esse tema e sua importância, principalmente para os jovens.
JC - A senhora percebe que o Brasil caminha para se tornar um país de maior liberdade sexual e reprodutiva para as mulheres? Esse diálogo está mais aberto?
Souza - O Fundo de População da ONU apoia as mulheres e meninas na reivindicação de seus direitos e de suas escolhas ao longo de suas vidas. Desde 1994, nossos programas são orientados pelos programas e ações da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, que fez do empoderamento e da autonomia dessas mulheres uma base para uma ação global para o progresso econômico e social sustentável. Estamos ao lado de inúmeros outros indivíduos que, muitas vezes, são invisibilizados na tomada de decisões autônomas sobre seus corpos: pessoas de orientações sexuais e identidades de gênero diversas, pessoas com deficiências e minorias étnicas e raciais. Portanto, há um longo caminho a percorrer para garantir que todas essas pessoas tenham poder de tomar suas próprias decisões sobre cuidados de saúde, contracepção, e muitas outras dimensões de autonomia corporal. Existem, sim, ainda grandes desafios a serem superados com essa temática.