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Geral

- Publicada em 27 de Maio de 2021 às 18:16

Problemas estruturais agravam riscos de surtos de Covid-19 nas escolas públicas de Porto Alegre

A Escola América é uma das que integra a rede de ensino da Capital

A Escola América é uma das que integra a rede de ensino da Capital


Athila Bauer - Divulgação/JC
Adriana Lampert
Não basta que mais da metade das escolas públicas (tanto da rede municipal de Porto Alegre quanto da rede estadual) estejam trabalhando sem Plano de Proteção Contra Incêndio (PPCI): há ainda outros fatores que agravam os riscos não só de um acidente com fogo, mas também da propagação de Covid-19 nestas instituições. 
Não basta que mais da metade das escolas públicas (tanto da rede municipal de Porto Alegre quanto da rede estadual) estejam trabalhando sem Plano de Proteção Contra Incêndio (PPCI): há ainda outros fatores que agravam os riscos não só de um acidente com fogo, mas também da propagação de Covid-19 nestas instituições. 
Funcionando com janelas emperradas, basculantes com aberturas estreitas e rede elétrica defasada, muitas edificações não comportam sequer a instalação de ventiladores para melhorar a circulação do ar. Outras possuem torneiras com problemas de saída de água, o que impede crianças e professores de lavarem as mãos. Para evidenciar, desde a volta às aulas presenciais, no início de maio, já foram registrados surtos do novo coronavírus em diversas escolas da rede municipal de ensino de Porto Alegre.
"Para piorar, não há protocolos seguros dentro de uma escola de educação infantil - alguns inclusive apontam que não é obrigatório a criança usar máscara", destaca a integrante do Eixo Educação no Conselho de Representantes Sindicais do Simpa (Cores), Simone Flores. "E é justamente este público que brinca, corre, e tem contato mais próximo com os professores", emenda.
A conselheira do Cores considera que o contágio "se mostrou grande" na lista municipal a partir da reabertura das escolas de Ensino Fundamental. Professora na EMEF Saint Hilaire, no bairro Lomba do Pinheiro, ela observa que no período de 3 a 20 de maio, "as infecções e suspeitas aumentaram gradativamente", inclusive em crianças. "Na última semana, esse crescimento foi de quase 70%", pontua Simone, usando dados de levantamento da Associação dos Trabalhadores/as em Educação do Município de Porto Alegre (Atempa).
Em menos de um mês, três escolas já fecharam as portas por conta de contaminações de Covid-19, reforça o professor da EMEF América, Matheus Schneider. "A realidade de muitas escolas públicas do Município é de salas pequenas e espaço reduzido. Na nossa tem apenas uma quadra que serve como pátio, não tem nem pracinha, tudo isso dificulta o distanciamento." 
Localizada no bairro São José, a escola América é um exemplo de instituição cuja rede elétrica é muito antiga. "Para piorar, quase todas as basculantes não abrem de um jeito que permita circulação de ar nas salas de aula", afirma Schneider. Segundo a assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Educação (Smed), "as adequações elétricas estão sendo constantemente realizadas pela equipe técnica" da pasta. "Em 2021, a Smed vem liberando verbas extras para reformas elétricas parciais e completas, para adequar o máximo de escolas possível".

Demanda por obras que modifiquem os modelos de janelas

O modelo dos prédios das escolas públicas municipais - e de grande parte das estaduais - é, na maioria, o de edificações com janelas basculantes, comenta o diretor da Escola Estadual de Ensino Fundamental Araújo Viana, Rafael Rodrigues Saraiva. "Estas janelas passaram a ser impróprias para a Educação a partir do advento do coronavírus, que, segundo os cientistas vai sofrer mutações e ficar na nossa vida por pelo menos mais dez anos", alerta o gestor. Ele opina que os governos municipal e estadual "precisam elaborar um plano de obras" para todas as escolas, considerando a necessidade de melhorar a circulação do ar, para evitar propagação de doenças respiratórias transmissíveis, a exemplo da Covid-19.
No caso da instituição gerida por Saraiva, as janelas ainda foram soldadas por direções antigas, que também tiraram as básculas que permitem a abertura. "Já fiz um orçamento e custa em torno de R$ 8 mil para resolver isso, mas, mesmo que eu tire as soldas, a ventilação não será adequada. Além disso, até temos esta verba em caixa, mas teremos que decidir entre abrir as janelas ou usar o dinheiro para a compra de material, de folhas de xerox dos conteúdos para os alunos, e de produtos utilizados na limpeza da escola (uma vez que o estoque do que foi enviado em 2020 acabou). É complicado", explana Saraiva.
O diretor da escola Araújo Viana explica que "a verba estadual tem entrado, mas os recursos federais ainda não chegaram este ano". "Claro que depende da realidade de cada escola - algumas recebem mais recursos que outras. No nosso caso, o dinheiro que entra é pouco para fazer uma reforma estrutural", compara Saraiva. Ele ressalta que "é urgente" que as edificações que têm janelas no modelo basculante passem por obras estruturais. "A direção de uma instituição pode minimizar o problema, mas só o governo é que pode fazer obra estrutural", adverte.
"A gente circula nas escolas e vê que a circulação de ar não é ideal", concorda Simone. "Estamos lutando para que se tenham protocolos mais próximos do cuidado que se tem que ter, do básico - mas nas condições atuais, se percebe que na escola não está sendo possível." A servidora municipal sinaliza ainda que com a chegada do frio, "muitas crianças pegam resfriados e as famílias não encaminham para testagem." "Neste cenário, há escolas onde as janelas são muito pequenas, e muitas emperram, não tem como abrir. Mesmo que façam melhorias, acho difícil a boa ventilação dos ambientes." 
O diretor geral da Atempa, Ezequiel Carvalho Viapiana, reforça que algumas escolas buscam colocar ventiladores, mas são impedidas por conta de rede elétrica velha, "sem nenhum reparo". Professor da EMEF Lidovino Fonton, Viapiana avalia que "em uma situação de pandemia, isso é grave, pois é preciso ventilação para reunir os alunos e professores em ambiente fechado." O gestor confirma que a dificuldade com janelas emperradas ou enferrujadas, a falta de funcionários para limpeza e manutenção, e de monitores para Educação Infantil, são as principais queixas da maioria das direções de instituições públicas de ensino fundamental.
"Temos tentando atender a comunidade escolar e garantir o máximo de distanciamento. Na nossa escola, a diretoria fez por conta própria umas faixas delimitando os espaços", pondera Schneider. "No entanto, de resto, só recebemos álcool em gel e aquelas máscaras cirúrgicas, fininhas, que não as recomendadas para novas cepas."
"Sobre a questão estrutural, informamos que todas as escolas passaram pela adequação para a estratégia de distanciamento", responde a assessoria de imprensa da Smed. De acordo com a pasta, todas as escolas da rede têm disponível dispensadores de álcool em gel, termômetro, jalecos em TNT, viseira "e foi disponibilizada verba extra para cada escola para despesas relativas ao combate ao vírus". "Todas dispõem de cartazes de sinalização fornecidos pela Smed, voltado aos alunos e à equipe. As aberturas e mecanismos das esquadrias das salas foram vistoriadas pela equipe técnica da Smed, para averiguar seus graus de inclinação, conforme as normas técnicas."
No que se refere às adequações elétricas, a Smed afirma que "estão sendo constantemente realizadas pela equipe técnica" e que em 2021, a pasta "vem liberando verbas extras para reformas elétricas parciais e completas, para adequar o máximo de escolas possível." 
Já a Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul (Seduc-RS) afirma, através da assessoria de imprensa, que a orientação do governo para escolas que apresentem qualquer problema estrutural é que "seja passado diretamente para a Coordenadoria Regional de Educação (CRE), para que se possa dar andamento na solução". A pasta ainda informa que todas as instituições têm valor de autonomia financeira, no caso de pequenos reparos. "Tem que comunicar para a Seduc, para iniciar o trâmite. Esta é a lógica e o fluxo em casos de necessidades estruturais."
O diretor da escola Araújo Viana concorda, mas faz uma provocação: "O governo do Estado precisa ir nas escolas, para resolver as estruturas e, somente depois disso decidir quais podem abrir ou não durante a pandemia. Sugiro uma comissão formada por integrantes da Secretaria de Obras em parceria com o Cpers." Sem vacinação de professores, e somando outras lacunas, como banheiros com vazamento, pias pequenas (que dificultam a lavagem das mãos), falta de funcionários para a limpeza e manutenção, e inclusive falta de PPCI, as escolas (por mais que as gestões se esforcem) se tornaram um ambiente "não tão seguro", avalia Saraiva.
"No que se refere a casos de Covid-19, nossa principal denúncia - para além dos números que crescem - é que Secretaria Municipal de Educação (Smed) estava afastando servidores e estudantes que faziam testagem de rastreamento somente quando eles eram sintomáticos", destaca Viapiana. "Se a pessoa faz um teste, e está contaminada, mas sem sintomas, até que resultado saia, ela já transmitiu para outras várias", alerta.
O diretor da Atempa pondera que na última reunião do Centro de Operações Emergenciais (COE-E), ocorrida nesta terça-feira (25), ficou decidido que será encaminhada a orientação para as escolas afastarem quem for testado - pelo menos até que saia o resultado. "Mas há um mês o protocolo estava com esta lacuna."
Outra situação que precisa ser resolvida, na opinião do diretor da Atempa, é que a escola deve fechar quando, além da diretora, alguém da equipe de limpeza, ou entre professores de arte e educação física  testarem positivo para o novo coronavírus. "Atualmente, simplesmente não se consideram estes agentes, que entram em contato com mais de uma turma das escolas."

Muitas instituições não têm PPCI, mas estocam álcool 70

Outra situação preocupante nas escolas passa pela estocagem de álcool 70. Segundo divulgação do Cpers Sindicato, a maioria das instituições não possui a estrutura recomendada pelo Corpo de Bombeiros para estocar a quantidade de álcool enviada pelo governo. E em algumas escolas do município não existe nem mesmo uma saída especial para evacuação do prédio, em caso de incêndio.
Docente também do Colégio Estadual Francisco Antônio Vieira Caldas Júnior, Matheus Schneider afirma que lá os professores nunca foram preparados ou orientados sobre como agir em caso de incêndio. "Tem extintores nas escolas de ambas as redes públicas, mas não tem preparo para aprender a mexer no extintor. Isso que estou há dez anos no Município."
O diretor geral da Atempa, Ezequiel Carvalho Viapiana, afirma que "até agora não houve nenhum encaminhamento desta gestão" para PPCIs em 2021. "A orientação é trabalhar dentro do plano de contingência, e a justificativa para isso é que os profissionais que fazem visitas técnicas estariam com dificuldades de atendimento por conta da pandemia", dispara.
Viapiana afirma que a prefeitura pede para as escolas apontarem as necessidades de cada prédio no plano de contingência (relacionado ao controle da disseminação da Covid-19) e admite que metade das 309 instituições ainda não realizou o processo. Neste plano, a gestão responde quantos banheiros e salas de aula tem o prédio e qual possibilidade de distanciamento, como são as janelas, os espaços onde há torneiras e outras ferramentas que oportunizem a higienização das pessoas, entre outras informações.
"A sinalização é que depois do plano de contingência entregue, venham os planos de PPCI", diz o dirigente da Atempa. Já a assessoria de imprensa da Smed afirma que todas as escolas da rede possuem extintores de incêndio e inversão das portas para facilitar a evacuação, além do treinamento para o caso de emergências. "Todas as escolas possuem os equipamentos básicos de proteção, como extintores de incêndio, portas de fuga, saídas de emergência e treinamentos para combate dos incêndios. Dedicamos todos nossos esforços para garantir que as escolas tenham o máximo de segurança possível, enquanto não temos a aprovação dos PPCIs."
De acordo com as respostas da Secretaria, este ano já foram investidos em torno de R$ 650 mil para  adequações, incluindo a inversão de portas para facilitar eventuais evacuações, liberação de escadarias, rotas de fuga, aquisição de extintores de incêndio, sinalizadores e luminárias de emergência. "Ainda faltam 95 escolas, que estão com projetos em diferentes fases. Algumas já estão em estágio mais avançado, outras, ainda estão em fase inicial", informa a pasta. Segundo a assessoria de imprensa, todas as escolas que ainda não possuem alvará estão em fase de elaboração de projeto para aprovação do Corpo de Bombeiros. 
Já a Seduc-RS informa que as instituições têm prazo até 27 de dez de 2021 para protocolarem o plano de proteção contra incêndio e até 27 de dez de 2023 para ter tudo instalado e aprovado. "Todas estas adequações ainda estão no prazo, nas 2.378 escolas no total do Estado", diz a assessoria de imprensa. O órgão também informa que atualmente, 1.300 instituições de ensino da rede possuem o plano simplificado de prevenção, além de extintores de incêndio adquiridos, sinalização de emergência, e treinamento de pessoal. "É uma medida que vai sendo utilizada enquanto o PPCI vai sendo finalizado."
Dentre os desafios para o avanço do processo na Seduc–RS, são citados a questão da pandemia e o período de escolas fechadas, após os decretos estaduais que proibiram atividades presenciais.
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