Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

Educação

- Publicada em 29 de Abril de 2021 às 13:33

Com aval do Ministério da Educação e oposição de educadores, projeto quer autorizar ensino domiciliar no RS

Antes de enviar o texto para o Senado, os deputados vão analisar os destaques nesta quinta-feira (19)

Antes de enviar o texto para o Senado, os deputados vão analisar os destaques nesta quinta-feira (19)


PIXABAY/DIVULGAÇÃO/JC
A pandemia do novo coronavírus tornou comum o ensino remoto. Tanto alunos quanto professores tiveram que se adaptar na marra e às pressas a um modelo de educação, até então, ainda pouco utilizado na educação brasileira. Sem o planejamento adequado, a transição do ensino presencial, em sala de aula, para a educação on-line, enfrentou e ainda enfrenta problemas, como dificuldade de acesso à internet e a equipamentos, metodologia específica, entre outros. Pois, um outro debate a respeito do ensino deve ganhar foco nas próximas semanas no Rio Grande do Sul. Na terça-feira (20), entrou na Ordem do Dia da Assembleia Legislativa, estando, portanto, apto para ser votado pelos deputados estaduais, um Projeto de Lei (PL) que autoriza a educação domiciliar no Estado.
A pandemia do novo coronavírus tornou comum o ensino remoto. Tanto alunos quanto professores tiveram que se adaptar na marra e às pressas a um modelo de educação, até então, ainda pouco utilizado na educação brasileira. Sem o planejamento adequado, a transição do ensino presencial, em sala de aula, para a educação on-line, enfrentou e ainda enfrenta problemas, como dificuldade de acesso à internet e a equipamentos, metodologia específica, entre outros. Pois, um outro debate a respeito do ensino deve ganhar foco nas próximas semanas no Rio Grande do Sul. Na terça-feira (20), entrou na Ordem do Dia da Assembleia Legislativa, estando, portanto, apto para ser votado pelos deputados estaduais, um Projeto de Lei (PL) que autoriza a educação domiciliar no Estado.
A educação domiciliar em nada se assemelha ao ensino remoto que se tornou popular durante a pandemia. A educação domiciliar é uma modalidade de ensino em que pais ou responsáveis assumem o papel de professores dos filhos. Assim, o processo de aprendizagem dessas crianças é feito fora de uma escola.
De autoria do deputado Fábio Ostermann (Novo), o PL 170/2019 está em tramitação desde abril de 2019. A expectativa do deputado é que o projeto seja votado no dia 18 de maio. Antes disso, no dia 14, uma audiência pública irá tratar do tema.
Em sua justificativa para a apresentação do texto, o parlamentar aponta que a Constituição Federal (CF) afirma que caberá ao Estado e às famílias garantir a educação e que é preciso “repensar o poder de controle que a esfera política tem sobre as crianças e suas famílias”. A questão da liberdade é um dos pontos centrais da argumentação do parlamentar para defender a proposta. “A educação domiciliar surge como um pequeno fio de esperança para devolver aos pais o poder sobre os seus próprios filhos”, ressalta Ostermann.
Outro ponto abordado pelo deputado em sua justificativa trata da atenção às crianças portadoras de necessidades especiais. Conforme ele, a educação domiciliar permite uma maior qualidade nesse atendimento, visto que essas crianças “frequentemente não recebem o necessário amparo, seja na rede pública, seja na rede privada de educação”.
O PL a ser apreciado pela Assembleia é sucinto – uma página - e não traz muitos detalhes acerca da prática ou de como ela será organizada, gerida e fiscalizada pelo poder público (confira abaixo como é a proposta do deputado Ostermann).
O projeto do deputado do Novo foi protocolado quase que simultaneamente a uma proposta semelhante enviada pelo presidente Jair Bolsonaro à Câmara dos Deputados, também em abril de 2019. O PL do governo federal cria o regramento para a prática do ensino domiciliar em âmbito nacional.
No texto, o Palácio do Planalto define a educação domiciliar como o “regime de ensino de crianças e adolescentes dirigido pelos próprios pais ou pelos responsáveis legais”, e explica que a opção precisaria ser formalizada por meio de uma plataforma virtual a ser criada pelo Ministério da Educação.
O homeschooling (como é conhecido em inglês) é popular nos Estados Unidos, que é conhecido como o berço do modelo. A prática é permitida em, pelo menos 64 países, entre eles Canadá, Colômbia, Chile, Portugal, França, Itália, Reino Unido, Holanda, Noruega, África do Sul, Japão e Austrália.
Conforme a Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned), há hoje no Brasil 7,5 mil famílias que adotaram a prática, ainda que ela não seja oficialmente permitida no País. Segundo a entidade, são, ao todo, 15 mil estudantes entre 4 e 17 anos educados em casa atualmente em território brasileiro.

Em 2018, STF negou a prática no Brasil sem uma lei específica

Para Moraes, Constituição não permite que a família exclua o Estado da educação dos filhos

Para Moraes, Constituição não permite que a família exclua o Estado da educação dos filhos


Rosinei Coutinho/SCO/STF/Divulgação/JC
O assunto já foi debatido e julgado no Supremo Tribunal Federal (STF) em uma ação que envolvia uma família gaúcha. Em 2018, o plenário da Corte negou provimento a um recurso no qual se discutia a possibilidade de o ensino domiciliar ser considerado como lícito para o cumprimento do dever da educação.
O julgamento do recurso foi finalizado no dia 12 de setembro de 2018, e o pedido de que uma menina de 11 anos de idade, moradora do município de Canela, na Serra gaúcha, pudesse ser educada em casa foi negado por 9 votos a 1.
Os pais da criança impetraram um mandado de segurança contra um ato da secretária de Educação de Canela, que negou um pedido para que a criança recebesse educação domiciliar, orientando a família a fazer a matrícula na rede regular de ensino. A família perdeu a batalha judicial na justiça estadual, com o mandado de segurança sendo negado em primeira instância e no Tribunal de Justiça. Sentindo-se injustiçada, a família foi ao STF, onde perdeu novamente.
O ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso, votou à favor do recurso, defendendo a legalidade da prática. "Eu considero ser um direito da família escolher a forma pela qual quer educar os seus filhos. Acho que esse direito deve ser regulamentado pela lei, mas a família tem o direito", disse Barroso.
A divergência foi aberta pelo ministro Alexandre de Moraes, que foi seguido pela maioria de seus colegas. “A Constituição brasileira, diferentemente da Constituição norte-americana, não permite que a família exclua o Estado da participação, isso é claro na Constituição”, afirmou Moraes. O magistrado tratou também de deixar claro que, a seu ver, o debate não envolve um confronto entre o público e o privado. “Não é questão de competição entre Estado e família. O Estado não pode ser totalitário e impedir a família da participação, mas a família não tem o direito de excluir o que a Constituição estabeleceu como dever do Estado, porque o direito à educação não é da família, o direito à educação é da criança”, enfatizou.
Segundo a fundamentação adotada pela maioria dos ministros, o pedido formulado no recurso não poderia ser acolhido, uma vez que não há legislação que regulamente preceitos e regras aplicáveis a essa modalidade de ensino.
Entretanto, a aprovação do Projeto de Lei do governo federal no Congresso pode mudar o entendimento dos ministros do Supremo. Isso porque, os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Rosa Weber, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Cármen Lúcia consideraram que a prática não fere a Constituição e poderia ser legitimada se houvesse uma lei que criasse diretrizes para a sua aplicação. Os ministros Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello, por sua vez, consideraram o homeschooling como inconstitucional. Somente o ministro Luís Roberto Barroso votou a favor do ensino domiciliar, na ocasião.

Cpers, Sinpro, Sinepe e MP-RS são contra o homeschooling

Enquanto, por um lado, a proposta que tramita na Assembleia Legislativa gaúcha tem, indiretamente, o peso do apoio do governo federal, por meio dos ministérios da Educação e da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, localmente, a proposição tem forte rejeição.
Os sindicatos dos professores dos ensinos público e privado do Rio Grande do Sul, Cpers e Sinpro, respectivamente, são contra o projeto.
Procurado pela reportagem do Jornal do Comércio, o Cpers disse, em nota, que defende a educação referenciada na escola como parte fundamental do processo de formação do indivíduo, com a família devendo ter papel complementar e não de substituta. “O ensino domiciliar atende à agenda de uma minoria e não deveria ser foco de debate em um país tão desigual e distante de cumprir seus deveres constitucionais para com o acesso à educação pública, universal e de qualidade. O Estado não pode apoiar o isolamento, a separação sociocultural e lavar as mãos para a realidade da escola pública”, diz a entidade.
A diretora do Sinpro, Cecília Farias, confirmou que o sindicato também é contrário à proposta e disse que a entidade irá se manifestar sobre a questão oportunamente.
O Sindicato do Ensino Privado gaúcho (Sinepe-RS) também é contrário ao Projeto de Lei. Em nota, a entidade salienta que, se aprovado no parlamento estadual, a norma será inconstitucional, na medida em que a competência para decidir sobre a questão é federal. “No mérito, entendemos que a escola é fundamental para a criança no aprender a aprender e no aprender a conviver. O desenvolvimento socioemocional da criança não se completa na família. No ambiente escolar, a criança aprende que existem crianças diferentes dela, com outros valores, com outra formação, que pensam diferente, que existe a diversidade, ou seja, que o mundo não se resume à sua família, e isto ajuda em seu crescimento enquanto indivíduo e na sua formação integral”, afirma o texto do sindicato das escolas particulares. “Família e escola se complementam na formação do aluno. Tirar uma delas da base vai fazer com que a formação seja incompleta, com resultados danosos a médio e curto prazo”, conclui a nota.
O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) é outra instituição que já se manifestou contrariamente ao ensino domiciliar. Em audiência pública que tratou do assunto, realizada no dia 9 deste mês, a promotora de Justiça Luciana Casarotto apresentou a posição do MP-RS a respeito da questão. “Nós defendemos que as crianças tenham uma educação regular, com frequência obrigatória dos 4 aos 17 anos, porque é isso que dispõe a Constituição Federal”, disse. "O MP cumpre o seu dever ao defender a lei. De regra, a educação pública deve ser pela escola aberta e de qualidade", acrescentou. Um dos pontos questionados pela promotora é a fiscalização da educação domiciliar e como a modalidade pode impactar a coerência sistêmica da educação brasileira.

Conselho Estadual de Educação aponta possível crime em não matricular filhos no ensino regular

O Conselho Estadual de Educação (CEEd-RS) também já se manifestou contrariamente à prática. Em documento de 16 páginas intitulado “Educação Domiciliar: contrapontos ao PL 170/2019”, o órgão lista uma série de argumentos contra o projeto de lei em tramitação no legislativo gaúcho.
O texto aponta que é prerrogativa da União definir as regras gerais a respeito da educação no País. Portanto, uma lei estadual não poderia tratar sobre um tema que necessitaria de uma norma federal.
Conforme o CEEd, o homeschooling contraria ao menos três leis federais. Uma delas é o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Em seu artigo 55, o ECA afirma que “os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino”.
Outra norma federal que a lei estadual iria contrariar, conforme o CEEd, seria a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Em seu artigo 6º, a norma afirma que “é dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças na educação básica a partir dos quatro anos de idade”. Assim, conforme o documento, fica estabelecida a obrigatoriedade de crianças e jovens frequentarem a escola, estando sujeitos a ações judiciais os pais ou responsáveis ou famílias que não cumprirem essa responsabilidade, impossibilitando, portanto, a educação domiciliar. “Percebe-se aqui, que esse artigo disciplina apenas a educação ministrada nas escolas. Portanto, não é aplicável àquelas famílias que optam pela educação domiciliar. E admitir uma interpretação diversa desse dispositivo seria o mesmo que aplicar legislação distinta, como o Código Ambiental, por exemplo, para solucionar qualquer impasse sobre educação”, diz o documento.
Por não haver previsão legal em nível federal regulamentando o homeschooling, e existindo farta legislação obrigando os pais a matricularem os filhos no ensino regular, o Conselho Estadual de Educação entende que deixar de fazê-lo configura crime previsto no artigo 246 do Código Penal, que diz que é crime “deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar”, com pena prevista de detenção de quinze dias a um mês e multa.
Outro ponto abordado pelo documento – que também é assinado pela Famurs, pelo Sinepe-RS, pela União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime-RS) e pela União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação do RS (Uncme-RS) – diz respeito à sociabilidade das crianças e jovens.
Conforme as entidades, o contexto atual caracterizado por antagonismos e fragilidade das relações afetivas, assim como as tendências que se vislumbram para a vida em sociedade, mostram o papel insubstituível da escola. “Conviver com opiniões distintas, com diferentes etnias e crenças daquelas que a família tem, permite ao aluno a ampliação de suas experiências, enquanto que limitá-lo ao convívio familiar e/ou idêntico apenas, pode ocasionar fragilidades no seu desenvolvimento socioemocional e comprometer as relações numa sociedade democrática”, diz o texto.
A Secretaria Estadual de Educação (Seduc-RS) assina o documento do CEEd, corroborando, portanto, os argumentos contrários ao ensino domiciliar ali expostos. No entanto, procurado pela reportagem do JC, a assessoria da pasta afirmou que somente irá se manifestar quando houver andamentos mais adiantados do PL na Assembleia Legislativa.

"O homeschooling no Brasil já é um fato social", diz autor do projeto

Deputado Fábio Ostermann (Novo) defende mais autonomia para as famílias

Deputado Fábio Ostermann (Novo) defende mais autonomia para as famílias


LUIZA PRADO/JC
Autor do Projeto de Lei que pode instituir o ensino domiciliar no Rio Grande do Sul, o deputado estadual Fábio Ostermann acredita que a regulamentação da prática viria apenas dar lastro legal para algo que já existe, garantindo segurança jurídica para as famílias educadoras e estabelecendo formas de que o homeschooling possa ser fiscalizado, com as devidas normas a serem cumpridas pelos pais ou responsáveis. Em entrevista ao JC, o parlamentar fala sobre os motivos que o levaram a propor o PL e sobre as críticas que ensino domiciliar recebe.
Jornal do Comércio - O que levou o senhor a propor o PL?
Fábio Ostermann - Cerca de mil famílias educadoras pelo Estado afora querem um projeto que lhes garanta segurança jurídica. Elas não querem educar seus filhos sob uma ameaça de ilegalidade, de clandestinidade. Elas querem ser recepcionadas pelo nosso ordenamento jurídico. O homeschooling no Brasil já é um fato social. Cabe a nós garantirmos que ele seja também um fato jurídico.
JC – Mas não seria necessária uma lei federal para regulamentar a prática?
Ostermann - Nós temos competência concorrente com a União e, consequentemente, na falta de uma legislação da União, podemos atuar. Nosso projeto precisa prosseguir, o governo do Estado precisa se adaptar e acho que a pandemia reforçou a necessidade de um regramento claro.
JC - Aqui no RS, o Cpers é contra, o Sinpro é contra, o Sinepe é contra, o MP-RS é contra e a Secretaria Estadual de Educação, apesar de já ter assinado um documento do Conselho Estadual de Educação contrário ao homeschooling, tem evitado se posicionar.
Ostermann - O papel da Secretaria Estadual de Educação será muito importante. O Ministério Público vai ter de atuar meramente conforme a lei que esteja aprovada. A partir de termos aprovado a lei, o Ministério Público vai fazer o que lhe cabe, que é fiscalizar o cumprimento da lei. Acredito que a posição do MP será conjuntural de acordo com o atual quadro jurídico estabelecido. Acho que não é de bom tom que o Ministério Público trate os pais e mães educadores com a presunção de má-fé. Tivemos alguns casos de pais e mães que foram processados por abandono intelectual e que, na prática, não é essa situação que se verifica. É importante que tenham requisitos e critérios definidos para que possamos resguardar os bons pais e mães educadores e excluir dessa prática os pais e mães que não tenham o interesse ou que não cumpram os requisitos para poder se dedicar a essa tarefa.
JC – No seu entender, a lei viria regulamentar uma prática que já existe. Espera que a lei, se aprovada, seja questionada na Justiça?
Ostermann - Os fundamentos que embasam o pleito de regulamentar o ensino domiciliar são robustos, estamos confiantes não só no valor legal, mas também no valor moral dessa pauta, e acredito que é uma pauta que irá avançar no Brasil como o mero reconhecimento de um fato. O ensino domiciliar já é uma realidade Brasil e o Judiciário, ao se recusar regulamentar, não está acabando com o homeschooling. Ele está, na verdade, tirando a possibilidade de darmos uma validação, uma garantia de qualidade, de fazer um acompanhamento, de contribuir para que esses pais façam uma educação da melhor maneira e, também, estão impedindo que tenhamos uma melhor identificação de casos de abuso. Eu defendo que os indivíduos, as famílias, tenham mais autonomia. Sou cético em relação ao papel do Estado. Acho que o Estado tem uma função importante em algumas áreas específicas, mas repudio essa visão totalitária que acredita que somente o Estado pode educar as crianças, com todo mundo sendo tratado da mesma forma, com o mesmo nível de aprendizado, na mesma velocidade. As melhores experiências do mundo não reforçam esse paradigma. É importante que o Brasil se paute por isso também e possa avançar nesse debate.
JC - O governo de São Paulo instituiu na quarta-feira passada, dia 21, uma norma que cria limites ao ensino domiciliar, caso ele venha a ser aprovado em âmbito federal. Entre as medidas, estão a obrigatoriedade de que as crianças tenham aulas com profissionais, de estarem matriculadas na rede estadual e municipal e de passarem por avaliações periódicas na escola. Como o senhor vê essas regras instituídas pelo governo paulista?
Ostermann - Acho que isso é fruto muito mais de um pleito corporativista, que visa a uma reserva de mercado para grupos específicos, do que propriamente uma preocupação com a educação das crianças. É um tema muito sujeito a essas pressões corporativistas. O fato de o Sinepe ser contra explica algo. Do Cpers e do Sinpro nós sabemos o que esperar, são os mesmos grupos contrários à volta às aulas. Professores que não querem voltar às aulas. Em relação ao Sinepe, que é uma instituição que tenho grande respeito, acho que estão tendo uma visão um pouco míope em relação ao potencial e às possibilidades do homeschooling. Existe um papel muito grande para as instituições de ensino, inclusive qualificar os pais, contribuírem com a construção de materiais didáticos. Entendo a posição institucional deles, mas acho que também é marcada por uma visão de reserva de mercado. É um dos grandes males do nosso país.
JC - Outro ponto bastante criticado por quem é contrário à prática diz respeito à sociabilidade das crianças, na medida em que a escola também é um local de formação do cidadão através do convívio com as diferenças. Como o senhor vê esse ponto?
Ostermann - É importante desmistificar esse argumento por dois lados. Em primeiro lugar, a escola não pode ser vista como a única forma e fonte de socialização das crianças. As crianças socializam com a família, com a sua comunidade, no seu bairro, no seu local de residência. Ao mesmo tempo, não podemos colocar a escola como um local sagrado de socialização e que toda a socialização lá acaba sendo benéfica. Temos vários casos de pais que adotaram a educação domiciliar porque suas crianças tinham problemas de relacionamento com os colegas, sofriam abusos, bullying e acabaram adquirindo traumas em relação ao ambiente escolar. Sabemos que a escola é um ambiente muito bom para a maioria das crianças, mas pode ser um ambiente muito opressor para outras crianças, um ambiente hostil, de muita frustação para crianças que tem dificuldade de aprendizado, ou que têm altas capacidades e não conseguem se enquadrar no ritmo tradicional do ensino.

Como é a proposta que será votada no RS?

  • É admitida a educação domiciliar, sob o encargo dos pais ou dos responsáveis pelos estudantes, observadas a articulação, supervisão e avaliação periódica da aprendizagem pelos órgãos próprios dos sistemas de ensino.
  • Caberá aos pais ou responsáveis a escolha entre a educação escolar e a educação domiciliar.
  • A escolha pode ser tomada a qualquer momento, devendo ser comunicada à instituição escolar na qual o aluno estiver vinculado.
  • Os estudantes dos dois modelos de ensino terão garantidas a igualdade de condições e direitos.
  • Quem optar pela educação em casa, terá de fazer uma declaração oficial por meio de um formulário a ser entregue à secretaria de educação do município em que a família reside, formulário esse que, após recebido, será considerado como matrícula.
  • As famílias devem manter um registro de atividades pedagógicas desenvolvidas pelos estudantes e deverão apresentá-lo às autoridades caso solicitado.
  • As crianças e adolescentes educadas no regime domiciliar serão avaliadas pelo município por meio das provas aplicadas pelo sistema público de educação.
  • A fiscalização das atividades de educação domiciliar deverá ser feita pelo Conselho Tutelar, no que diz respeito aos direitos das crianças e adolescentes, e pelas secretarias estadual e municipais de Educação, no que diz respeito ao cumprimento do currículo estabelecido.

Como é a proposta do governo federal?

  • Caberá aos pais a escolha pelo tipo de ensino dos filhos, escolar ou domiciliar.
  • Os pais que optarem pelo ensino domiciliar têm o dever de assegurar a convivência familiar e comunitária aos filhos.
  • Estudantes dos ensinos domiciliar e escolar teriam isonomia de direitos.
  • Estudantes do ensino domiciliar teriam asseguradas a participação em concursos, competições, avaliações nacionais instituídas pelo Ministério da Educação, avaliações internacionais, eventos pedagógicos, esportivos e culturais, incluídos àqueles em que for exigida a comprovação de matrícula na educação escolar como requisito para a participação.
  • A opção pela educação domiciliar se dará por meio de uma plataforma virtual do Ministério da Educação na qual os pais terão de incluir documentação de identificação do estudante; documentação comprobatória de residência; termo de responsabilização pela opção de educação domiciliar assinado pelos pais ou pelos responsáveis legais; certidões criminais da Justiça Federal e da Justiça Estadual ou Distrital; plano pedagógico individual, proposto pelos pais ou pelos responsáveis legais; e caderneta de vacinação atualizada.
  • Anualmente, os pais ou responsáveis legais terão de renovar o cadastro incluindo um novo plano pedagógico individual.
  • Os pais teriam de manter um registro periódico das atividades pedagógicas dos filhos.
  • O estudante matriculado em educação domiciliar deverá ser submetido, para fins de certificação da aprendizagem, a uma avaliação anual sob a gestão do Ministério da Educação. Se for reprovado, será submetido a uma prova de recuperação.
  • Os pais perderão o direito de escolha ao ensino domiciliar quando: o filho for reprovado por dois anos seguidos nas avaliações anuais e na prova de recuperação; o filho for reprovado em três anos não consecutivos na avaliação e na prova de recuperação; o filho não injustificadamente comparecer à avaliação anual; e enquanto o cadastro não for renovado.