Quando de uma gravidez, a mãe se depara com a possibilidade de escolher entre duas formas de ter o bebê. A primeira delas, mais indicada por profissionais da saúde, é o parto normal. A segunda, preferida entre as mulheres, é a cesariana. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que, no máximo, 15% dos nascimentos sejam feitos por meio de cirurgia. No Brasil, o índice é de 52% de cesáreas na rede pública e de 88% na rede privada.
No Rio Grande do Sul, em 2013, dos 141.218 nascimentos, 88.369 foram partos cesarianos, o equivalente a 62,6%. Dados da Secretaria Estadual da Saúde (SES) do mesmo ano mostram que, em nove municípios gaúchos, 100% dos partos realizados foram via cesariana. Como são cidades pequenas, os números absolutos de intervenções são baixos, sendo que Lajeado do Bugre, com 36 casos, é o município com a maior quantidade de ocorrências.
As causas dessa preferência vêm sendo amplamente discutidas no âmbito da saúde. Algumas delas são a praticidade e a rapidez do procedimento, que leva no máximo três horas para ser concluído, enquanto que o parto normal pode demorar até 12 horas. A cesárea também é mais lucrativa para o médico. A questão da dor é outro fator que faz aumentar a opção pela cirurgia. Algumas mães temem as dores do parto e acreditam que, se realizarem a cesárea, o sofrimento será menor.
Para que esse índice diminua, o Ministério da Saúde (MS) publicou, no dia 7 de janeiro, uma resolução que visa estimular a realização do parto normal. Sendo assim, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) decretou que o médico tem a obrigação de preencher o partograma, um gráfico que registra a evolução do parto. Os hospitais também precisarão repassar informações sobre os percentuais de cesarianas realizadas por cada médico no estabelecimento. Além disso, o cartão da gestante e a carta de informação a ela passam a ser obrigatórios no âmbito da saúde suplementar. Para o ginecologista e obstetra e conselheiro do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers), Antônio Koehler Ayub, as medidas são descabidas. "Não se pode punir o médico que não apresenta o partograma se tudo ocorre bem, tanto para a mãe quanto para o bebê", explica. "A presença do partograma não é garantia de que o parto normal será bem-sucedido. Seria ideal que todos fizessem, mas não é fundamental nem comprova o acompanhamento integral do médico envolvido", ressalta o diretor da Maternidade do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre.
Ayub acredita que a intenção da ANS é boa, mas que o método escolhido para estimular o parto normal é falho. Grande defensor da forma natural, ele crê que qualquer profissional da saúde com o mínimo de instrução é capaz de entender que o método é melhor tanto para a mãe quanto para o bebê. "Não estamos condicionados a nascer pelo abdome. Não é à toa que o trabalho de parto dura horas. O bebê está em uma condição de homeostase, quando a temperatura do corpo é a mesma que a do ambiente onde ele se encontra, em ambiente aquático, sem necessidade de respiração. Ao sair, a mudança é radical", observa.
À voz de Ayub, une-se também a opinião do chefe do Serviço Médico de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital Moinhos de Vento, Marcos Wengrover Rosa. Na instituição, cerca de 82% dos partos são cesáreas, quantidade que o médico considera excessiva. Apesar de ter diminuído em 4% nos últimos dois anos, a taxa ainda é alta.
Para Rosa, o ideal seria que cerca de 30% dos partos fossem cesáreas. Ainda assim, o médico assegura que nenhum procedimento é realizado sem indicação médica. "A melhor forma de ter um bebê é pelo parto vaginal. Existe toda uma fisiologia para que ele ocorra, mas a maioria das mulheres não concorda com isso. São necessárias campanhas intervencionistas para mudar essa crença", argumenta. Como exemplo, Rosa cita a campanha realizada para popularizar a amamentação natural que, nos anos 1970, era vista com preconceito. Hoje, ninguém discute o quão indicada e saudável é a amamentação, tanto para o bebê quanto para a mãe.

Amanhã, o JC conversa com profissionais da saúde acerca da responsabilidade de cada ator no alto índice de cesáreas registrado no Brasil