O projeto de lei que prevê isentar o Imposto de Renda para brasileiros que ganham até R$ 5 mil foi analisado pelo ex-chefe da Receita Federal, Everardo Maciel, durante o 1º Fórum Atacadista. O economista fez parte do segundo painel do evento que reuniu centenas de empresários no encontro promovido pelo Sindiatacadistas.
Maciel, que esteve à frente da Receita entre os anos de 1995 e 2002, classificou como “eleitoreira” a medida que tramita no Congresso Nacional. O Brasil, que havia se tornado uma referência para o mundo em matéria tributária, lembrou. “Mas tudo está sendo destruído de maneira meticulosa. Estamos dando passos para trás”, alertou.
O palestrante, que hoje se dedica à Consultoria Tributária, lembrou que, entre os anos de 1996 e 2002, a declaração de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, teve um crescimento real. Com as alterações, o sistema dará margem para sonegação. “O imposto é guiado pelo princípio da Capacidade Contributiva, com uma graduação de progressividade. Em princípio todos deveriam pagar impostos. Em 1994, a isenção era de R$ 524, hoje, de R$ 3.036. A atualização daqueles valores, seria R$ 3.801. Se tomarmos o índice do limite de isenção daquele ano e corrigir pelo IPCA, até a data da remessa do projeto, teríamos R$ 3.801. Ora, a variação do IPCA previsto para 2026, não vai chegar a R$ 5, nem por esse critério. O que significa dizer: é um aumento real do limite de remuneração”, explicou. Além disso, se for considerado que a renda média do brasileiro é de R$ 2069,00, os R$ 5 mil seriam quase o dobro. O Brasil passará a ter um dos maiores limites de isenção, segundo ele. “É a maior isenção de que qualquer país do continente americano e maior do que qualquer país da Europa, com exceção dos escandinavos”, acrescentou.
A elevação da isenção do IRPF significa isentar 65% dos atuais contribuintes. Para Maciel, não se trata de uma virtude. O ideal seria aumentar a renda. Da mesma forma, ele citou o equívoco do aumento da carga para quem ganha acima de R$ 50 mil, valor criado de forma arbitrária, sem explicação convincente.
Com a criação da alíquota efetiva, que será sempre menor que uma alíquota nominal e com apuração complexa, a novidade pode determinar contradições que, provavelmente, terminarão em discussão nos tribunais. Como exemplo, lembrou que, uma pessoa portadora de moléstia grave (isenta de imposto) que recebe R$ 50 mil, não vai pagar imposto, mas vai cair no IRPF Mínimo, outra novidade contraditória do projeto.
“Esse projeto não tem precedente jurisprudencial. Induz a erros e a sonegação, mas não há possibilidade de derrubá-lo”, suscitou. Segundo Maciel no Brasil, qualquer proposição que pareça benefício, passa a ser imbatível. Para ele, tem havido um processo gradual de degradação no sistema tributário, com cada vez mais contenciosos. “Nos últimos anos em lugar de buscarmos equilíbrio fiscal, com a diminuição de gastos ou revisão dos chamados benefícios fiscais (que não são eficientes), as iniciativas são no sentido de aumentar a carga tributária”, concluiu.
O ex-chefe da Receita Federal acredita que está havendo um processo gradual de degradação do sistema tributário, que antes já carregava uma série de problemas. Maciel alertou sobre o número cada vez maior de contenciosos no Judiciário. “Isso resulta de uma patologia específica do processo em geral. Vejo, muito claramente, a perspectiva ruim de uma crise fiscal”, frisou. Citou ainda que, nos últimos anos, o governo federal, em lugar de buscar o equilíbrio fiscal pela via da redução de despesas e da revisão das imprecisões, tem optado por benefícios fiscais. “Benefício fiscal que não se revela eficaz tem que ser revogado. Há que separar aquilo que é útil para a sociedade daquilo que não é. Vejo que todas as iniciativas tomadas são no sentido de aumentar a carga tributária. Nós temos uma crise fiscal contratada”, projetou.