O interesse de Fabrício Sutili por rios é antigo. Quando criança, passava muitas horas pescando, atravessando corredeiras e observando o comportamento da água. Para ele, o rio não era apenas um curso d’água, mas algo com vida e personalidade. A longeva admiração pela natureza fluvial e a preocupação com a degradação da mesma fizeram com que, anos mais tarde, Sutili decidisse cursar Engenharia Florestal na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
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A graduação na faculdade gaúcha foi seguida de um mestrado e doutorado na Universität für Bodenkultur, na Áustria, onde se especializou em Engenharia Natural. Hoje, Sutili é professor na UFSM. Como reconhecimento de sua contribuição para a restauração de ambientes fluviais e de encostas por meio do uso de vegetação nativa e práticas sustentáveis, ele será agraciado com o prêmio O Futuro da Terra, entregue pelo Jornal do Comércio em parceria com a Fapergs, na categoria Preservação Ambiental.
No dia a dia, Sutili dedica-se à docência e à pesquisa, que, segundo ele, são dimensões indissociáveis. “Pesquiso para ensinar com consistência, e ensino para formar profissionais capazes de avançar o conhecimento e a prática”, comenta. Ambos os trabalhos são realizados em nome da UFSM, que oferece respaldo institucional, infraestrutura de laboratórios, acesso a editais e suporte administrativo para parcerias com órgãos públicos e privados.
Sutili confessa que sonha em transformar o campus da UFSM em uma referência prática para restauração e manejo de cursos de água. “Um campus vivo, com áreas demonstrativas e protocolos consolidados, fortaleceria a formação atual e continuada de técnicos e gestores que tomam decisões diariamente”, explica. Ele lamenta que ainda faltem recursos financeiros para viabilização desse projeto, mas acredita que se trata de um investimento inteligente, “com retorno alto em preparo institucional e capacidade de resposta do Estado diante das mudanças climáticas”.
O trabalho de restauração de ambientes fluviais e de encostas feito por Sutili consiste na intervenção, de forma tecnicamente embasada e ambientalmente sensível, para recuperar estabilidade, funcionalidade ecológica e resiliência. O pesquisador da UFSM e sua equipe utilizam técnicas de engenharia natural que integram a vegetação nativa como elemento estrutural, o que inclui reforço do solo, controle da erosão, dissipação de energia hidráulica e recomposição da biodiversidade. Todo o trabalho é feito com base em estudos hidrológicos, hidráulicos e geotécnicos, adaptados ao contexto de cada localidade trabalhada.
Ele destaca que as intervenções feitas possibilitaram que muitas áreas pudessem resistir aos impactos dos eventos climáticos extremos de 2024, como foi o caso da região onde está localizado o Rio Pardinho, entre os municípios de Santa Cruz do Sul e Sinimbu, que já sofria com forte ação erosiva. Naquela área, a equipe de Sutili empregou técnicas de engenharia natural com reconfiguração de margens e plantio intensivo de espécies nativas, buscando estabilizar o curso d'água do rio. O sucesso do trabalho realizado na região, de acordo com Sutili, demonstrou, na prática, a “eficácia e a robustez das soluções baseadas na natureza em condições severas”.
Outro trabalho importante do professor e pesquisador da UFSM e de sua equipe foi realizado nos reservatórios e vertedouros do Rio Uruguai. Como o desafio, naquele caso, era lidar com variações do nível do rio, ação de ondas e trechos com solos suscetíveis à erosão, foi necessário projetar soluções com estruturas vivas de contenção e estabilização por vegetação nativa, associadas a medidas hidráulicas de dissipação de energia e manejo de drenagem. O trabalho envolveu planejamento por fases, implantação cuidadosa e monitoramento para ajustes finos.
Como legado de sua atuação como professor e pesquisador, Sutili pretende consolidar uma engenharia baseada na natureza, tecnicamente sólida e socialmente relevante. “O nosso objetivo é formar profissionais capazes de projetar e executar intervenções que respeitem os processos ecológicos e entreguem segurança e desempenho. Mais do que publicar resultados em revistas científicas, quero que o conhecimento circule e se traduza em capacidade institucional”, explica.