De diagnósticos mais rápidos à gestão eficiente de emergências, a inteligência artificial já faz parte da rotina de hospitais de referência no Rio Grande do Sul, tanto no âmbito público quanto no privado. Instituições como o Clínicas de Porto Alegre e o Moinhos de Vento lideram a transformação digital da saúde no Estado, apostando em algoritmos que auxiliam médicos na tomada de decisão, aumentam a segurança dos pacientes e otimizam recursos, sempre com um princípio comum: tecnologia a serviço do cuidado humano.
Hospital de Clínicas aposta em IA para apoiar decisões
Luis Eduardo Rohde, diretor médico do HCPA, reforça que as ferramentas são complementares, e não substitutas do trabalho humano
Hospital de Clínicas de Porto Alegre/Divulgação/JC
O Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) tem transformado em realidade um conjunto de projetos que colocam a inteligência artificial (IA) como aliada do trabalho médico. Sob a coordenação do diretor médico Luiz Eduardo Rohde e do pesquisador Lucas Oliveira Junqueira Silva, o hospital público universitário avança em iniciativas que já mostram resultados concretos - da Radiologia à Farmácia, passando pela Emergência e pela gestão assistencial.
“Temos inúmeras iniciativas relacionadas à inteligência artificial em diferentes cenários”, explica Rohde. “Uma delas está sendo desenvolvida no setor de Radiologia, voltada à detecção de alterações em exames. O objetivo é que o sistema rastreie radiografias com achados mais graves, priorizando a interpretação desses casos.” O projeto, que reúne médicos radiologistas, físicos e professores, já analisou mais de 40 mil radiografias e deve ser expandido para tomografias e ressonâncias.
Outro modelo em desenvolvimento busca identificar precocemente pacientes com risco de sepse - resposta inflamatória generalizada do corpo a uma infecção. O sistema analisa dados do prontuário eletrônico, como hemograma, temperatura e frequência cardíaca, e aponta quem pode estar evoluindo para o quadro.
“A ideia é permitir uma ação precoce, iniciando o tratamento antes que a doença se agrave”, explica o diretor. Segundo ele, o modelo já apresenta boa acurácia e está em fase de implementação.
O uso de algoritmos também começa a alterar fluxos de trabalho na Emergência. Uma das ferramentas em teste atua na triagem de pacientes, apoiando a equipe de enfermagem na identificação de prioridades. Outra busca prever a superlotação: ao analisar dados históricos e em tempo real, o modelo estima o fluxo de pacientes e permite adotar medidas preventivas.
Já um terceiro projeto mira um dos gargalos do sistema: a elaboração dos sumários de alta. Com longas permanências e alta rotatividade de profissionais, a Emergência costuma enfrentar lentidão na liberação de leitos. “A IA pode auxiliar na elaboração dos registros de alta, tornando o processo mais ágil e padronizado”, explica Lucas Silva.
Principalmente no setor da Farmácia Hospitalar, a aplicação já é uma realidade: um sistema desenvolvido em parceria com uma empresa privada analisa prescrições médicas e identifica riscos como interações medicamentosas, duplicidades e doses inadequadas. “Tem apresentado resultados muito positivos, reduzindo situações de risco e aumentando a segurança dos pacientes”, afirma Rohde.
Os projetos em andamento no Clínicas têm em comum a integração entre ciência de dados e prática médica. Rohde reforça, no entanto, que as ferramentas são complementares, e não substitutas do trabalho humano. “Elas não substituem o médico, mas o auxiliam a tomar decisões mais rápidas e seguras”, diz.
A IA, acrescenta o diretor, é transversal dentro do hospital: “Está presente nas áreas assistenciais, administrativas e operacionais. Vai desde o diagnóstico e tratamento até o planejamento financeiro e logístico.”
Moinhos de Vento aposta em IA para aprimorar o cuidado humano
Luiz Nasi garante que a tecnologia amplia o olhar clínico, não o substitui
Hospital Moinhos de Vento/Divulgação/JC
No Hospital Moinhos de Vento, o único gaúcho entre os sete hospitais de excelência no Brasil, a inteligência artificial (IA) é tratada menos como uma revolução tecnológica e mais como uma ferramenta a serviço do cuidado. “A tecnologia amplia o olhar clínico - nunca o substitui”, resume o diretor médico da instituição, Luiz Antonio Nasi. Segundo ele, a IA é peça-chave na transformação digital da instituição, mas com um princípio central: eficiência e ciência para devolver tempo e foco à relação entre médico e paciente.
Para estruturar essa estratégia, o Moinhos criou um comitê multidisciplinar de IA, formado por médicos, engenheiros e especialistas em dados. A equipe atua na validação ética e técnica das soluções, garantindo que cada tecnologia seja incorporada de forma segura e alinhada às necessidades assistenciais. “Nosso foco é liberar o médico de tarefas operacionais para que ele tenha mais tempo para o que é insubstituível - a relação com o paciente. Garantimos que a tecnologia seja um meio - nunca um fim”, destaca Nasi.
As aplicações práticas da IA já se espalham por diferentes áreas do hospital: da Radiologia e Endoscopia à Pediatria e à Gestão de Fluxos. Em parceria com a McMaster University, o Moinhos conseguiu reduzir em até 30% o tempo de aquisição de imagens de ressonância magnética, mantendo a qualidade diagnóstica.
Nos exames pediátricos, a combinação de algoritmos de IA com recursos audiovisuais reduziu a duração média dos exames de 146 para 53 minutos, quase eliminando a necessidade de sedação. “É um ganho de tempo e conforto para o paciente, sem perda de qualidade diagnóstica”, explica o diretor.
Na Endoscopia, tecnologias com inteligência embarcada indicam em tempo real a probabilidade de malignidade de pólipos, agilizando decisões clínicas e aumentando a precisão diagnóstica. Já na Emergência, sistemas baseados em dados históricos ajudam a prever tempos de espera e ajustar fluxos de atendimento, reduzindo gargalos e melhorando a experiência do paciente.
Além da aplicação assistencial, a instituição aposta na formação de profissionais preparados para o novo cenário digital. Os programas de residência e especialização já incluem conteúdos sobre IA aplicada à medicina, ética digital, telemedicina e análise de dados clínicos. “Formamos mais de 250 residentes e fellows aptos a atuar em ambientes de alta complexidade e inovação constante”, afirma o diretor.
O Moinhos também tem se consolidado como ecossistema de inovação, conectando-se a universidades, startups e healthtechs nacionais e internacionais. O Instituto de Pesquisa Moinhos lidera mais de 200 estudos clínicos, muitos em parceria com o Ministério da Saúde, dentro do PROADI-SUS. A colaboração com a McMaster University, segundo Nasi, é exemplo de como ciência e tecnologia se unem para gerar impacto direto no cuidado: “É a síntese do nosso modelo — inovação com propósito assistencial.”
Os resultados já garantiram reconhecimento internacional. O hospital aparece em rankings como o da Newsweek e na lista da MIT Technology Review das empresas mais inovadoras do Brasil. A recente inauguração do Hospital do Coração, com investimento de R$ 210 milhões e estrutura de 6,5 mil m², reforça essa posição.