Porto Alegre,

Anuncie no JC
Assine agora

Publicada em 17 de Outubro de 2025 às 00:15

Mercado da saúde digital cresce, mas enfrenta desafios

 Brasil abriga mais de 1,2 mil startups de tecnologia em saúde

Brasil abriga mais de 1,2 mil startups de tecnologia em saúde

Anestech/Divulgação/JC
Compartilhe:
Gabriel Margonar
Gabriel Margonar
A inteligência artificial deixou de ser promessa para se tornar parte do dia a dia da medicina brasileira - e o mercado de saúde digital começa a se consolidar como um dos mais dinâmicos da economia. Startups, cooperativas médicas e o próprio poder público correm para ocupar esse novo território, em que algoritmos ajudam a prever doenças, reduzir custos e aumentar a segurança de pacientes. Mas o avanço traz dilemas: falta integração entre sistemas, a regulação ainda é incipiente e a proteção dos dados sensíveis impõe novos limites à inovação.
A inteligência artificial deixou de ser promessa para se tornar parte do dia a dia da medicina brasileira - e o mercado de saúde digital começa a se consolidar como um dos mais dinâmicos da economia. Startups, cooperativas médicas e o próprio poder público correm para ocupar esse novo território, em que algoritmos ajudam a prever doenças, reduzir custos e aumentar a segurança de pacientes. Mas o avanço traz dilemas: falta integração entre sistemas, a regulação ainda é incipiente e a proteção dos dados sensíveis impõe novos limites à inovação.
Um dos nomes mais antigos da transformação digital na área médica é a Anestech Innovation Rising, fundada em Florianópolis em 2012. O anestesista Diógenes Silva, CEO da empresa, fez parte da primeira geração de healthtechs do país. “A inovação em saúde exige suor. O anestesista é o médico que mais coleta dados dentro de um hospital, mas ainda usa papel e caneta. É preciso transformar essa informação em inteligência para melhorar desfechos e sustentabilidade econômica”, diz.
Com plataformas que registram e analisam dados de cirurgias em tempo real, a Anestech tornou-se referência em adoção digital na anestesiologia. O sistema consegue prever eventos críticos, como quedas de pressão arterial, com até 20 minutos de antecedência. “Uma pilha de dados conta uma história; uma pilha de histórias mostra o futuro”, resume Silva.
A empresa agora avança em modelos capazes de cruzar dados clínicos e genéticos para personalizar condutas - e reforça um ponto essencial: “A IA permite equilibrar qualidade assistencial e sustentabilidade. O desafio não é a regulação, é o financiamento. Ainda são os próprios médicos que pagam pelo software em muitos hospitais”.
No setor privado, a digitalização virou estratégia de negócio. A Unimed Porto Alegre, uma das maiores operadoras de saúde do país, investe em machine learning (aprendizado de máquina, na tradução literal) para cuidar de seus mais de 665 mil clientes. O superintendente-geral Marcelo Hartmann afirma que a tecnologia já está integrada a diferentes etapas do cuidado.
“O programa Viver Bem Juntos usa algoritmos que analisam o perfil e os hábitos de vida do cliente para criar trilhas de cuidado personalizadas. Também desenvolvemos 28 modelos preditivos que avaliam custo e risco assistencial, com assertividade entre 75% e 95%”, diz.
Essas ferramentas, segundo ele, ajudam a antecipar doenças crônicas e direcionar ações preventivas, reduzindo hospitalizações. A cooperativa ainda aplica IA em canais de atendimento, como chatbots e triagens digitais, além de processos administrativos.
O maior entrave, segundo Hartmann, é a integração de dados. “As informações ainda estão muito fragmentadas entre operadoras e hospitais. Para a IA gerar valor real, é preciso interoperabilidade e governança. E isso precisa acontecer com ética, privacidade e visão de longo prazo”, analisa.
O poder público também avança no tema. A Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão do Rio Grande do Sul (SPGG-RS) tem conduzido uma política de transformação digital que usa IA para aproximar o Estado dos cidadãos. A plataforma Meu rs.gov.br personaliza serviços com base no perfil do usuário, e a assistente virtual GurIA orienta sobre vacinação, prevenção e acesso a políticas de saúde. “Vivemos a era pós-digital, em que decisões e automações ocorrem em tempo real. A base é a governança de dados e o uso ético das informações”, afirma a SPGG, em nota.
O Estado prepara também a Plataforma Estadual de Dados, que integra fontes antes dispersas, criando um ambiente único para o desenvolvimento de soluções baseadas em IA. “Nosso objetivo é garantir que nenhuma recomendação apoiada por tecnologia afaste a responsabilidade humana”, destaca a secretaria.
O pano de fundo é um mercado em expansão. Segundo a Distrito Healthtech Report, o Brasil tem mais de 1.200 startups de tecnologia em saúde (as healthtechs), e cerca de um terço delas já utiliza IA em algum nível. A digitalização hospitalar cresce, impulsionada por grandes grupos privados, cooperativas e programas públicos de regulação inteligente. Mas o ritmo ainda é desigual: a burocracia, a escassez de investimentos e a falta de interoperabilidade entre plataformas travam o avanço em larga escala.
O consenso entre gestores e empreendedores é que o próximo salto depende menos da tecnologia e mais de infraestrutura e cultura. “A saúde é o setor mais atrasado em maturidade digital no Brasil. Exige validações, certificações e alto custo de entrada, mas o movimento é irreversível”, conclui Silva, da Anestech.

Notícias relacionadas