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Publicada em 15 de Setembro de 2025 às 00:25

Algumas lições do 'milagre polonês' para o Brasil

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Agências
Bráulio Borges
Bráulio Borges
Um país tem chamado a atenção quando se discute desenvolvimento econômico: a Polônia.
De acordo com dados do Banco Mundial, em 1990 o país do leste europeu apresentava um PIB per capita semelhante ao brasileiro, de cerca de US$ 12 mil (a preços de 2021 e já ajustado pela paridade do poder de compra). Em relação à média dos países da OCDE, esses níveis de renda per capita brasileiro e polonês correspondiam a 38%.
Em 2024, o PIB per capita polonês chegou a US$ 45 mil, correspondendo a 84% daquele observado na média da OCDE. O Brasil chegou a US$ 20 mil (37% da OCDE). Hoje o PIB per capita da Polônia é semelhante ao japonês!
O que gerou esse "milagre polonês" e quais lições disso para o Brasil? Bem, em primeiro lugar, é importante notar que no começo dos anos 1990, a carga tributária polonesa era superior a 30% do PIB, tendo alcançado cerca de 35% nos anos mais recentes.
Ou seja, como costumo dizer: tão ou mais importante do que o tamanho da carga tributária agregada (e do Estado) é a forma como os tributos são arrecadados (quais são as bases, se esses tributos são mais ou menos distorcivos/cumulativos etc.) e no que e como esses recursos são gastos pelo governo.
Outro elemento importante é que, a partir de 2004, a Polônia passou a fazer parte da União Europeia (embora não tenha ingressado na moeda comum, o euro). A integração da economia polonesa a um dos maiores mercados consumidores do mundo ajudou a impulsionar seu PIB, seja via comércio exterior, seja pela atração de capitais.
Comparando o Brasil com a Polônia sob a ótica da contabilidade do crescimento, constata-se que: i) a produtividade total dos fatores polonesa avançou mais de 40% desde 1990, ao passo que a brasileira encolheu cerca de 20% (dados da Penn Word Table); ii) em 1990, o Brasil possuía cerca de 30% a mais de capital físico (máquinas, equipamentos, infraestrutura) per capita do que a Polônia; em 2020, o Brasil possuía quase 40% a menos (dados do CWON do Banco Mundial); iii) em 1990, o estoque de capital humano brasileiro (medida que considera tanto a quantidade como a qualidade dos trabalhadores) equivalia a cerca de 60% do polonês; em 2020, o Brasil havia convergido um tanto, alcançando pouco mais de 75% da Polônia (CWON).
Portanto, boa parte dessa divergência entre Brasil e Polônia esteve associada à acumulação de capital físico e à produtividade sistêmica.
São muitos os possíveis candidatos para explicar isso, como a taxa de poupança maior na Polônia do que o Brasil (18,5% ante 15,7%, na média 1995-2024). Isso, em conjunto com uma política fiscal adequada -a dívida pública bruta deles está relativamente estável, em torno de 55% a 60% do PIB, há mais de 15 anos, permitiu taxas de juros mais baixas, impulsionando a acumulação de capital físico. Isso reforça a importância de o Brasil corrigir o principal fator por detrás dessa menor poupança: o déficit público elevado (que levou a dívida a se aproximar dos 80% hoje).
Outro elemento é que a Polônia adotou o modelo de tributação do tipo IVA -Imposto sobre Valor Adicionado- em 1993. Esse sistema ajudou a Polônia a não se desindustrializar: o percentual da indústria manufatureira no PIB tem se mantido relativamente estável, em torno de 17%.
No Brasil, esse percentual encolheu de 15% para cerca de 12% nas últimas três décadas. Neste caso, uma das soluções para conter e mesmo reverter a desindustrialização brasileira já está "contratada": teremos um sistema tributário semelhante ao polonês no início da próxima década, reflexo da reforma aprovada no final de 2023.
Doutorando em economia da FGV EESP, mestre em economia na FEA-USP, é diretor da LCA Consultores e pesquisador-associado do FGV Ibre

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