A Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado do Rio Grande do Sul (Fecomércio-RS) está otimista com o cenário local, cujo setor que representa teve uma recuperação rápida após as enchentes de 2024. "Trabalhamos sempre para mitigar as dificuldades que o empresariado enfrenta", destaca o presidente Luiz Carlos Bohn.
• ACESSE: Caderno Dia do Comércio 2025
Em entrevista ao Jornal do Comércio, Bohn, já em seu terceiro mandato à frente da entidade que completa 80 anos em agosto, conta como foi enfrentar a crise climática no ano passado e faz projeções para os próximos meses.
Jornal do Comércio - Com vem se comportando o mercado desde o final das enchentes do ano passado?
Luiz Carlos Bohn - Não há dúvida de que houve perda de capital, de bens e de empregos, que foram aos poucos se perdendo. Agora, surpreendentemente, foram repostos. O capital não, vai levar muito tempo para as empresas terem de novo aquele seu patrimônio de estoque, as suas instalações. O capital e o patrimônio vão demorar, eu diria de três a cinco anos para ser reposto integralmente. Os empregos foram surpreendentes. Geramos 73 mil empregos (desde o início de 2025), diferentemente dos 46 mil no mesmo período do ano passado. A não reposição de postos de trabalho foi muito mais pela parada geral, pela destruição das empresas e pela insegurança. Agora, temos um cenário bastante positivo.
JC- Esse cenário se deu pelo esforço do próprio setor? Qual a parcela de contribuição do poder público?
Bohn - Acredito que o poder público, sim, fez uma boa parte do que deveria ter feito. Não fez tudo, claro, nem conseguiria. Dentro do pacto federativo, essa é a regra: nós, do Rio Grande do Sul, e outras entidades federadas pagamos mais para o governo federal, que distribui isso para os estados do Norte e do Nordeste. Esse sistema é para, em momentos de necessidade, a reposição das perdas, catástrofes, como tudo que passamos. Essa reposição, inclusive, é constitucional e legal. Temos aí duas contas, sempre. O governo federal mistura muito adiantamento de valor, adiantamento de recursos com recursos a fundo perdido. Nós precisávamos mais de recursos a fundo perdido. O vice-presidente (Geraldo) Alckmin, quando esteve aqui na reinauguração da fábrica da Coca-Cola falou, e esse número foi estampado nos jornais: R$ 111 bilhões de repasse. Primeiro: não foi todo esse valor. Não quero contestá-lo, mas, se olhar no site do governo, onde os funcionários separam o que foi adiantamento e o que foi em fundo perdido, tem uma diferença muito grande, não é todo esse valor. De qualquer maneira, temos que agradecer porque ajudou. O que aconteceu foi uma destruição enorme de patrimônio, as pessoas querem repor rapidamente, consumindo capital e poupança. Estamos falando de reconstrução de bens, reposição de estoque e, também, de atualização das empresas. Isso foi o que provocou, em parte, os auxílios do governo. Veio muita coisa, bastante dinheiro, que foi injetado na economia, e fez esse crescimento que a gente pode chamar de surpreendente. Foi 7% de crescimento no comércio, mais do que cresceu o País.
JC - Do que o empresário mais se ressente neste momento?
Bohn - Hoje, o que o empresário mais se ressente é o não retorno integral da atividade econômica. Embora esse índice de crescimento seja surpreendente, seja alto, ele está concentrado em alguns negócios. Outros negócios ainda não retornaram, principalmente os pequenos, como prestador de serviço. Não encontramos mais nas regiões mais atingidas.
JC - Qual o impacto da alta de juros nesse momento?
Bohn - Ela está trancando a atividade econômica. O Brasil está crescendo com uma previsão para o ano que vem de menos de 2%. Está em marcha lenta. Sabemos que o juro é necessário, é o remédio amargo para que a inflação não dispare mais. O que preocupa nos juros, realmente, são as contas públicas federais. Estamos com 76% de endividamento do Brasil em relação ao seu PIB. Isso para Brasil é muito alto. Antigamente, diziam que quando chegássemos a 80% estaríamos em default (quando um país se torna inadimplente, também chamado de moratória), e estamos com 76%. Ninguém fala nisso, mas existe uma enorme preocupação. O juro alto sempre prejudica muito na tomada de empréstimos, o capital de juros fica mais caro, tudo fica mais caro para os consumidores, mas ele é o remédio necessário nesse momento.
JC - É possível fazer alguma projeção para os próximos meses?
Bohn - Na nossa coletiva de imprensa no final do ano passado, previmos muita coisa que não está acontecendo. Havia a previsão até de crises mais graves, que no segundo semestre teríamos estagnação. Acho que não vai acontecer isso. Está sendo surpreendente o comportamento do mercado. Claro, o governo está injetando muito dinheiro, está se endividando, de olho na próxima eleição, e não está se importando com o gasto público. Isso faz um crescimento, de certa forma, artificial. Mas está crescendo. A gente pode dizer que, até o final do ano, vamos para frente devagar, com essa marcha lenta, mas não estamos indo para trás.
JC - O perfil do consumidor se mantém o mesmo ou ele está receoso?
Bohn - Como sempre, quando falta capital, o consumidor cuida do seu gasto. Que bom que é assim porque as pessoas não se endividam. É contra a ciência dizer que falta capital, existe muito dinheiro na economia. Essa é a grande verdade. Todo mundo está procurando onde aplicar melhor, onde vender mais. O consumidor tem tido uma atitude cautelosa por conta de algumas inseguranças jurídicas nacionais, alguns comportamentos dos poderes. Isso tudo provoca uma preocupação. Quem ganha o suficiente para viver e consome tudo, vai continuar consumindo. Esse é o perfil que se mantém. Nós temos um sistema tributário muito errado para crescimento econômico. Tributamos demais o consumo na base. E, agora, com a Reforma Tributária, vamos tributar também o serviço. Isso trava o crescimento econômico. As pessoas que têm mais renda compram bens e aplicam parte do seu capital. As pessoas de menor renda consomem integralmente.
JC - Quais as atividades que estão sendo desenvolvidas pela Fecomércio?
Bohn - Estamos sempre trabalhando para mitigar as dificuldades que o empresariado enfrenta. E, claro, o sistema tem dois grandes braços sociais, o Sesc e o Senac, que estão investindo muito. Teremos grandes obras pelo Estado. Estamos construindo uma escola dentro do nosso Sesc Protásio Alves, o Sesc Campestre. Compramos a escola São Judas Tadeu, que passa a ser uma escola do Sesc e do Senac. Enfim, vamos em frente.