O mercado imobiliário testemunhou, em 2024, um crescimento sem precedentes nas aquisições de multipropriedades. No mundo, de acordo com pesquisa da PwC, empresa de consultoria global, a economia colaborativa, que inclui o modelo de condomínio, deve movimentar US$ 335 bilhões até o final de 2025.
No Brasil, em Valor Geral de Venda (VGV), o mercado chegou a R$ 100 bilhões no último ano, com um crescimento de 25% em relação ao ano de 2023, segundo dados da Caio Calfat Real Estate Consulting, registrados no relatório "Cenário do Desenvolvimento de Multipropriedades no Brasil". Ao mesmo tempo, porém, crescem as queixas de consumidores sobre falhas de contrato.
Voltado para investimentos em imóveis de lazer com uso fracionado e compartilhado de um imóvel entre diversos proprietários, o modelo é adotado, na maior parte, em locais turísticos. O crescimento foi fortalecido com a aprovação de legislação própria (Lei 13.777/2018), que regulamenta a modalidade, dando maior segurança jurídica às operações.
Especialista em Direito Imobiliário, a sócia e coordenadora Jurídica Empresarial do escritório Scalzilli Althaus (SCA), Ingrid Spohr, a multipropriedade passou a ser bastante utilizada a partir da lei que alterou o Código Civil e a Lei de Registros Públicos. A multipropriedade é, basicamente, um condomínio, um modelo de propriedade em que determinado imóvel é dividido entre várias pessoas, sejam físicas ou jurídicas.
Além do compartilhamento de determinado bem, é necessária a divisão dos custos de sua manutenção, o que, muitas vezes passa despercebido para quem os adquire. Uma rápida pesquisa em sites de reclamações identifica o descontentamento de dezenas de proprietários. A compra de impulso pode ser a explicação para as dezenas de reclamações.
“A multipropriedade é para ser algo bom, algo que dê as pessoas acesso a imóveis diferenciados com custo menor, já que o custo é compartilhado, e com uma flexibilidade de poder usar. O que acontece é que, as cláusulas do contrato não são analisadas”, ressalta a advogada. Os contratos, em geral, são na modalidade de adesão, isto é, o documento é previamente produzido, aguardando apenas a assinatura do novo proprietário. “Esses contratos, muitas vezes, trazem cláusulas que nem sempre as pessoas aprofundam e podem trazer taxas de administração abusivas”, diz a especialista, ressaltando a importância de contratar um advogado para a análise do documento.
As cláusulas que devem ter atenção especial seriam, principalmente, as que dizem respeito a formas de administração (taxas a serem pagas) e qual o período que estará disponível e quando será ocupado por outros proprietários, inquilinos ou cessionários, entre outros detalhes. Também é importante verificar se há penalidade para o distrato, isto é, o cancelamento do contrato. “A abusividade nas taxas, a dificuldade de uso do imóvel e a multa em caso de cancelamento são as três principais reclamações que a vemos.” Ingrid defende a substituição do nome para propriedade compartilhada, facilitando o entendimento do comprador.
O marketing agressivo é destacado pela advogada Cristiani Senna, cujo escritório é especialista em distratos. “As pessoas estão sendo abordadas nas calçadas com promessas falsas de rentabilidade”, observou Cristiani. “Em geral, são pessoas com menor poder aquisitivo, seduzidas por uma possibilidade que não existe”, acrescentou.
Para os casos de taxas abusivas, multas não informadas e eventuais dificuldades de intercâmbio de espaços, ao contrário do que informa o contrato, é possível aplicar o Código de Defesa do Consumidor, de forma subsidiária, em caso de clientes hipossuficientes. “De forma geral, como não se trata de uma relação de consumo, mas de compra e venda, o negócio é regulado pelo Código Civil do que pelo CDC”, explica Ingrid. “São muitas as ações que tramitam no Judiciário com esse tema”, revela.