Em uma sessão histórica, o Congresso Nacional promulgou nesta quarta-feira (20) a reforma tributária que substitui cinco tributos sobre consumo e coloca o Brasil no mapa dos países que adotam o sistema IVA - Imposto sobre Valor Agregado. A promulgação consolida a aprovação da primeira reforma tributária desde a redemocratização e põe fim ao atual sistema tributário, criado ainda na década de 1960, depois de cerca de 35 anos de discussão.
A cerimônia contou com a participação do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Lula (PT), do vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB), do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, além dos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) e do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso. A promulgação foi declarada pelo presidente do Congresso. "O dia de hoje será lembrado, não apenas como um marco histórico, mas também como um ponto de virada, um divisor de águas. É aqui que mudamos a trajetória do Brasil. Esse dia representa o início de um novo País rumo ao progresso. É uma conquista do Congresso Nacional e do povo brasileiro", destacou.
Durante a cerimônia no Congresso Nacional, o presidente Lula (PT) afirmou que o seu governo não precisa gostar do parlamento e acrescentou que ele é a "cara da sociedade brasileira". Lula ainda se referiu a Deus para agradecer pela promulgação da reforma tributária. "Apenas o todo poderoso consegue fazer um Congresso Nacional adverso aprovar uma nova política de impostos para o País", ressaltou o presidente. A declaração foi feita em discurso na Câmara dos Deputados, durante sessão solene da promulgação da reforma tributária no Congresso.
O presidente Lula disse que a reforma tributária certamente não vai resolver todos os problemas, mas ela foi a demonstração de que o Congresso Nacional, "toda vez que teve que mostrar compromisso com o povo brasileiro, ele mostrou. Quando foi desafiado, ele mostrou", afirmou o presidente.
Com agradecimentos ao governo pela inclusão de mulheres na fileira dos que comemoram a promulgação da reforma tributária, a ministra do Orçamento, Simone Tebet, classificou o texto como a única reforma que faltava para fazer o Brasil realmente crescer, pela primeira vez em 30 anos, acima da média medíocre de 1% ao ano. Segundo a ministra, a reforma manda um recado "muito claro" para todos, o de que é possível unir o Brasil quando é para o interesse do povo. "É a reforma que vai dar dignidade ao povo brasileiro, e mais do que isso, ela é a reforma dos mais pobres", afirmou a ministra, salientando que o texto beneficia principalmente as mulheres. "Agora entendemos porque ela é a mãe de todas as reformas, ela é a reforma das mulheres brasileiras", acrescentou. Tebet disse ainda que lamentavelmente a "cara mais pobre do povo brasileiro é a de uma mulher negra do Norte ou Nordeste".
A sessão desta quarta-feira marcou ainda o primeiro passo de um longo percurso até a implementação efetiva do novo modelo, que começará em 2026 e será concluída no início de 2033. A partir de agora, o Poder Executivo terá até 180 dias para enviar os projetos de lei complementar que vão regulamentar a reforma -uma das prioridades do Congresso no próximo ano. Segundo as contas do Ministério da Fazenda, a alíquota-base está estimada em 27,5%.
O governo trabalha com o envio de ao menos três propostas para, entre outros temas, criar o comitê gestor formado por estados e municípios e definir regras e alíquotas dos novos tributos, incluindo regimes específicos de setores que ficarão fora do alcance do IVA. A aprovação de um novo sistema tributário representa uma vitória do governo Lula, e dá a Pacheco e Lira uma marca emblemática às suas gestões.
Desde o início do ano, o ministro da Economia, Fernando Haddad, colocou a reforma tributária como um dos pilares da agenda econômica e criou uma secretaria extraordinária voltada ao tema, comandada por Bernard Appy -formulador técnico da versão inicial da PEC 45, uma das bases para a reforma aprovada.
A sessão também teve a participação dos relatores de cada Casa, o deputado federal Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e o senador Eduardo Braga (MDB-AM), além do presidente do MDB, deputado Baleia Rossi (SP), que apresentou a PEC e formalizou a proposta de Appy no Congresso Nacional. A reforma tributária foi aprovada na Câmara em julho por 382 votos a 118, com apoio dos dois grandes blocos da Casa, que juntos reúnem siglas como União Brasil, PSD, MDB, PSDB, PSB, PP e Republicanos, além do bloco governista, que inclui PT, PC do B e PV.
O ex-presidente da República, Jair Bolsonaro (PL) tentou barrar a proposta junto aos senadores e garantiu que seu partido orientasse contra nas duas Casas. No Senado, o Republicanos, o Novo e parte do Podemos se juntou ao PL para votar contra a PEC. No Senado, a reforma foi aprovada no mês passado com o placar apertado de 53 a 24 -expondo o clima de tensão que marcou a sessão e ameaçou enterrar a PEC. Na sexta-feira (15), a Câmara validou o texto do Senado por 371 a 121.
A reforma aprovada prevê a fusão de PIS, Cofins e IPI (tributos federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal) em um IVA dual. Uma parcela da alíquota será administrada pelo governo federal por meio da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), e a outra, por estados e municípios pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços). Também será criado um Imposto Seletivo sobre bens e serviços considerados prejudiciais à saúde (como cigarros e bebidas alcoólicas) ou ao ambiente, à exceção dos produzidos na Zona Franca de Manaus. A implementação dos novos tributos começará em 2026, com uma alíquota teste de 0,9% para a CBS e de 0,1% para o IBS.
Em 2027, PIS e Cofins serão completamente extintos e substituídos pela nova alíquota de referência da CBS. As alíquotas do IPI também seriam zeradas para a entrada em vigor do Imposto Seletivo, com exceção dos bens produzidos na Zona Franca. A migração dos impostos estaduais e municipais para o novo IBS será mais gradual, dada a necessidade de dar segurança jurídica a benefícios já concedidos sob o atual sistema. Por isso, ICMS e ISS serão totalmente extintos apenas em 2033.
Para vencer a disputa entre os estados, o ministro da Economia, Fernando Haddad, também precisou abrir os cofres da União e injetar recursos em um fundo para bancar novos incentivos regionais, que alcançarão R$ 60 bilhões a partir de 2043.
Folhapress