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CONJUNTURA INTERNACIONAL

- Publicada em 01 de Agosto de 2014 às 00:00

Estado contabiliza prejuízos com Argentina


JUAN MABROMATA/AFP/JC
Jornal do Comércio
Com o fim das esperanças de um acordo de última hora entre a Argentina e os credores para o pagamento da dívida soberana, a indústria gaúcha começa a ampliar as projeções de prejuízos na balança comercial. As vendas externas do Rio Grande do Sul, que já acumulam retração de 22% no comparativo entre os primeiros seis meses de 2013 e 2014, tendem a registrar novas quedas com a consolidação dos danos gerados pela confirmação do novo calote internacional argentino.
Com o fim das esperanças de um acordo de última hora entre a Argentina e os credores para o pagamento da dívida soberana, a indústria gaúcha começa a ampliar as projeções de prejuízos na balança comercial. As vendas externas do Rio Grande do Sul, que já acumulam retração de 22% no comparativo entre os primeiros seis meses de 2013 e 2014, tendem a registrar novas quedas com a consolidação dos danos gerados pela confirmação do novo calote internacional argentino.
No olho do furacão, estão os setores moveleiros, calçadista, têxtil, máquinas e implementos agrícolas que, historicamente, possuem relações comerciais mais próximas com o país vizinho. Para o presidente da Fiergs, Heitor Müller, a expectativa a respeito do segundo default argentino em 12 anos já havia gerado um fato inusitado. No primeiro semestre, todos os setores econômicos registraram quedas em seus embarques ao país vizinho. “As empresas devem olhar com muito cuidado o mercado argentino”, revela. 
Terceiro maior produtor de soja do planeta, a Argentina é também o principal destino internacional de máquinas e equipamentos agrícolas produzidos no Estado. De acordo com o presidente do Simers, Claudio Bier, o novo desgaste econômico limita o potencial de recuperação do setor para segundo semestre. “No mercado interno esperávamos uma retração de apenas 10%. Agora, fica difícil prever uma recuperação para as exportações.”
O calote deverá acarretar impactos mais globalizados na economia nacional, em razão do atraso nos acordos internacionais. De acordo com Cynthia Kramer, doutora em Direito Internacional do escritório L.O. Baptista-SVMFA algumas negociações do Mercosul serão prejudicadas. Um dos exemplos é a tentativa de acelerar o calendário de redução tarifária negociado entre o Mercosul e países como Chile, Peru e Colômbia.

Calçadistas esperam redução de 25% nas vendas

O presidente executivo da Abicalçados, Heitor Klein, afirma que as exportações brasileiras de calçados para a Argentina registram quedas consecutivas desde 2012, quando o país vizinho passou a exigir as chamadas Declarações Juramentadas Antecipadas de Importação (DJAIs). O mecanismo, considerado ilegal por não estar previsto nas regulamentações da Organização Mundial do Comércio (OMC), visava garantir a política de equiparação, ou seja, para cada dólar importado, um deveria ser exportado.
Neste contexto, o Brasil, que chegou a exportar 15 milhões de pares, o equivalente a US$ 200 milhões em calçados para a Argentina, em 2014, não deve atingir o patamar de US$ 50 milhões em 2014. A queda superior a 25%, na opinião de Klein, corrobora com a sensação de que o pior estrago já estaria consolidado. “Nessa situação, a formalização do default não deve mudar muito um quadro obscuro que já vivenciamos nos últimos meses, chegando inclusive a trazer reflexos sobre os pagamentos previstos”, comenta.
Para o dirigente, no entanto, fica evidente que a situação tende a ser agravada, com a Argentina tentando segurar reservas internacionais através da utilização de mecanismos ainda mais protecionistas. “Tudo isso é muito recente. O que se pode extrair de bom é que a poeira começa a sentar. Passado o período mais conturbado de negociações, teremos definições. Agora é hora de buscar alternativas dentro dos setores privados, pois existe uma relação comercial muito forte que é de interesse dos dois países”, defende.

País perde importância como destino de móveis

O agravamento da crise na Argentina determina a perda de seis posições no ranking dos principais destinos da produção moveleira gaúcha. O país, que registra reduções graduais nos valores negociados, mantinha-se na segunda colocação desde 2009, quando eram embarcados cerca de US$ 75 milhões ao mercado argentino. No primeiro semestre de 2014, a queda de 32% na comparação com o mesmo período do ano passado reduziu o peso do mercado. Com apenas US$ 2,3 milhões vendidos, a tendência é de que os vizinhos percam ainda mais a representatividade até o encerramento de 2014. 

Setor têxtil projeta déficit de 20% nas transações

A Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) prevê a intensificação de alguns problemas capazes de gerar um déficit de 20% nas transações comercias entre o Brasil e a Argentina. Conforme explica o diretor-superintendente da entidade, Fernando Pimentel, a nova condição de isolamento representa mais um duro golpe para o isolamento do Mercosul.
Nos últimos cinco anos, o Brasil foi responsável por 50% das importações têxteis da Argentina. Em 2014, o patamar deve cair para apenas 22%. Além disso, Pimentel projeta redução de 20% no superávit da balança comercial brasileira com o país vizinho que, atualmente, é inferior a US$ 120 milhões.
O fator argentino também deve ser responsável por ampliar para 5,5% o peso da indústria têxtil nas projeções de déficit na balança comercial manufatureira em 2014, estimado em US$ 5,8 bilhões. “O impacto da Argentina pode até ser pouco expressivo, mas determina uma queda de produção e de embarques significativa”, afirma Pimentel.

Calote pode parar na Corte de Justiça de Haia

Um dia após entrar em calote, ao não conseguir fechar acordo com um grupo de credores e ficar impossibilitado de pagar uma parcela da dívida que vencia na quarta-feira, o governo argentino afirmou que vai utilizar todos os instrumentos legais para resolver a questão. “Temos de defender nossos interesses”, afirmou a presidente Cristina Kirchner, em pronunciamento em rede nacional de TV. Uma das possibilidades aventadas é recorrer à Corte Internacional de Justiça de Haia e à ONU.
O governo argentino voltou a afirmar que não está em default (calote), já que realizou o pagamento dos credores que aceitaram a renegociação da dívida em 2005 e 2010. Por uma decisão da Justiça de Nova Iorque, no entanto, o dinheiro depositado no Bank of New York Mellon (US$ 539 milhões), referente à parcela que vencia na quarta-feira, só pode chegar às mãos dos credores se o país pagar também cerca de US$ 1,3 bilhão devido aos credores que não aceitaram a reestruturação da dívida, conhecidos como holdouts. Como o acordo com os detentores desses títulos não foi fechado, o dinheiro segue bloqueado, o que configuraria o calote.
Para o ministro da Economia, Axel Kicillof, porém, dizer que o país está em “estado de calote” é uma “babaquice atômica”, já que o dinheiro está bloqueado por uma decisão judicial. “Isso não é um calote”, argumentou Kicillof. “A Argentina pagou!”
Uma esperança argentina para resolver a questão era a negociação direta entre um grupo de bancos do país e os fundos detentores dos títulos. Na quarta-feira à noite, um desfecho positivo era considerado como factível, mas as conversas esfriaram um pouco nesta quinta-feira.
Aparentemente, os bancos argentinos propõem um pagamento de US$ 1,4 bilhão pelos títulos, sendo US$ 250 milhões à vista e o restante em parcelas. Os valores e a forma de pagamento, no entanto, eram contestados por alguns fundos que participam das negociações.
Nesta sexta-feira, as conversas entre o governo argentino e os fundos podem tomar um novo rumo. O juiz norte-americano Thomas Griesa convocou uma nova audiência, para as 12 horas (de Brasília), para definir “aonde vão as partes a partir de agora”, nas palavras de um assessor do juiz. Griesa preside as batalhas judiciais entre a Argentina e seus credores há mais de uma década.
Na prática, o calote argentino - involuntário ou não - será parcial, já que do total de US$ 10,792 bilhões que deveria pagar a todos seus credores reestruturados em 2014 e 2015, não poderá entregar US$ 3,086 bilhões. Em Buenos Aires, os economistas divergiam em chamar esta situação de “calote técnico”, “transitório” ou “calote administrativo”.
“Em 2001 houve um calote mesmo. Não dava para pagar porque não havia grana”, declarou Kicillof, ilustrando, com termos populares, a diferença da crise de pagamentos de treze anos atrás em comparação com a atual.
O ministro também não poupou críticas ao juiz Griesa, que, segundo ele, favoreceu os holdouts nessa disputa nos tribunais: “Esse juiz deu aos abutres metralhadoras e canhões”.
Kicillof voltou a sustentar que o governo Kirchner não aceitará acordos que não sejam favoráveis. Mas, sustentou esperar que os holdouts cedam perante a posição argentina. “Esperemos que essas pessoas sejam razoáveis”, disse Kicillof.
Em meio às tensões surgidas pelo estado de calote, o grupo francês Carrefour anunciou que reduzirá o ritmo de seus investimentos na Argentina.
Já o Banco Santander indicou, por intermédio de seu conselheiro Javier Martín, que “não seria afetado” pelo calote. Segundo ele, o banco - embora tivesse percebido uma queda na economia local - considera que a Argentina é um “país interessante para estar”. Martín também sustentou que “essa novela (a disputa com os holdouts nos tribunais em Nova Iorque) ainda não está acabada”.
Enquanto isso, a preocupação pelos efeitos do calote espalham-se na população argentina. Isso é o que indica uma pesquisa elaborada pela consultoria Management & Fit, que indicou que 44,2% dos argentinos consideram que o governo é o responsável pela situação de calote. Outros 17,6% sustentam que a culpa é do juiz Griesa, enquanto que 18,1% afirmaram que a responsabilidade é de ambas partes.
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