No Museu do Trabalho de Porto Alegre, o tempo passa como um passatempo e marca, na fachada, o compasso do relógio para o final da 14ª Bienal do Mercosul. A mostra, iniciada em 27 de março, se encerra neste domingo (1º de junho), provocando a curiosidade e a atenção de mais de 830 mil visitantes em dezenas de espaços pela capital gaúcha. E reafirma o sucesso da iniciativa, lançada em 1997 com o objetivo de promover a arte contemporânea da América do Sul.
A obra Passatempo, da fotógrafa e artista plástica caxiense Rochelle Costi, morta em 2022, porém, afixada a cerca de cinco metros de altura, passa quase despercebida pelo público que circula no local. E desperta surpresa naqueles que a descobrem, integrada à paisagem do ambiente, a nos lembrar sobre a efemeridade da vida, ativar memórias ou nos mandar seguir em frente.
A poucos metros dali, entretanto, militares de pessoas passaram pelas catracas da Usina do Gasômetro (reaberta após as enchentes do ano passado), onde outro estalo – tema desta edição da Bienal – reunia 11 trabalhos de artistas do Uruguai, dos Estados Unidos, de Curaçau, da Inglaterra e de outros lugares. Neste sábado, o movimento foi grande no local.
O designer gráfico Pedro De Marco, as publicitárias Mariana Florensio e Laura Melchior e o arquiteto urbanístico Mike Steyvanne pararam em frente à estrutura com cerca de cinco metros de altura, incitulada "O pesadelo me liberou do meu sonho", elaborada pelo artista plástico Tirzo Martha, de Curaçao. E debateram suas impressões e leituras sobre a composição de pneus, garrafas e sacos plásticos, baldes, água e outros elementos do cotidiano porto-alegrense usados pelo curaçolenho.
Último fim de semana da Bienal
EVANDRO OLIVEIRA/JC
Já a uruguaia Camila Ayala, de mãe brasileira que e alterna períodos em Porto Alegre e em seu país natal, observava por diversos ângulos um conjunto de peças produzidas pelo conterrâneo Ulises Beisso.
“Não vejo essas obras identificadas necessariamente com o Uruguai. Mas trazem algo de mistério, circense e estrutural. Me despertou o interesse por se tratar de um artista uruguaio, que eu não conhecia e que já não está mais entre nós”.
Assim como eles, crianças, jovens, adultos e idosos percorreram durante todo o dia os dois andares da Usina onde as peças estão instaladas, observando, analisando, fotografando e levando para casa leituras únicas para cada um. Esse, aliás, é o propósito da mostra.
“Os artistas trazem a criatividade, despertam o interesse. E cada pessoa incorpora seus conceitos e leituras às obras que estão expostas. A transformação pela arte é o mais importante do projeto”, resume a presidente da 13ª e da 14ª Bienal do Mercosul, Carmen Ferrão.
A proposta era abrir o leque de locais para exposições, levando arte adiante dos museus e se integrando ao cotidiano. Foi assim nas Estações Lomba do Pinheiro e Cidadania, no bairro Restinga, o mais populoso e um dos mais populares da cidade. Obras comissionadas (confeccionadas no local, especialmente para a Bienal), buscavam se comunicar com as comunidades que vivem nesses locais.
A 14ª Bienal do Mercosul reúne 77 artistas, de mais de 30 países, além de uma grande programação pública, com workshops, práticas esportivas. Abriu também 42 galerias de arte para 63 exposições, com obras de mais de uma centena de artistas, por meio do projeto Portas Abertas. Mas a mostra passou também, claro, pela Casa de Cultura Mário Quintana, o Museu de Artes do Rio Grande do Sul e o Farol Santander, por exemplo. São espaços tradicionais para a arte e que estão na essência de qualquer roteiro da mostra, podendo ainda ser conferidos no domingo.
Em um legado desta edição da mostra para Porto Alegre, o artista plástico boliviano Freddy Mamani deixa sua impressão digital e sensibilidade na fachada da Fundação Ecarta, transformando o prédio em uma obra de arte permanente que celebra a cosmologia dos povos andinos. A pintura foi concluída em março deste ano e marca a estreia da Fundação Ecarta como espaço expositivo da Bienal.
“São 18 espaços expositores, além de galerias e outras ações. Oportunidade para que o público consuma mais arte, em diferentes formatos. Inclusive na gastronomia, que introduzimos pelo projeto Arte no Prato. Foram 50 restaurantes cujos chefs elaboraram pratos inspirados no tema da mostra”, acrescenta Carmen.
Neste penúltimo dia do evento, a Praça Júlio Andreatta, entre as avenidas Ceará e Benjamin Constant, no bairro São Geraldo, foi palco do Estalo de Rua, uma das atrações do encerramento da Bienal, com apresentações de artistas como Dessa Ferreira, Viridiana, Saskia, o grupo Turucutá e Jessie Jazz. Mas ainda há mais para ver no domingo. Todas as informações e oportunidades para aproveitar até o último instante da 14ª Bienal do Mercosul podem ser conferidas no site bienalmercosul.art.br.