Porto Alegre,

Anuncie no JC
Assine agora

Publicada em 24 de Fevereiro de 2025 às 01:25

Quando o luto vira disco de rock: banda Ilegítimos retrata luta contra câncer em 'Vazio Póstumo'

Narrando o luto do vocalista ao perder a esposa para o câncer, banda gaúcha Ilegítimos estreia com o álbum Vazio Póstumo

Narrando o luto do vocalista ao perder a esposa para o câncer, banda gaúcha Ilegítimos estreia com o álbum Vazio Póstumo

/NILTON SANTOLIN/DIVULGAÇÃO/JC
Compartilhe:
Igor Natusch
Igor Natusch Editor de Cultura
O luto é um assunto ao mesmo tempo universal e intimidador. Todo mundo que tenha vivido tempo suficiente perdeu pessoas amadas e precisou lidar com o turbilhão de sentimentos que isso envolve. Isso não significa, porém, que as pessoas se disponham facilmente a reviver (ou ressignificar) esses momentos difíceis por meio de uma produção artística. Não deixa de ser admirável, portanto, que uma banda de rock autoral decida fazer de seu primeiro álbum de estúdio um trabalho conceitual em torno do luto - mais ainda, da morte da esposa de um dos integrantes, vitimada pelo câncer em 2016. Vazio Póstumo, disco inaugural da banda gaúcha Ilegítimos e que já está disponível nas plataformas digitais, ganha uma camada extra de significado a partir da profundidade de seu conteúdo lírico, convidando os ouvintes não apenas a conhecer o som da banda, mas a uma reflexão bem mais profunda do que costumamos associar com trabalhos de estreia.
O luto é um assunto ao mesmo tempo universal e intimidador. Todo mundo que tenha vivido tempo suficiente perdeu pessoas amadas e precisou lidar com o turbilhão de sentimentos que isso envolve. Isso não significa, porém, que as pessoas se disponham facilmente a reviver (ou ressignificar) esses momentos difíceis por meio de uma produção artística. Não deixa de ser admirável, portanto, que uma banda de rock autoral decida fazer de seu primeiro álbum de estúdio um trabalho conceitual em torno do luto - mais ainda, da morte da esposa de um dos integrantes, vitimada pelo câncer em 2016. Vazio Póstumo, disco inaugural da banda gaúcha Ilegítimos e que já está disponível nas plataformas digitais, ganha uma camada extra de significado a partir da profundidade de seu conteúdo lírico, convidando os ouvintes não apenas a conhecer o som da banda, mas a uma reflexão bem mais profunda do que costumamos associar com trabalhos de estreia.
Vazio Póstumo conta a história do casal formado por Giuliano Mendes, vocalista da Ilegítimos e que adota o nome artístico Jeff Lee, e sua esposa Fernanda Bastolla - que, no curto período de menos de um ano, foi diagnosticada com um tumor maligno no cérebro, passou por uma cirurgia de emergência e um duro tratamento antes de falecer. A partir dessa perda, Jeff passou a vivenciar todas as sensações devastadoras do luto - e encontrou na música a força para atravessar esse período. "Eu tinha duas escolhas quando fiquei viúvo: ou eu me afundava numa depressão muito profunda, ou eu reagia àquilo. E o processo de composição acabou sendo (o começo de) um ciclo de recuperação, uma forma de superar esse luto", conta o cantor. 
As primeiras músicas surgiram, segundo ele, de forma muito natural, já sugerindo um arco narrativo típico de um disco conceitual. Esse processo de colocar a perda em música coincidiu com a disposição do vocalista em voltar à cena rock, da qual estava afastado há alguns anos. Embora a Ilegítimos não tenha nascido diretamente para transformar as composições de Jeff Lee em realidade, a verdade é que a banda foi ganhando forma sob a influência do álbum que viria. "A banda estava formada há pouco tempo, mas entendeu esse processo e pegou junto, acharam (o disco conceitual) uma ideia maravilhosa. E aí a gente foi colocando em prática", explica Jeff Lee.
As 13 faixas foram tomando forma em um período de cinco anos, com a gravação e mixagem avançando na medida em que as circunstâncias permitiam. O ex-guitarrista da banda, Jimmy Azevedo, contribuiu com o processo de composição, mas não chegou a tomar parte das gravações - feitas pela atual formação, com Felipe Silveira (bateria), Rafa Pestana (baixo) e Rafael Sehn (guitarra). O álbum conta com convidados como o saxofonista King Jim (que marcou época com os Garotos da Rua), Andréa Cavalheiro (vocalista da Hard Working Band), Yanto Laitano e Pablo Schinke. O resultado final mostra com clareza as influências de rock nacional dos anos 1980, principal norte sonoro do conjunto, ainda que abra espaço para momentos quase de rock progressivo, como em Cefalgia e em Redenção, uma das mais emotivas do disco.
Porém, que não se pense que Vazio Póstumo é uma simples coleção de canções tristes e deprimentes. Embora a carga emocional seja inegável, as sombras do conteúdo lírico são frequentemente iluminadas pelo instrumental - que consegue fugir (ora com leveza, ora com vigor e energia) do excesso melancólico que poderia transformar a audição em uma viagem pesada demais. "As letras são pesadas porque se trata de um processo de luto, falam de ansiedade, de tumor, dor. Mas existe esse contraste, esse contraponto com o instrumental que eu acho bem interessante. É um álbum com bastante vigor. Acho que tem muito da influência do The Who, que fazia álbuns conceituais, mas muito para cima, muito enérgicos."
Concretizar Vazio Póstumo teve, para Jeff Lee, um sentimento extra de libertação. "Para mim, foi como tirar uma carga enorme das costas", admite. "Esses oito anos, de 2016 até 2024, foram o período mais conturbado que passei na vida. Mas as coisas têm que ser vividas, e eu achava importante passar por esse processo. Tudo tem um ciclo. Com o encerramento do álbum, acho que eu entro num ciclo de mais alegria, mais felicidade e satisfação, parecido com o que eu e minha mulher tínhamos antes da doença. (Nosso namoro e casamento) foi um período de muita vivência, de muita responsabilidade emocional, eu aprendi muito com ela", pondera. 
Agora, o desafio é fazer Vazio Póstumo chegar às pessoas, num momento em que a indústria musical e o próprio público ouvinte parecem, em geral, distanciar-se do formato álbum em favor de reproduções em aplicativos e virais de redes sociais. "Hoje o mercado não dá muita importância para o álbum, mas (no nosso caso) existia uma história por trás, um single só não conta uma história. Mas o mercado está aí e nós optamos pelas duas formas (singles e disco completo)", diz. Para 2025, a proposta é "uma promoção mais agressiva" do álbum, com datas de show sendo negociadas e a possibilidade de tiragens em formato físico, a partir do acordo com um selo de distribuição, que está em negociação. 
 

Notícias relacionadas