Desde os tempos de Pandora é sabido que mesmo pequenas caixas podem guardar conteúdos bombásticos. De fato, é possível que muitos que observem a caixa Prelúdios, em seus modestos 25x25cm e 5cm de profundidade, demorem para se dar conta do tesouro ali contido. É arte de variadas dimensões: o objeto de arte contém o CD Prelúdios para Piano Livro II, com 12 obras do compositor Vagner Cunha, interpretadas pelo pianista Ney Fialkow, e cinco gravuras criadas pela artista visual Teresa Poester enquanto escutava as composições em sua casa-ateliê em Eragny-sur-Epte, a 70 km de Paris. A própria caixa é um projeto do artista gráfico Fábio Zimbres, produzida sob medida pela Cartonaria.
O item, que já nasce com aquela aura sedutora e difícil de definir dos objetos fora de série, terá lançamento oficial nesta terça-feira (29), às 19h30min, no foyer do Theatro São Pedro (Praça Marechal Deodoro, s/n). Na ocasião, haverá recital de Ney Fialkow executando as canções inclusas no CD, além de exposição ao público das gravuras de Poester, que virá da França especialmente para prestigiar o lançamento. O evento é gratuito.
As caixas estarão à venda durante o lançamento, ao valor de R$ 5,8 mil a unidade - a tiragem é limitada a 30 cópias, numeradas e personalizadas com as assinaturas dos artistas. Na ocasião, também é possível comprar as partituras dos Prelúdios, impressas em papel personalizado e com anotações a lápis do compositor, ao valor de R$ 900,00; nesse caso, apenas 10 cópias de Prelúdios I e outras 10 de Prelúdios II estarão disponíveis. Para quem prefere uma opção menos dispendiosa, o CD avulso de Prelúdios Para Piano Livro II poderá ser adquirido, com valor (R$ 50,00) e tiragem (100 cópias) mais acessíveis.
O artefato em questão é a mais recente concretização de uma colaboração artística que não vem de hoje. "Fazemos coisas juntos há mais ou menos 230 anos. A parceria criativa começou nessa época", afirma Vagner Cunha, com a convicção de quem tem motivos para ser superlativo. "Nossos ímpetos são biológicos e acho que isso começou lá com Hesíodo (poeta grego da antiguidade). 'Pastores agrestes, vis infâmias e ventres só, sabemos muitas mentiras dizer símeis aos fatos e sabemos, se queremos, dar a ouvir revelações'", cita.
No mundo das coisas tangíveis, a parceria começou em 2014, na exposição Anagramas, quando Teresa criou um vídeo (Outubro) a partir da musica de Vagner. "Eu já conhecia a música dele, já adorava várias coisas que eu tinha ouvido dele. E ele me mandou um e-mail de uma exposição minha que ele tinha visto, em 2009, no Museu do Trabalho, que era só caneta (esferográfica) em grandes dimensões, e ele gostou muito e me escreveu", recorda Teresa. Ponto de partida para uma parceria que vem ganhando diferentes formas e desdobramentos desde então - e que inspira um ao outro nas suas trajetórias artísticas, de uma forma que vai muito além das realizações em dupla.
“Coloquei as gravuras (da caixa) perto de mim para responder essas perguntas”, revela Vagner. “Teresa produz incensos maravilhosos que perfumam minha casa. Escrever música com esses aromas invadindo todos os cômodos é irresistível. Costumo olhar um desenho (um jardim) dela que está na minha parede todos os dias durante alguns minutos. Isso me ajuda a ter vontade de acordar no dia seguinte”. Teresa devolve os elogios: “Ele é uma pessoa extremamente apaixonada por artes plásticas e também por cinema, por teatro, por literatura. É uma pessoa muito interessante de conversar sobre todas as formas de arte, porque todas elas se complementam.”
Em um período no qual o objeto colecionável anda tão fora de moda, o lançamento de um material como esse tem um peso especial. Afinal, ele é altamente colecionável por definição, e entrega a cada comprador uma experiência praticamente única. "Os objetos exclusivos estão no momento áureo. A moda está insuportável e não fazemos nada pela moda. Ela passa. O que nos guia a algo é a permanência e a possibilidade de ver a mesma coisa todos os dias sem que ela seja a mesma", acentua Vagner. Teresa concorda, e complementa: "Eu também faço coisas em série, que podem ser comercializadas de uma forma mais barata, até para democratizar o meu trabalho. Mas eu trago essa coisa da obra única na própria essência do trabalho de um artista visual, assim como o Vagner (na música). A própria gravura, cada unidade é considerada um original, porque ela nem suporta muito. Então, é algo numerável (por definição), não pode ter mais do que 30 unidades, e essas são as 'originais' dentro da gravura."
Uma raridade que, por definição, está associada ao custo - tanto o necessário para a obra acontecer, quanto o que deve ser investido para adquiri-la. "Eu penso muito sobre isso, porque realmente um trabalho assim como esse sai caro para as pessoas, porque sai caro para nós: temos que nos pagar, pagar as pessoas que trabalharam para a gente, os impressores, (os custos da) caixa, enfim", enumera Teresa. "Mas, ao mesmo tempo, eu não faço um quadro com o objetivo exclusivo de vender. Meu objetivo maior é que a arte seja vista, é poder fazer uma exposição que eu possa mostrar para meus amigos e para outras pessoas - e essa exposição é de graça. As músicas do Vagner também estão no Spotify, estão por aí para serem ouvidas (com baixo custo). Agora, quem quiser adquirir (um item como Prelúdios), vai poder ter em casa uma coisa que pode ser cara, mas que reflete um valor mais alto, para nós e também para esse colecionador ou apreciador da arte."