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Artes Cênicas

- Publicada em 25 de Julho de 2022 às 00:35

'Gabinete de Curiosidades' revela o poder transformador do teatro

Atores Zé Adão Barbosa e Arlete Cunha vão do 
drama à comédia em Gabinete de curiosidades, 
com direção de Luciano Alabarse

Atores Zé Adão Barbosa e Arlete Cunha vão do drama à comédia em Gabinete de curiosidades, com direção de Luciano Alabarse


/Alisson Fernandes de Aguiar Aly/Divulgação/JC
Adriana Lampert
O final da vida de um artista pode ter um tom muito dramático, dependendo de sua sorte. No Brasil, não são poucos os profissionais deste setor que acabam abandonados, sem assistência ou apoio de amigos e familiares. Para piorar, nos últimos anos, em todo o País a cultura vem sofrendo ataques em diversos aspectos, desde o desmonte de políticas públicas até a desvalorização por alguns grupos da sociedade.
O final da vida de um artista pode ter um tom muito dramático, dependendo de sua sorte. No Brasil, não são poucos os profissionais deste setor que acabam abandonados, sem assistência ou apoio de amigos e familiares. Para piorar, nos últimos anos, em todo o País a cultura vem sofrendo ataques em diversos aspectos, desde o desmonte de políticas públicas até a desvalorização por alguns grupos da sociedade.
O que esses fatos têm a ver com o novo espetáculo dirigido por Luciano Alabarse? A resposta é: tudo. Com estreia marcada para esta quinta-feira, às 21h, no Theatro São Pedro, a montagem Gabinete de curiosidades aponta, de forma bem humorada, para esta realidade. A peça cumpre curta temporada no decorrer do final de semana, com sessões na sexta, às 17h e 21h; e no sábado, às 21h. Ingressos à venda pelo Sympla, por preços que vão de R$ 5,00 (galerias) a R$ 60,00 (plateia).  
No elenco, Arlete Cunha e Zé Adão Barbosa vivem dois atores octagenários, abandonados em um asilo público, que relembram momentos de suas carreiras bem-sucedidas no teatro. Em meio a lamentos pelo ostracismo, eles administram a solidão sonhando em montarem uma nova peça. "Como velhos companheiros, e nesta condição de fragilidade, eles vivem momentos tristes e engraçados, e trocam sentimentos de amor, afeto, implicância, temperamentalismo", resume o diretor.
As atuações asseguram seriedade e leveza ao texto assinado por Gilberto Schwartsmann, destaca Alabarse, enquanto as cenas são costuradas pela presença fantasmagórica de Hugo, personagem de Fernando Zugno - que volta aos palcos, após uma década, para fazer uma participação especial no espetáculo. Ele circula pelo espaço entre os atos, como se fosse uma voz em off que evidencia um contraste entre o ambiente e os atores.
"Este personagem funciona como um spiker, que comenta a realidade devastadora dos dois velhos artistas, que, depois de todo o sucesso que tiveram, agora vivem ao léu", explica Alabarse. "Esta foi uma escolha da direção, que foi muito bem acolhida pelo autor - de tal forma, que, aos poucos, esse personagem foi ganhando novas falas durante os ensaios", emenda o diretor, explicando que Schwartsmann acompanhou de perto o processo criativo do espetáculo.
Ao mesmo tempo em que faz uma referência ao atual momento do País, a peça conta uma história que se passa no ano de 2040, em uma capital fictícia cheia de contradições e injustiças, denominada Corrúpnia. Ali, o respeito ao indivíduo e às diferenças foi praticamente esquecido. As desigualdades são imensas: meia-dúzia de indivíduos ganham mais do que a soma dos rendimentos da metade mais pobre da população.
Alabarse revela que, quando leu o texto de Schwartsmann pela primeira vez, reconheceu eixos relevantes, pelos quais a direção do espetáculo poderia e deveria seguir: a solidão dos personagens - dura, cruel, lírica, turbulenta; as falhas e insuficientes políticas públicas relacionadas à velhice e à terceira idade; o entorno político desse descaso institucional com a cultura e com a velhice. "Nesse contexto, realidade e ficção se misturam, ao mesmo tempo em que durante o espetáculo ocorre uma homenagem ao teatro", resume o diretor. Ele pondera que, na contramão da densidade da trama e também de todo um contexto que condena os artistas e a arte, se sente privilegiado por trabalhar com alguns dos melhores atores do Estado. "Todo o processo, desde a produção (assinada por Letícia Vieira), está sendo muito afetivo." 
Prestes a completar 50 anos de carreira, Alabarse celebra a oportunidade de dirigir um espetáculo que reverencia autores como Beckett, Ionesco e Brecht, ao mesmo tempo que revela mais um dramaturgo gaúcho. "Esta é a primeira peça teatral de Schwartsmann, meu amigo a quem tanto admiro, e que me surpreendeu mais uma vez. Encarei sua proposta dramatúrgica disposto a dar minha contribuição à beleza criativa de seu texto." Apesar do título do espetáculo ser o mesmo de um dos livros de poesia do escritor, Gabinete de curiosidades surge de outra obra sua: O Sol Brilhou na Corrúpnia.
Ele comenta ainda que o texto não estava no seu horizonte de trabalho em 2022. "Eu tinha terminado de estrear O Inverno do Nosso Descontentamento - Nosso Ricardo III (da Cia. Teatro ao Quadrado) e gosto  de fazer uma pausa entre as montagens, para que ocorra o " espaço vazio" do qual falava Peter Brook (diretor teatral falecido no início de julho)". Convidado por Zé Adão Barbosa, Alabarse afirma que aceitou a empreitada "com um prazer enorme". "Zé Adão e Arlete são dois atores de excelência, com os quais já trabalhei. E, nesta peça, o Gilberto faz uma homenagem à história da dramaturgia ocidental, com uma sensibilidade real. Eu, como diretor, fiquei com muita empatia e admiração pelo texto."
"Gabinete de curiosidades é uma declaração de amor ao teatro, às palavras, à arte, enfim: em cena, um velho ator e uma velha atriz vestem retalhos de personagens e brincam com conhecidas palavras, enquanto se alimentam nas emoções, nos confrontos, nas tristezas, nos amores; e divertem-se um com o outro nos ecos do teatro das suas vidas", resume a atriz Arlete Cunha. "É uma metáfora fascinante sobre a resistência da arte e da cultura em tempos de ignorância e barbárie", emenda Zé Adão Barbosa. 
 
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