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Publicada em 30 de Outubro de 2025 às 19:00

O desemprego caiu - ou só a régua mudou?

Paulo Giacomelli - Presidente do Instituto Liberdade

Paulo Giacomelli - Presidente do Instituto Liberdade

IL/DIVULGAÇÃO/JC
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Paulo Giacomelli, presidente do Instituto Liberdade
Paulo Giacomelli, presidente do Instituto Liberdade
O governo tem comemorado com entusiasmo as recentes quedas na taxa de desemprego, divulgadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo o órgão, o índice de desocupação chegou a 5,6% no trimestre encerrado em agosto de 2025 — o menor nível da série histórica. O dado foi apresentado como sinal de que o país vive uma fase de prosperidade no mercado de trabalho. Mas, por trás da euforia oficial, há um problema mais sério: o modo como esses números vêm sendo produzidos e divulgados.
O IBGE anunciou neste ano que revisaria suas séries históricas da PNAD Contínua, o principal levantamento sobre emprego e renda no país, incorporando novos “pesos” derivados do Censo 2022. Essa reponderação, segundo técnicos, pode alterar significativamente os resultados passados, tornando-os artificialmente comparáveis aos atuais. Em outras palavras, o governo passou a festejar recordes estatísticos criados em parte por um ajuste metodológico — e não por mudanças reais na estrutura econômica. Além disso, o cálculo de desemprego no Brasil já é limitado: pessoas que desistiram de procurar emprego simplesmente deixam de ser consideradas “desocupadas”. Assim, quanto mais trabalhadores abandonam a busca, melhor o número parece.
Essa é uma fórmula conveniente para qualquer governo que queira maquiar resultados sem precisar criar empregos de fato. O contexto se torna ainda mais preocupante quando se observa a situação política dentro do próprio IBGE. Desde a chegada de Márcio Pochmann à presidência do instituto, servidores e analistas vêm denunciando o enfraquecimento da autonomia técnica e o uso do órgão para fins de autopromoção. Segundo reportagem da CNN Brasil, funcionários acusam Pochmann de centralizar decisões, substituir técnicos de carreira por assessores de confiança e transformar o IBGE em palco de divulgação pessoal, com entrevistas e comunicados voltados a construir sua imagem política.
Também foi noticiado que a nova gestão tem tentado alterar o estatuto interno do instituto, reduzindo o poder de instâncias técnicas e abrindo espaço para interferência direta do governo nas publicações. Trata-se de um movimento perigoso: o IBGE, historicamente respeitado por sua neutralidade, começa a ser visto como mais um braço de comunicação oficial. Enquanto isso, o Palácio do Planalto aproveita os números “ajustados” para reforçar o discurso de sucesso econômico e eficiência administrativa. É o tipo de narrativa que se sustenta enquanto ninguém olha de perto os critérios usados para produzi-la. Mas o que está em jogo não é apenas a credibilidade de uma estatística: é a confiança do país na integridade das suas instituições de medição e análise.
O aparelhamento do IBGE, somado à manipulação indireta de parâmetros técnicos, cria um cenário em que o dado serve ao discurso. O Brasil pode até registrar números oficialmente positivos, mas quando a metodologia muda conforme a conveniência política, o resultado deixa de refletir a realidade e passa a traduzir apenas o desejo de quem governa. E isso, mais do que um problema técnico, é um sintoma de degradação institucional.

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