Rodrigo Villa Real Mello, diretor financeiro do Instituto de Estudos Empresariais (IEE)
No final de maio, o governo protocolou a Medida Provisória n° 1.300/2025, que visa reformar o setor elétrico, e vem tratando do tema ao longo das últimas semanas. A proposta tem três eixos: modernizar o setor, abrir o mercado e reformar a tarifa social.
Em meio a boas ideias, temos as clássicas jabuticabas brasileiras. A MP recebeu 600 emendas, e o seu desfecho merece mais atenção. A mesma medida que trata positivamente da abertura do mercado livre de energia, atualmente restrito a grandes consumidores, e oferece maior liberdade ao usuário, também avança em auxílios populistas como a expansão da tarifa social.
O governo pretende dar gratuidade na luz para 60 milhões de pessoas que consomem até 80 kWh por mês, além de isentar de pagar a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) de quem utiliza até 120 kWh, o que vai gerar um desconto de 12% na conta. Hoje a tarifa social é concedida em faixas de desconto e de consumo. Pós-medida, passa a ser expandida e simplificada.
Segundo os técnicos do governo, o custo da isenção extra para as contas de luz será de R$ 3,5 bilhões ao ano, mas o cálculo de especialistas aponta para um valor muito maior, de R$ 7 bilhões a R$ 10 bilhões.
Como não existe almoço grátis nem energia grátis, o pagamento caberá aos demais brasileiros, sejam os indivíduos que não se enquadram na proposta, sejam as indústrias que são notórias consumidoras de energia. Isso em um país que vem perdendo as suas indústrias.
Qual o risco e o custo desse populismo? Maior do que a previsão orçamentária. A elevação da isenção para um amplo número de consumidores pode representar um risco real de distorção no consumo e pressão futura sobre preços, especialmente em um setor como o elétrico.
A ciência econômica nos ensina que bens escassos fortemente subsidiados levam ao aumento de desperdício e criam uma demanda artificialmente inflada. Não precisamos ir muito longe para analisar o impacto negativo que as medidas podem ocasionar.
Na Argentina, após a crise de 2001, o governo congelou tarifas de energia elétrica e gás para aliviar a pressão sobre a população. A mesma intenção presenciada hoje no Brasil. Os governos seguintes mantiveram a isenção em vez de enfrentar o custo político, e, ao longo dos anos, o gasto público chegou a 5% do PIB argentino, reforçando o déficit fiscal e a inflação no país. A isenção de energia se estendeu e passou a englobar toda a população.
Sem o sinal de preço, o consumo subiu descontroladamente, e os desperdícios ocasionaram apagões e perda de confiabilidade no fornecimento, além de colapso nos investimentos. Para piorar, no fim, os maiores beneficiários do subsídio foram os consumidores urbanos de classe média e alta, que gastam mais energia.
A falta de senso crítico dos programas sociais que se acumulam no atual governo é preocupante e demonstra um Brasil que não tem plano algum para o futuro. Um subsídio mal calibrado para energia pode parecer socialmente justo no curto prazo, mas é destrutivo no longo.
Com o discurso de justiça social, estamos elevando o peso dos tributos para quitar a conta, sem perceber que é justamente esse volume agigantado do Estado brasileiro que torna nossa sociedade tão desigual.