João Satt, estrategista, CEO Grupo G5
Vivemos cercados por narrativas épicas: executivos que “superaram tudo”, líderes que “nunca desistem”, heróis que sempre vencem. Mas essa é apenas a versão maquiada de um mundo corporativo que pouco abre espaço para sentir, pausar e refletir. A realidade é dura, silenciosa - muitas vezes, devastadora.
Elder é um desses personagens invisíveis, um anti-herói dos negócios. Depois de meses repetindo frases automáticas - “está difícil”, “esse governo vai afundar o país”, “o pior ainda está por vir” — já não sabia se acreditava no que dizia. O contraste era cruel: enquanto concorrentes abriam filiais e entregavam resultado, sua empresa murchava. Fornecedores chegaram a jogar na cara da equipe: “o problema está aqui, não no governo”.
Ele já havia cortado tudo - não só gordura, mas também músculos. O olhar vago denunciava apatia. Nos bastidores, a sucessão era especulada. “Bet corredor” apostava se ele duraria até o final do ano. A cada dia, o desânimo crescia, e a pergunta pairava: por que ele não reagia?
Esse filme não pertence apenas a Elder. Ecoa na vida de muitos executivos. Existe um pouco de Elder em cada um de nós: sabemos que não temos todas as respostas, mas seguimos acreditando que resolver parte do problema bastará para que tudo se ajeite. Nesse hiato, a ansiedade nos devora. Sacrificamos saúde, tempo e relações em troca de resultados que, no fim, pouco significam diante da vida que escorre pelos nossos dedos. Esquecemos que nada compensa a ausência no jantar com os filhos, que não há bônus capaz de devolver uma infância perdida, nem dividendos que paguem uma saúde estilhaçada. Filhos saudáveis precisam de pais presentes - e isso exige que a vida seja resgatada antes que seja tarde.
Quando fazemos as perguntas mais simples, percebemos o peso da contradição: por que devo suportar tudo isso? O que eu ganho quando perco? São questões diretas, mas quase impossíveis de responder no ritmo alucinado que o mercado impõe. Talvez a armadilha esteja justamente aí - nunca se dar a oportunidade de parar para pensar.
Esta é uma pequena homenagem - que traz um alerta - aos CEOs e executivos esmagados por um sistema voraz, competitivo e desumano. Não adianta insistir em brigar com baionetas diante de exércitos com tecnologia de ponta. A inovação é implacável; a conveniência, soberana. Velhos modelos já não atraem. Não resistir ao novo, já é 50% da vitória. A confusão faz parte do cenário, estamos entre o que já não funciona e o que ainda não se consolidou.
Confuso, sim - mas rico em oportunidades. O exemplo dos carros elétricos é emblemático: criticados, questionados, mas crescendo exponencialmente a cada ano. O mundo já entendeu que combustíveis fósseis têm prazo de validade. O erro de Elder - e de tantos outros - foi tentar modernizar carruagens, quando o futuro exigia outro caminho. O medo é natural. A paralisia, fatal.
Não alimente o Elder dentro de você. O futuro não perdoa quem espera demais. Reinvente-se. Resgate sua saúde, sua vida, sua presença. Aprenda a conviver com dias cinzentos. Afinal, eles não passam de um piscar de olhos antes de um novo sol.