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Coluna

- Publicada em 17 de Abril de 2014 às 00:00

Perda de tempo equivocada


Jornal do Comércio
O que poderia ser um divertimento inteligente, até certo ponto, embora descompromissado, transforma-se em algo pedante e exibicionista, ao mesmo tempo em que se evidencia como ultrapassado e velho. Assim se pode sintetizar o sentimento diante da encenação de Bem-vindo, estranho, adaptação brasileira do texto original da dramaturga inglesa Angela Clerkin. Na verdade, trata-se de um exercício de recuperação do clima típico dos velhos filmes noir que, sobretudo o cinema francês, mas também o cinema norte-americano, desenvolveram nos anos 1950 e depois. É um enredo de suspense, em que se modifica constantemente a linha do enredo, de modo a dificultar para o espectador a antecipação do que, de fato, ocorrera e ocorrerá até o final do espetáculo.

O que poderia ser um divertimento inteligente, até certo ponto, embora descompromissado, transforma-se em algo pedante e exibicionista, ao mesmo tempo em que se evidencia como ultrapassado e velho. Assim se pode sintetizar o sentimento diante da encenação de Bem-vindo, estranho, adaptação brasileira do texto original da dramaturga inglesa Angela Clerkin. Na verdade, trata-se de um exercício de recuperação do clima típico dos velhos filmes noir que, sobretudo o cinema francês, mas também o cinema norte-americano, desenvolveram nos anos 1950 e depois. É um enredo de suspense, em que se modifica constantemente a linha do enredo, de modo a dificultar para o espectador a antecipação do que, de fato, ocorrera e ocorrerá até o final do espetáculo.

No caso de Clerkin, temos um jovem recém-saído da cadeia, acusado do assassinato de sua antiga namorada. Inocentado pelo júri, graças a um excelente trabalho de sua advogada. Ambos acabam constituindo um novo casal que, devido às dificuldades dele em arranjar emprego, vão morar provisoriamente na casa da jovem e de sua mãe. Aqui começa a trama a se desenvolver: a mulher é possessiva e profundamente preconceituosa, afetivamente instável. Volta-se contra o rapaz e começa a humilhá-lo, atirando-lhe na cara seu passado. O romance do casal periclita, e o desfecho é surpreendentemente até certo ponto, torcido e retorcido de maneira a levar o espectador a uma série de surpresas.

A interpretação de Regina Duarte é perfeita: quase se pode dizer que o texto teria sido escrito especialmente para ela. Mariana Loureiro e Kiko Bertholini vivem o casal amoroso, vítima da mulher: começam titubeantes e depois se afirmam, à medida em que seus próprios personagens começam a ocupar maior espaço na trama.

Até aqui, tudo bem. A produção é meticulosa: o cenário de J. C. Serroni, especialmente o banheiro da casa, que vai desempenhar papel crucial na finalização da trama; os figurinos de Iraci de Jesus e a iluminação de Aline Santini são cuidadosos; a iluminação, inclusive, é perfeitamente bem sincronizada com ações e gestos dos atores, de modo a cumprir literalmente com suas funções. Temos, pois, um espetáculo bem acabado, assinado, na direção, por Murilo Pasta, que se diz, no programa da peça, entusiasmado pelo texto de sua amiga inglesa, tanto que resolveu montá-lo no Brasil, como estreia mundial do mesmo. 

Da última vez em que li semelhante expressão, foi quando da montagem de Hell, no mesmo Teatro São Pedro, e que constituiu num equívoco absoluto. O mesmo ocorre aqui, mas por outros motivos: o texto é corriqueiro, mas bem desenvolvido e articulado, se levarmos em conta a tradição do gênero, a que não renova, mas apenas recria e segue. Ocorre, porém, que o grupo resolve se levar a sério, tendo inclusive proposto um debate ao final do espetáculo. Daí, claro, desaba: é que, para ser divertimento, é tolerável; para ser um estudo psicanalítico de caso, evidentemente, não se sustenta. O equívoco, pois, não está no espetáculo em si, mas, sim, na maneira pelo qual ele é promovido e visualizado. Daí, torna-se ambicioso e equivocado. Se levarmos em conta o momento em que este texto é escrito e, sobretudo, as tendências que a dramaturgia inglesa contemporânea apresenta, é evidente que se trata de um texto velho e ultrapassado. A desculpa para isso é, como disse, se sua ambição não fosse nada mais que diversional. Levar o trabalho, contudo, a sério, pretendendo estarmos diante de uma grande dramaturga etc., é piada. O espetáculo, quando muito, serve para passar o tempo, mas, ainda assim, é demasiadamente longo: mais de duas horas de duração, o que não se justifica.

Em síntese, Bem-vindo, estranho é frustrante, falho e equivocado. O quanto isso vem do texto original ou da tradução-adaptação brasileira não sei dizer, não conheço nenhum dos dois textos. Mas, por sua pretensão, nem como bom divertimento acabou acontecendo: minha sensação é de que perdi meu tempo no sábado à noite indo ao teatro.      

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