Na ocasião em que o Congresso Nacional e o Governo Lula discutem as propostas de segurança pública, a socióloga e professora Aspásia Camargo (foto), da UFRJ, fez para a coluna Repórter Brasília uma análise do colapso do Rio de Janeiro. Ela critica a herança militar, denuncia o populismo e a omissão das elites. Fala do crime infiltrado nas instituições, da ausência de autoridade e elogia a tradição cívica e patriótica do Rio Grande do Sul como contraponto ao caos político nacional.
Fusão sem voz do povo
“Foi uma intervenção espúria e ilegal, jamais contestada por nenhuma liderança civil”, afirma Aspásia Camargo, ao relembrar a fusão imposta entre a antiga Guanabara e o Estado do Rio de Janeiro. “Nunca houve plebiscito, nunca houve consulta. Foi o único caso na história do Brasil em que uma união de estados foi feita à força”. Ela classifica a medida como um erro histórico e político, de consequências devastadoras. “O processo foi conduzido por militares e aplaudido por civis omissos, um ato de autoritarismo disfarçado de modernização”.
O abandono federal
A professora denuncia que o Rio de Janeiro foi saqueado e abandonado pelo poder central. “A Petrobras arrancou 80% do petróleo do Rio e não fez nada pelo estado”, afirma
O Estado dominado pelo crime
“O crime organizado está infiltrado em tudo: na política, na Justiça, nas polícias. Tem juiz roubando e sendo premiado com aposentadoria. Tem soldado que ganha mil reais e acaba recebendo propina do tráfico. É real, e é fruto do abandono”. Aspásia Camargo lembra que o ex-governador Moreira Franco, dizia: “A responsabilidade de combater armas e drogas é um problema federal”.
Omissão federal
A professora da UFRJ lembra que o gaúcho José Mariano Beltrame, ex-secretário de Segurança, falou: “fomos lá (Brasília) duas vezes pedir para usar armas equivalentes às dos bandidos, e não deixaram”.
Os gaúchos e a decência
Em tom de contraste, Aspásia exalta o exemplo do Rio Grande do Sul. “Vocês são mais patriotas, mais organizados. O gaúcho tem uma tradição cívica que vem da reforma agrária da República Velha, que criou o mínimo de decência, de ética e de espírito público”. Ela diz que essa herança diferencia o estado dos demais. “O Rio Grande do Sul tem uma alma combativa e uma identidade forte. Aqui, perdemos isso. O Rio virou território do medo, onde o crime se infiltra até nas eleições”.
Justiça e impunidade
Aspásia é direta: “Tem que haver um plano robusto, e esse plano robusto tem que domesticar a justiça. A audiência de custódia é uma aberração”, afirma. Ela cita Goiás como exemplo: “O governador Ronaldo Caiado cortou visitas íntimas e mandou gravar conversas com advogados. O crime baixou mais de 50% por causa dessas duas medidas simples”.
Soberania e PEC da Segurança
Para Aspásia Camargo, “essa PEC da segurança é ridícula, muito frágil; um remendo de leis que já existem”. Ela defende autoridade e coesão nacional, e ironiza protocolos. “O federalismo está morto. O país tem que ir para o estaleiro: justiça, educação, economia, moral pública”.
Sem veto ideológico
Para Aspásia Camargo, “a saída exige patriotismo e ação conjugada sem veto ideológico; deixa o governador do PT fazer do jeito dele e o do PL do seu jeito, e vamos ver qual é o melhor. A mensagem final é de urgência política”.