Na Câmara dos Deputados, a oposição bolsonarista encontrou terreno fértil para empurrar a pauta da anistia. O presidente da casa, Hugo Motta (Republicanos-PB, à dir. na foto), tenta equilibrar-se entre as pressões da base governista e a ofensiva articulada por lideranças da direita, como Tarcísio de Freitas (Republicanos), Ciro Nogueira (PP), Arthur Lira (PP) e pastores influentes, como Silas Malafaia. A estratégia é clara: usar a mobilização de rua e a ameaça de crise política para abrir espaço para um texto que beneficie o ex-presidente. A resistência é forte.
Inconstitucionalidade
O líder do PT, Lindbergh Farias, já adiantou que uma lei dessa natureza seria questionada no Supremo por inconstitucionalidade, sobretudo porque a Constituição e decisões anteriores da corte já delimitaram que crimes como golpe de Estado não são passíveis de anistia.
O Senado como barreira
No Senado, o cenário é diferente. Davi Alcolumbre (União Brasil-AP, à esq. na foto) tem sido enfático: não colocará em pauta uma anistia que alcance Jair Bolsonaro (PL). Próximo de ministros do Supremo, em especial de Alexandre de Moraes, Alcolumbre defende um texto alternativo, limitado a reduzir penas de envolvidos de menor expressão nos atos de 8 de janeiro. Essa postura praticamente elimina as chances de Bolsonaro ser beneficiado, ainda que a Câmara aprove uma versão mais ampla.
O Supremo e o 'antídoto'
Ministros do Supremo Tribunal Federal já sinalizaram que existe um “antídoto” para essa tentativa: decisões consolidadas que impedem a aplicação de anistia a crimes contra a democracia. O precedente mais citado é do ministro Luiz Fux, segundo o qual não cabe anistia para crimes de golpe de Estado ou semelhantes, por serem inafiançáveis. Ou seja, mesmo que a pressão política produza frutos no Legislativo, o caminho judicial tende a barrar o benefício.
Mobilização de rua e risco de desgaste
A direita aposta nas manifestações, como a que será realizada em São Paulo, domingo, para inflar o discurso de perseguição e pressionar parlamentares. Mas essa estratégia traz também riscos: reforça a narrativa de que se trata de um movimento para proteger apenas Bolsonaro, e não uma política de pacificação nacional. Deputados da base, como a gaúcha Maria do Rosário (PT), classificam a proposta como uma “espúria tentativa de obstrução da Justiça”.
Chances reais
Especialistas e analistas políticos concordam que, “ainda que a Câmara seja o elo mais fraco e possa ceder à pressão, a proposta dificilmente prosperará no Senado”. Some-se a isso a resistência firme do STF e as brechas constitucionais quase inexistentes, e o quadro é de mínima viabilidade; no máximo, deve-se assistir a um jogo político que usará a palavra “anistia” como bandeira eleitoral em vez de um projeto concreto de lei.
Bandeira de mobilização
A anistia ampla, que inclua Jair Bolsonaro, parece mais uma bandeira de mobilização da direita do que uma proposta com chances reais de se transformar em lei. No Senado, não prospera, no Supremo, é inconstitucional; e no debate público, funciona apenas como combustível para manter acesa a chama da polarização.