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Opinião Econômica

Publicada em 08 de Setembro de 2025 às 00:25

Indicadores sugerem que atividade econômica está superaquecida

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Agências
Bráulio Borges
Bráulio Borges
Editorial recente da Folha apontou, logo no título, que uma "desaceleração do PIB é necessária neste momento". Muitas pessoas reagiram negativamente a essa opinião, como se o jornal estivesse "torcendo contra" o país e o governo atual. Mas uma análise "desapaixonada" do quadro macroeconômico de fato sugere que o crescimento atual brasileiro é desbalanceado, com vários sinais de superaquecimento.
Temos hoje uma taxa de desemprego perto dos 6% da força de trabalho, quando boa parte das estimativas indica que a taxa de equilíbrio para a economia brasileira está em algo entre 7% e 7,5%. O déficit das contas externas brasileiras se elevou consideravelmente desde meados do ano passado, passando de cerca de 1,5% do PIB para 3,5% nesse ínterim. Se até o final do ano passado esse déficit vinha sendo financiado, com alguma folga, pelos investimentos diretos no país, isso mudou em 2025, com o déficit externo correndo quase 0,5% do PIB acima dos investimentos estrangeiros no Brasil.
Com a economia superaquecida, emerge uma pressão sobre a inflação doméstica. Obviamente, a inflação não depende somente do desempenho da atividade local, também sendo afetada pela cotação cambial, pelos preços de commodities e por questões climáticas (2025 está sendo um ano ainda mais seco do que os anteriores), entre outros aspectos.
O que nos trouxe a esse quadro de superaquecimento? Desde 2021, o PIB brasileiro tem surpreendido as expectativas, crescendo mais do que os analistas esperavam. Isso significa dizer que o "mercado" estava torcendo contra? Não.
O principal fator por detrás disso foi a surpresa, também para cima, nos gastos públicos: a diferença entre a despesa primária do governo federal que era projetada pelo consenso dos analistas no final de 2020 para o período 2021-24 e a despesa efetivamente observada nesse período foi positiva em cerca de R$ 1,27 trilhão. E isso apenas para o governo federal - sabemos que o gasto nos governos regionais tem crescido muito mais do que a despesa federal.
Se até meados de 2024 um impulso fiscal positivo era defensável, por representar uma postura anticíclica -a economia brasileira vinha operando com excesso de ociosidade desde meados de 2015-, isso já não é mais verdade há pouco mais de um ano. Outro fator por detrás da surpresa para a atividade tem sido o mercado de crédito: as fintechs vêm aumentando a concorrência nesse mercado, reduzindo os custos e ampliando o acesso aos empréstimos.
Também é importante destacar que não foi somente uma aceleração da demanda que gerou essas surpresas favoráveis do PIB brasileiro: minhas estimativas apontam que o crescimento potencial brasileiro passou de cerca de 1% a.a. em 2020-22 para algo um pouco acima de 2% a.a. nos últimos anos. Isso, por sua vez, refletiu o amadurecimento de diversas reformas implementadas nos últimos anos, assim como uma retomada dos investimentos públicos no governo atual.
A reforma da tributação indireta, aprovada no final de 2023 - a reforma pró-eficiência mais importante aprovada em décadas no Brasil -, deverá dar um impulso adicional ao PIB potencial na segunda metade desta década.
Ainda assim, o saldo entre a forte expansão da demanda agregada e o aumento da capacidade de oferta nos levou a um quadro de algum superaquecimento desde o final do ano passado. O Banco Central tem atuado praticamente sozinho, e usando apenas um instrumento (Selic), para tentar tornar esse crescimento mais sustentável.
Uma maior coordenação entre as políticas fiscal, parafiscal e creditícia poderia exigir menos Selic do que os 15% a.a. atuais. Uma meta de inflação realista também ajudaria.
Doutorando em economia da FGV EESP, mestre em economia na FEA-USP, é diretor da LCA Consultores e pesquisador-associado do FGV Ibre
 

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