Rodrigo Zeidan, professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ
A grande dicotomia no ensino superior mundial é educação versus treinamento. Seja na Copenhagen Business School, seja em universidades públicas brasileiras, o pêndulo cada vez mais se move para usar faculdades como centros de treinamento. Isso advém da tensão entre retornos privados e sociais.
Educação gera retornos sociais quando maior escolaridade eleva o ser humano, impactando o mundo à sua volta, da saúde de sua família à taxa de inovação do País. O retorno privado é direto: quando o salário aumenta com mais tempo na escola. Sabemos que o retorno da educação no Brasil é elevado. Um indivíduo com diploma de graduação ganha quase três vezes mais, com 50% de chance menor de desemprego, do que um brasileiro sem diploma universitário.
A questão é que retornos privados e sociais são menos complementares à medida que indivíduos avançam no ciclo educacional. Qualquer política educacional que aumente um ano de escolaridade para uma criança de 5 anos tem efeitos muito maiores para a sociedade do que uma política equivalente para um adolescente de 13 anos, como mostrado por James Heckman e outros pesquisadores. No ensino superior, há muito mais separação entre retornos sociais e privados. Por exemplo, pesquisa gera mais retorno para todos, enquanto ensino instrumental, para o mercado, gera mais valor para o indivíduo.
Assim, sociedades contemporâneas enfrentam um dilema: como direcionar recursos escassos para um sistema no qual todos têm o incentivo para aumentar retornos privados, em vez de públicos?
Do lado da demanda, alunos querem mesmo saber quanto podem ganhar ao fazer o curso X da instituição Y.
Do lado da oferta, ensino é mais barato e fácil que pesquisa séria: nem todo professor universitário consegue fazer pesquisa, mas, em tese, ensino também é parte da carreira básica de professor pesquisador.
"Eu preciso de um 10 no curso, só aceito a maior nota para manter minha média na faculdade a maior possível." Essa foi a primeira frase que um aluno na Dinamarca me disse, depois de se apresentar. "Complete a frase", eu respondi. "Como assim, o que você quer dizer com isso?"
Terminei a conversa, e ele entendeu bem o ponto: "Você quer um 10. Mas também não quer fazer esforço. Foi isso de verdade o que você quis dizer. Que só aceitava uma nota 10, mas não estava muito a fim de trabalhar duro. Afinal, se estivesse disposto a trabalhar duro de verdade, não precisava anunciar para mim que precisava dessa nota. Era só estudar a fundo."
A Dinamarca deixou claro: quer mais é subsidiar o sistema para o mercado de trabalho, e os alunos respondem a isso, querendo notas altas para os melhores estágios. As mais recentes reformas de ensino fecharam cursos sem empregabilidade e deram recursos para os que colocam mais gente no mercado. No Brasil, não há nem plano para isso. Algumas universidades públicas formam milhares de advogados, de que não precisamos, enquanto outras se dedicam mais à pesquisa, ao mesmo tempo que professores reclamam que devem dar muitas aulas.
A democratização do ensino superior gerou um gigantesco benefício para a sociedade mundial. Mas nada vem de graça. Teremos universidades que também formam profissionais ou meros centros de treinamento? Seria bom decidirmos o quanto antes.