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Opinião Econômica

Publicada em 28 de Agosto de 2025 às 00:25

Experiências regionais e mobilidade de renda

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Agências
Cecilia Machado, economista-chefe do Banco BoCom BBM e professora do departamento de economia da PUC-Rio
Cecilia Machado, economista-chefe do Banco BoCom BBM e professora do departamento de economia da PUC-Rio

A mobilidade intergeracional de renda -se uma criança ganha mais ou menos que seus pais quando se torna adulta- é informação crucial em qualquer discussão sobre as oportunidades que as crianças pobres precisam ter para melhorar de vida. Quando a mobilidade é perfeita, qualquer criança, independentemente da renda dos pais, pode alcançar sucesso econômico.
Hoje já se sabe que a mobilidade perfeita não é alcançada nem em países desenvolvidos, mas números recentemente calculados para o Brasil sugerem que melhorar de vida aqui pode ser mais difícil. Um aumento de 10 pontos no percentil de distribuição da renda dos pais melhora a posição dos filhos em 5,5 pontos no percentil da distribuição de renda em idade adulta. Essa magnitude (variação de 0,55 na mobilidade entre as gerações) é maior que as estimativas obtidas para os EUA (0,34) e para demais países desenvolvidos (que variam de 0,19 a 0,30). No Brasil, a associação entre a renda dos pais e dos filhos é mais forte, e a mobilidade intergeracional, mais baixa.
Olhando para a mobilidade entre os mais pobres, só 2,5% das crianças nascidas entre os 20% de menor renda conseguem atingir os 20% de maior renda quando adultos. A inércia na renda entre as gerações é grande, seja pobre, seja rico: quase metade das crianças nascidas tanto entre os 20% mais pobres quanto entre os 20% mais ricos permanece nesse estrato quando adultas.
Mais impressionantes são as disparidades na mobilidade intergeracional que existem nas diferentes regiões do país. Essa variação indica que alguns lugares conseguem oferecer melhores chances para a ascensão econômica das crianças pobres. Ao contrário de que poderia ser esperado, São Paulo e Rio não oferecem essas condições. Há maior mobilidade no Sul e no Centro-Oeste, regiões que vêm experimento crescimento derivado da produção de grãos. Na lanterna, crianças nascidas no Nordeste e no Norte possuem as menores chances de ascensão econômica.
Os canais através dos quais a renda dos pais determina a renda dos filhos são inúmeros. Seja nos recursos financeiros, seja nas conexões pessoais, seja através do ambiente familiar, que molda comportamentos e objetivos, a renda dos pais sempre será um determinante importante do sucesso dos filhos. Entretanto, a associação entre a renda dos pais e a dos filhos também depende de diversas características dos locais onde as crianças moram, o que abre um enorme espaço para que políticas públicas possam atuar para nivelar o campo do jogo.
Nos EUA, áreas de menor segregação racial, com menor desigualdade de renda, com melhor ensino nas escolas primárias e com melhores indicadores de estabilidade familiar apresentam maior mobilidade intergeracional. No Brasil, a qualidade da educação aparece com a características regional de maior poder explicativo para a mobilidade.
Documentar as disparidades regionais na mobilidade intergeracional é um passo importantes para trazer mudanças. Tais estatísticas estão hoje disponíveis no Atlas de Mobilidade Social. A divulgação ajuda a mudar as percepções e as preferências da sociedade por políticas redistributivas. De forma mais importante, políticas públicas de incidência local, como as que buscam melhorar a qualidade da educação pública nas áreas mais pobres, podem oferecer chances mais equilibradas de ascensão econômica para as crianças que nascem em diferentes contextos familiares.

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