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Opinião Econômica

Publicada em 26 de Junho de 2025 às 19:22

Excelência ajuda bastante mesmo em um país desigual como Brasil

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Agências
Rodrigo Zeidan, professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ
Rodrigo Zeidan, professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ
 
Excelência.
A verdade excelência não é garantia de sucesso. Mas ajuda bastante. É possível ser bem-sucedido sem maestria em alguma área. Mas verdadeira excelência muitas vezes é recompensada. Desde que combinada com sorte.
Grande parte das oportunidades dependem de onde a pessoa nasceu. Altura, saúde, renda dos pais e vários outros parâmetros são aleatórios, do ponto de vista de um indivíduo. Mas a vontade (inclusive de aceitar o risco) de tentar ser excelente em algo não depende de outrem.
Dominar um ofício requer tremendo esforço, mas só esforço não garante nada. Por exemplo, entre as coisas mais difíceis que fiz não esteve somente perder 30 quilos, mas sim mantê-los longe pelos últimos quinze anos. Todo dia, quero comer mais do que faço. Tenho que dizer não para o meu cérebro centenas de vezes diariamente. Mas esse esforço monumental não cria excelência, pois se concentra em algo trivial: meu peso. E não há nada moralmente superior em saber se esforçar. Adoraria ter tido a opção de usar Ozempic. A energia de perder peso seria melhor usada em outra coisa.
Excelência também é mais que dedicação. Sempre fui dedicado ao basquete. Quase sem falta, estava nas quadras do Aterro do Flamengo às terças, quintas e domingos por mais de quinze anos. Era um dos primeiros a chegar e dos últimos a sair, exausto. Isso tudo não me levou a lugar algum a não ser me divertir (ou voltar frustrado para casa) e ferrar meus tornozelos e coluna. E eu sabia disso.
A verdadeira excelência requer agir na fronteira da nossa capacidade, com mecanismos de feedback sobre algo de ponta. É melhorar aos poucos, se afundando em processos repetitivos com um objetivo claro que, pior, não sabemos se é possível atingir. Excelência requer fazer todo o possível para se aperfeiçoar quando ninguém está olhando. Não há melhor exemplo que atletas de alta performance.
Fiquei na casa de um jogador profissional de vôlei do Paris St. Germain uma vez. Enquanto todos festejávamos Natal e Ano Novo de bucho cheio, ele jantava seu peito grelhado com salada. Todo dia. Sem falta.
Depois de conquistar o Australian Open em 2021, Novak Djokovic teve desejo de comer chocolate. Colocou um quadrado na boca e jogou o resto da barra fora. Quando atletas juvenis tentaram acompanhar Stephen Curry em um dos seus brutais treinos, colapsaram de exaustão no meio do caminho. Rebeca Andrade treina desde os cinco anos e em cada uma das milhares de vezes que se sentia cansada, dizia a si mesma: "para, respira, pensa e volta." Oscar Schmidt sempre se ressentiu do apelido "Mão Santa". O certo seria "Mão Treinada", pelas milhares de horas solitárias praticando seu ofício, segundo ele.
Isso vem de dentro. Excelência não tem como ser forçada. Disciplina militar é obediência. Doutorados são maratonas. Quem espera que o orientador o empurre não termina. E não é por falta de inteligência. Esta é condição necessária para entrar em um programa.
O que não falta é gente querendo atalho. Esforço é condição necessária, mas não suficiente. Nem todos têm condições de sonhar no Brasil desigual, mas se há uma lição a ser ensinada às próximas gerações é o valor da excelência. De se buscar dominar algo de verdade. Desde que não seja os rebotes nas peladas do Aterro.
 

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