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Opinião Econômica

Publicada em 01 de Dezembro de 2024 às 18:26

Pacote de gastos é razoável; taxação dos ricos deveria compor ajuste

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Bráulio Borges
Bráulio Borges
O governo federal finalmente anunciou o pacote de contenção de despesas, com impacto estimado de cerca de R$ 70 bilhões em 2025/26, chegando a R$ 327 bilhões entre 2025 e 2030. Boa parte dessa "economia" viria da limitação do ritmo de expansão de algumas despesas, não de "cortes". Ou seja: não se trata de reduzir gastos, e sim de definir uma alta menor do que aquela que aconteceria sob as regras vigentes.
Portanto, a trajetória do gasto primário total do governo federal será preservada, respeitando os limites do arcabouço fiscal (alta real de 70% do crescimento da receita recorrente do ano anterior, limitada a variações de 0,6% a 2,5%). As mudanças propostas servirão basicamente para evitar que a parcela das despesas que não são obrigatórias ("discricionárias") não sejam comprimidas para níveis críticos, que inviabilizem o funcionamento da máquina pública federal.
Como boa parte das medidas demandará mudanças legislativas que serão analisadas pelo Congresso, é pouco provável que sejam aprovadas ainda em 2024 reflexo da demora em anunciar esse pacote, que poderia ter sido revelado há um mês. Com efeito, o cumprimento das metas fiscais de 2025 exigirá que, já no começo do ano que vem, o governo federal defina um bloqueio e contingenciamento expressivo das despesas orçadas, de R$ 30 bilhões a R$ 35 bilhões evento que servirá como um teste do compromisso com a sustentabilidade fiscal.
O pacote de medidas caminha na direção correta, ao propor mudanças nas regras de diversas despesas obrigatórias que vinham crescendo em ritmo insustentável. Portanto, não se trata apenas de um "pente-fino". Não obstante, a magnitude ainda parece ser insuficiente.
É o caso da nova regra de correção do salário-mínimo, que, mesmo com um reajuste menor do que aquele implicado pela regra em vigor em 2023 e 2024, ainda terá como efeito gerar um crescimento real da despesa previdenciária superior ao teto do arcabouço fiscal ( 2,5%), já que o crescimento projetado do número de aposentados/pensionistas é de cerca de 2% anuais.
Também chamou a atenção no pacote a ausência de certas medidas, como uma mudança nas regras do seguro-desemprego: com pouco mais de 7 milhões de desempregados hoje, o gasto com essa política pública (quase R$ 50 bilhões em 2024) será igual ao de 2019, quando o contingente de desempregados beirava os 13 milhões.
No geral, seria um pacote razoável, que tenderia a ser bem recebido, ao reduzir os riscos de descumprimento das metas fiscais, ao menos nos próximos dois a três anos. Contudo, ele foi totalmente ofuscado pela decisão de anunciá-lo em conjunto com a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, com impacto de reduzir as receitas em R$ 45 bilhões.
Ainda que o governo tenha sugerido que essa medida será fiscalmente neutra, sendo integralmente financiada por uma correção da regressividade do IRPF brasileiro (os super-ricos estão sujeitos a alíquotas efetivas muito baixas), ela sinalizou baixo compromisso da política econômica com a sustentabilidade fiscal, já que esse aumento de receita deveria ser direcionado para elevar os resultados primários (ainda bem abaixo dos níveis necessários para estabilizar a dívida/PIB, 1% a 1,5% do PIB), não para conceder mais desonerações (que cresceram muito na última década).
Mestre em teoria econômica pela FEA-USP, é economista-sênior da LCA Consultores e pesquisador-associado do FGV IBRE

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