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Opinião Econômica

- Publicada em 07 de Maio de 2024 às 19:38

Salário mínimo não é um bom indexador

Bernardo Guimarães, Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP
Bernardo Guimarães, Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP
Na semana passada, Fernando Haddad recomendou, em rede social, a leitura de um artigo de Bráulio Borges sobre a dinâmica das contas públicas. O ministro raramente recomenda artigos técnicos para leitura no X (ex-Twitter) e, político experiente que é, não escolheu esse por acaso.
A mensagem do ministro causou furdúncio nas redes porque o artigo defendia a desvinculação do piso previdenciário (e de outros benefícios assistenciais) do salário mínimo nacional -uma medida defendida por muitos economistas, mas evitada por políticos e impopular dentro do PT.
Vamos então falar sobre o salário mínimo e sobre seu uso como indexador.
Em primeiro lugar, como o salário mínimo afeta o mercado de trabalho? A imposição de um salário mínimo tem, potencialmente, dois efeitos: 1) aumentar o salário de quem trabalha no setor formal e receberia menos que o salário mínimo; 2) eliminar empregos no setor formal que não seriam suficientemente produtivos para valer o piso salarial.
A importância de cada um desses efeitos depende do valor do salário mínimo e é uma questão empírica.
Encontrar efeitos do salário mínimo no desemprego é tarefa complicada, porque alterações no piso salarial não acontecem por acaso e afetam a economia inteira. Como nos testes de vacinas, gostaríamos de comparar efeitos no grupo tratado com o que aconteceu no grupo de controle. No caso do salário mínimo isso não é possível.
Nos últimos 30 anos, economistas desenvolveram maneiras de estimar esses efeitos.
Tudo começou com o artigo icônico de David Card e Alan Krueger publicado em 1994 que contribuiria para o Prêmio Nobel a David Card em 2021. Usando criatividade e estatística, eles mostraram que o efeito do salário mínimo no nível de emprego, se existia, era pequeno. Boa parte da pesquisa subsequente confirmou os resultados de Card e Krueger.
Mas esses resultados valem para o Brasil?
Um influente artigo de Niklas Engbom e Christian Moser, publicado em 2022, encontrou que aumentos do salário mínimo no Brasil desde 1996 tiveram efeito substancial na redução da desigualdade salarial e pouco efeito no nível de emprego.
Há, porém, resultados na direção contrária. Por exemplo, trabalhos de Hugo Jales concluem que aumentos no salário mínimo levam muitos trabalhadores para a informalidade no Brasil, e um artigo recente de Rafael Parente acha que, devido à migração para o setor informal, aumentos no piso podem gerar um aumento da desigualdade.
Em suma, a maior parte da literatura acha que aumentos no salário mínimo têm efeito pequeno no emprego e, por isso, economistas se tornaram mais favoráveis a pisos salariais nos últimos 30 anos. Ainda assim, há questões sobre os efeitos na informalidade do mercado de trabalho.
O salário mínimo ideal buscaria elevar a renda de quem ganha o piso sem reduzir muito o emprego no setor formal.
Faz sentido que esse piso salarial cresça com os salários da economia. Afinal, os efeitos do salário mínimo sobre emprego e informalidade dependem de quanto as empresas estão dispostas a pagar aos funcionários. O crescimento da média salarial dá uma ideia desse valor.
Uma maneira simples de implementar algo assim é fazer o valor real do salário mínimo crescer com nosso PIB per capita. Hoje, a regra liga o mínimo ao PIB.
Contudo, é justamente o crescimento do salário mínimo em termos reais que faz com que ele não seja um bom indexador. Quando o objetivo é manter o valor real de benefícios ou punições, usamos índices de inflação.
Será que é isso que o ministro Haddad tem em mente?