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Opinião Econômica

- Publicada em 15 de Abril de 2024 às 19:57

O mito das empresas coitadinhas

Rodrigo Zeidan, professor da New York University Shangai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ
Rodrigo Zeidan, professor da New York University Shangai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ
O dano que Sergio Moro, Deltan Dallagnol e outros causaram ao País é gigantesco. O combate à corrupção é uma das principais condições para que o País saia da armadilha da renda média, e a Lava Jato foi uma oportunidade única de reformar o Estado brasileiro. Parece claro que o interesse dos principais participantes sempre foi ideológico; uma pena, pois o Brasil carece de pessoas preocupadas somente com o bem público.
Ainda assim, parece que vamos jogar fora os acertos da Lava Jato junto com os erros. Empresas com planilhas detalhadas de pagamentos de corrupção agora querem renegociar os pagamentos pelos seus delitos. Isso nada mais é do que uma nova rodada de campeãs nacionais. Só que agora os subsídios pagos diretamente pelo Estado viram indiretos: receitas que o Estado não captura para deixar as coitadinhas das empresas funcionarem como antes.
Mas o vício de origem não é da Operação Lava Jato, mas de como tratamos delitos empresariais. Por um lado, faz todo o sentido.
O instituto da recuperação judicial é uma forma excelente para fazer com que empresas viáveis a longo prazo sobrevivam a crises de curto prazo. Mas a ideia de que a Justiça deva sempre se preocupar com a sobrevivência das empresas está errada.
Os projetos de uma empresa, especialmente de grandes empresas, não desaparecem quando ela vai à falência. Outras organizações compram ativos e projetos das que vão à falência. Destruição criativa é a única forma de capitalismo que tem chance de criar valor para a sociedade.
Me lembro de um colega justificando os empréstimos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para a Aracruz, à beira da falência em 2008 por especulação com derivativos: "Mas devemos deixar uma empresa de milhares de funcionários quebrar?". Sim, claro que sim.
A Aracruz tinha gigantesco poder de mercado. Seus ativos não seriam perdidos. Iriam para a mão de outras empresas mais bem geridas. Pode ser que o empréstimo fizesse sentido à época, mas não pelo argumento de que uma grande empresa deva ser salva de qualquer maneira. Os projetos de uma Odebrecht não somem se ela for à falência; a maioria deles, se não todos, é absorvida por outras empresas.
A dificuldade da Justiça é a mesma dificuldade de muitos, que não conseguem separar o raciocínio estático do dinâmico. O que importa para a sociedade é o resultado de diversos processos econômicos, não a sobrevivência de uma empresa em particular. O resultado é que há a possibilidade de um capitalismo de compadres, no qual algumas empresas conseguem sobreviver a qualquer custo, enquanto outras enfrentam a dura pena da lei.
Não é para sair fechando empresas, mas é para tratá-las de forma imparcial. Cometeu delitos? Pague por isso. Se o resultado for a falência da empresa pois o delito é gigantesco, que seja. Qualquer coisa fora disso gera o que os economistas chamam de risco moral; se os gestores sabem que a empresa vai sobreviver a qualquer tipo de ação ou que qualquer punição na Justiça pode ser revertida, a probabilidade de cometer delitos aumenta.
Sergio Moro não deveria mesmo ser cassado. Deve simplesmente ser esquecido e jogado na sarjeta da história. Uma pessoa pequena, que só ensinou uma coisa aos brasileiros: como é ridículo combinar camisas pretas com ternos.
Mas os danos de uma reversão das multas aplicadas às principais empresas da Lava Jato jogariam o Brasil institucionalmente décadas no passado.
Cinco anos em 50 parece a sina da economia brasileira.