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Opinião Econômica

Opinião Econômica

- Publicada em 01 de Junho de 2023 às 19:54

PIB para cima e inflação para baixo

Economista-chefe de Brasil do banco Credit Suisse. É mestre em economia pela PUC-Rio.
Economista-chefe de Brasil do banco Credit Suisse. É mestre em economia pela PUC-Rio.
Temos visto uma parte significativa dos analistas revisando suas projeções para o ano de 2023: crescimento do PIB para cima e inflação para baixo. A mediana do Focus para o PIB é de 1,2% (vindo de 0,9% no começo de abril), mas vários bancos e gestoras já preveem um aumento perto de 1,5%1,7%, com alguns chegando a quase 2%.
Para o IPCA, a mediana foi de 6,0% também no começo de abril para 5,7% e deve continuar recuando, tendo em vista as revisões já anunciadas depois da última divulgação do IPCA-15. Já de 2024 em diante, não vemos, por ora, alterações relevantes, indicando que não há um consenso claro sobre a sustentabilidade desse cenário positivo. Em geral, exceto nos casos de ganhos de produtividade, um crescimento maior é acompanhado de uma inflação mais resiliente. Quando as revisões estão na direção oposta, é provável que estejam relacionadas a choques exógenos, não ao ciclo econômico.
Os fatores que puxaram o PIB do primeiro trimestre e estão também impactando o segundo trimestre são a forte safra agrícola, as elevadas transferências sociais (cuja despesa sobe mais de 70% em relação ao ano passado), o aumento real do salário mínimo (depois de três anos recompondo apenas a inflação) e o aumento dos servidores nos estados e municípios (depois de quase dois anos congelados). Destes, a safra é um choque exógeno, mas a política fiscal faz parte do ciclo. O atual impulso fiscal é extremamente positivo (na contramão da política monetária) e assim permanecerá no ano que vem, pois o novo arcabouço levará a um crescimento do gasto real próximo a 2,5%. Já a excelente performance do setor agrícola deverá perder força no segundo semestre do ano e é uma incógnita para 2024.
A inflação vem apresentando um comportamento melhor do que o inicialmente esperado, principalmente devido aos efeitos da excelente safra agrícola e à queda dos preços de commodities (agrícolas, metálicas e energéticas) no mercado internacional. Depois de dois anos de choques altistas, estamos finalmente em um momento baixista, que ninguém sabe exatamente qual será a extensão (dependerá das condições climáticas, do crescimento chinês e do ritmo da transição energética). A apreciação do câmbio também ajuda e pode ter efeito mais deflacionário se for mantida por um período mais prolongado de tempo (decorrente de um dólar mais desvalorizado globalmente). Por outro lado, as medidas de inflação subjacentes (que procuram captar a tendência dos preços desconsiderando distúrbios de choques temporários) seguem elevadas, rodando em ritmo próximo a 6%. A desinflação desse grupo depende obviamente de uma redução do ritmo do crescimento do PIB.
Embora as causas em comum do cenário mais positivo tanto para o PIB quanto para a inflação estejam basicamente relacionadas a choques, sua extensão pode trazer impactos relevantes para o cenário macroeconômico de médio prazo. De um lado, os mais otimistas acreditam que, mesmo com uma atividade econômica mais pujante, a menor inflação esperada até o fim deste ano afetará as expectativas mais longas. Isso, em conjunto com a aprovação do novo arcabouço fiscal e a provável manutenção da meta de inflação, permitirá ao Banco Central começar o ciclo de afrouxamento monetário, dando assim continuidade à melhor performance da atividade econômica nos próximos meses.
Para esse cenário ser viável, é necessário acreditar que grande parte da alta de inflação no ano passado estava relacionada a choques de oferta (principalmente alimentos e preços industriais) que estão rapidamente se esvaindo.
De outro lado, os mais céticos acreditam que a resiliência da economia em 2023 resultará em uma menor capacidade ociosa na economia (ou, na verdade, nenhuma, pois o atual nível de demanda é maior do que a capacidade produtiva do país), que, acompanhada do forte estímulo fiscal em 2024, não permitirá uma queda considerável nem dos núcleos de inflação nem das expectativas para os anos seguintes. O fato de a economia não ter desacelerado da forma esperada com os juros em 13,75% está relacionado ao aumento dos juros de equilíbrio (o chamado "juro neutro", cuja influência da política fiscal é grande). Neste caso, mesmo que o ciclo de redução dos juros ocorra em breve, ele não deverá ser arrojado. Se os juros forem para patamares verdadeiramente estimulativos (abaixo do chamado "nível neutro"), trará pressões altistas para a inflação.
A "prova do pudim" do cenário positivo de menor inflação e maior crescimento relativo ao esperado há um mês não será imediata. A resiliência da atividade econômica ao aperto monetário, o debate sobre o quanto os núcleos de inflação estão mais resistentes e a permanência do expansionismo fiscal pós-pandemia têm se revelado um fenômeno global. Será, inclusive, interessante observar se o Fed pausará o ciclo de alta dos juros na próxima reunião, cujas implicações não são desprezíveis para nossa economia.