A coleção de uma das calçadistas gaúchas que acaba de chegar às lojas da marca foi pensada desde o começo usando recursos de Inteligência Artificial (IA). Neste caso, foram tênis, chinelos e scarpin de uma collab do desenho animado dos Smurfs. "A IA criou imagens baseadas no prompt (questões e referências que a marca indicou). A gente foi pedindo variações até que gostássemos do resultado. Muito simples", resume a vice-presidente e diretora de produtos da Piccadilly, Ana Carolina Grings. A tecnologia está mudando a configuração do trabalho e de como chegar no consumidor, no ponto físico ou online. A coluna traz aqui percepções de diferentes fontes que têm ligação com as ações entre marcas, entregas e pessoas que consomem. Fábio Bernardi, co-CEO da agência HOC, que atende marcas gigantes como Zaffari e Panvel, Rony Meisler, fundador e ex-CEO da Reserva, comprada pela agora Azzas 2154 (Arezzo e Soma), e Arthur Igreja, palestrante sobre inovação.
Ana Carolina conta que a primeira vez que a calçadista usou IA foi para obter o desenho do scarpin bico fino e salto alto da Barbie, em 2023. "Pedimos para a IA: 'Crie um sapato da Barbie. Ela gerou, ficamos enlouquecidas e falamos: 'Vamos fazer exatamente como a Inteligência Artificial propôs'. Resultado: o modelo foi super vendido", diz a vice-presidente. O segredo, cita Ana, são os prompts. "Precisam estar corretos. Usamos também na coleção dos 70 anos", acrescenta a vice-presidente. "A tecnologia ajuda a trazer agilidade".
Igreja reforça a percepção da calçadista: "Não dá para deixar o tempo correr". Bernardi acredita que a "tecnologia mudará os negócios, mas a emoção é uma capacidade humana". Meisler avalia que o recurso assumirá ações repetitivas e "vai deixar as pessoas mais livres para pensar".
"A IA mudou a maneira de pensar e fazer e a velocidade das entregas, mas mais importante: a tecnologia vai mudar o modelo dos negócios porque vamos precisar encontrar maneiras de especificação diferentes, a partir da velocidade com que a IA vai nos entregar e da capacidade de fazermos com mais recursos, mas com menos pessoas.
Vamos cobrar cada vez menos dos clientes porque eles sabem que vamos fazer mais rápido e com menos gente, mas teremos mais valor na entrega e mais relevância para eles, que perceberão o valor e retribuirão.
A criatividade, na nossa visão na HOC, é resolver problemas, é juntar o A com o B para gerar o Z, é a soma de repertório, curiosidade, intuição. Isso a IA não vai entregar. Outra questão é a emoção, que muda conforme as pessoas sentem. Para emocionalizar, precisamos ter experiência e sermos tocados por outras pessoas. A máquina vai nos entregar informação, conhecimento e dados. mas não a capacidade de modificar a emoção. Vamos voltar a escalar o humano e, assim, conseguiremos ser melhores para as máquinas, como elas serão para nós."
"A IA é a mesma discussão de 20 ou 30 anos atrás quando via o impacto da internet e depois do mobile (smartphones) no nosso negócio. As transformações tecnológicas não voltam e só progridem e sabemos disso. A IA vai mudar por completo o trabalho e os trabalhadores. A cabeça que estamos tendo no nosso novo negócio e que acho que todos deveriam ter é: pegar os processos repetitivos que fazem com que as pessoas gastem um tempo infindável e pouco intelectual e conseguir priorizar o que deve ser automatizado por IA. O que percebo é a maioria das pessoas já está fazendo isso nos seus ambientes, só que elas não contam talvez por um medo natural de achar que o trabalho será menos valorizado. Acho que isso é uma besteira, pois tem de haver essa quebra de paradigma. Uma vez que elas estão mais livres para pensar elas vão ser mais potentes. A IA tem de ser vista dentro das organizações como nossos super corpos. Como viramos um super-homem ou uma super-mulher no ambiente de trabalho. Podemos usar a IA para que a nossa massa cinzenta valha mais do que o nosso muque.
"(IA) É uma ameaça quando não usamos como aliada. As pessoas têm uma certa fobia, um certo temor, mas depois que começam a se acostumar e se aclimatar percebem os benefícios. As pessoas estão se acostumando rapidamente (com a IA) e quem está mudando mais rápido é o consumidor. As varejistas precisam endereçar os anseios crescentes dos clientes, que têm mais pressa, querem as coisas com muito mais agilidade, e precisam entender porque nem toda a tecnologia lançada faz sentido. Os lojistas precisam fazer essa peneira e ter sabedoria. Esse é um grande desafio. O pequeno empresário é o que mais se beneficia com essa nova tecnologia. Faço um paralelo com o que aconteceu com o software. Antigamente, só empresa gigante conseguia usar programas de gestão ERP, devido ao custo milionário. Nos últimos anos, os softwares passaram a ser licenças por usuários. Com isso, empresa pequena paga pouquinho, e a gigante paga bastante. No passado, só a grande podia ter um outdoor ou horário na TV. Agora, a grande tem um perfil no TikTok e um no Instagram, igualzinho ao pequeno varejista da esquina. Porque ele precisa fazer muita coisa ao mesmo tempo. É o financeiro, o marketing, cuida de compras e vendas. O tempo é mais escasso sem equipe para tudo. Agora ele conta com uma equipe de IAs para facilitar a vida dele.