A fronteira gaúcha com a Argentina é uma antes e outra depois do desembarque dos free shops do lado brasileiro. Esse tipo de comércio que não paga imposto - federais e ICMS estadual (no fluxo e venda de mercadorias) - e se consagra com oferta de produtos importados de grife - e muito eletroeletrônico do exterior -, virou um fenômeno de atração de clientes (estrangeiros e nacionais), multiplicação de receita e de lojas com impactos no varejo local.
Este ano ainda serão abertos mais cinco pontos. Além disso, as redes se mobilizam para dobrar o valor da cota para compras de US$ 500,00 para US$ 1 mil, igualando-se aos "irmãos" free shops dos aeroportos com voos internacionais.
"O aumento da cota abre espaço para compra de produtos de maior valor agregado. Vai ser mais consumo. Como é sem imposto, quando começa a cobrar (acima de US$ 500,00), reduz a atratividade", observa Gustavo Magalhães Fagundes, CEO da Avolta Brasil, do conglomerado suíço Avolta, maior operadora de varejo em aeroportos no mundo e dona da Dufry, Dufry Shopping e Hudson, presentes em 19 aeroportos brasileiros.
A unidade da Dufry foi a primeira a abrir em Uruguaiana, em 2019, e na faixa de Norte a Sul do Brasil onde a atividade foi regulamentada, após aprovação de lei federal, em 2016. Depois, vieram mais e mais marcas varejistas que nasceram com a nova zona franca.
Redes instaladas em Uruguaiana ampliam mix e projeta mais lojas em 2025
BRASIL FREE SHOP/DIVULGAÇÃO/JC
Hoje são 34 pontos, sendo 26 no Rio Grande do Sul, seis no Paraná, um no Mato Grosso do Sul e um em Santa Catarina. Fagundes informa que a rede vai ter loja em Foz do Iguaçu este ano e não descarta outras no RS. "O negócio se mostra muito robusto. Tem possibilidade sim", sinaliza o executivo.
Dados da Receita Federal mostram que o segmento gaúcho teve alta de 46% no faturamento em 2024 frente a 2023, somando US$ 60,8 milhões (cerca de R$ 335 milhões). Somente em Uruguaiana, rainha dos free shops no Brasil, o avanço foi de 45% entre os dois anos, respondendo por 61,5% do fluxo estadual em dólares no segmento (US$ 37,4 milhões na cidade).
No Brasil, com 14 localidades operando com lojas entre as 32 cidades irmãs habilitadas, a receita somou US$ 89,1 milhões (quase R$ 500 milhões), aumento de 35% no ano passado.
ARTE/JC
"Crescemos muito nesses seis primeiros anos das lojas francas no País", resume o deputado estadual que atuou na formatação da legislação federal para permitir a atividade, Frederico Antunes (PP), frisando que estudo na Assembleia Legislativa começou na deixada de 2010 e deu argumentos em defesa dos free shops. Os focos eram evitar êxodo, principalmente de jovens, e diversificar a economia, além do agro.
"Um vendedor de loja franca recebe, em média, quase o dobro do de loja tradicional", compara o deputado. Como se explica isso?
"As pessoas são expostas a treinamento e outros idiomas. Há um papel de desenvolvimento social muito importante", reforça o CEO da Avolta/Dufry. Para a campanha de aumento da cota, Antunes diz que o governo estadual fará estudo mostrando os impactos, para servir de subsídio para análise federal.
Redes de free shops expandem e esperam aumento da cota
Brasil Free Shop, maior do segmento no País, levou primeira loja franca para Itaqui
BRASIL FREE SHOP/DIVULGAÇÃO/JC
Redes de free shops programam mais lojas, serão cinco até dezembro, quatro em Uruguaiana e uma em Santana do Livramento. "Tivemos convite para abrir em outras cidades, mas queremos ficar em Uruguaiana. Vamos abrir no aeroporto", conta Paulo Pavin, CEO do Bah Free Shop, que estreou em 2020 com primeira loja, a segunda veio em 2024 e agora vem a terceira, que será no Aeroporto de Uruguaiana, a primeira do segmento no terminal.
São 130 funcionários nas duas megalojas, com mais de mil metros quadrados - uma com quase 2 mil metros. Uma delas ganhará mais 400 metros quadrados. "Mais de 70% do quadro são mulheres, 50% jovens em primeiro emprego. Mais: muitas pessoas daqui que moram em Porto Alegre voltam para comprar nos free shops", comemora Pavin.
A Brasil Free Shop, que integra o grupo supermercadista Baklizi, estreou em Itaqui, a mais de 100 quilômetros, que teve a primeira loja franca. Até o fim do ano, a rede, com sete unidades (três em Uruguaiana e outras em Barra do Quaraí, Quaraí e São Borja), expande para Santana do Livramento.
O diretor-geral da marca, Juma Laban, diz que o grupo deve abrir mais três, entre São Borja e Livramento. São 400 funcionários. "Somos o maior do Brasil em lojas e faturamento. A grande vantagem é comprar em dólar e parcelar no cartão", cita Laban.
A megaloja da Bah Free Shop tem mix com 60 mil itens e até cafeteria
PATRICIA COMUNELLO/ESPECIAL/JC
"O comércio e turismo de Uruguaiana mudaram extremamente com os free shops", atesta o presidente do Conselho Municipal de Turismo e diretor financeiro da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) da cidade, Jorge Prestes Lopes. "As vendas para consumidores de fora de Uruguaiana, estrangeiros ou brasileiros, representam 68% das compras", registra Lopes. O fluxo de hermanos, crescente desde o fim de 2024, alavancou mais os negócios.
De janeiro a abril, 1,2 milhão de pessoas entraram no Estado pela fronteira, metade por Uruguaiana e mais de 90% deles argentinos. O câmbio valorizado alimenta o caixa nas lojas. "Esses consumidores também compram do comércio tradicional, que se qualificou. Em vez de concorrentes, os free shops impulsionam o varejo local", resume o dirigente lojista.