Um dos
maiores bancos do Brasil e dos mais antigos em operação, o
Bradesco vive temporada de transformações e das grandes. O vice-presidente executivo da instituição, o pernambucano e funcionário de carreira José Ramos Rocha Neto, esmiuçou, em conversa com a
coluna Minuto Varejo,
em meio à Expointer, que terminou neste domingo (1º) em Esteio, as
alavancas dos resultados recentes, o que ainda está por vir e citou dois segredos:
lições aprendidas com as fintechs (rivais dos bancões) e
segmentação.
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Os motores, associados a mais conhecimento de setores e uso de dados para instrumentalizar equipes, estão por trás de dois trimestres consecutivos com alta no lucro, revertendo sequência de balanços ruins. O segundo trimestre registrou lucro líquido de R$ 4,7 bilhões, alta de 12% frente ao primeiro, que já tinha sido positivo, interrompendo períodos no negativo.
Rocha Neto detalha o que está em curso e envolve 82,4 mil pontos de atendimento, entre eles 2,5 mil agências (eram 2,7 mil em junho de 2023), sendo 126 no Rio Grande do Sul, canais digitais e 84,7 mil funcionários.
"A percepção é linda", define ele, com a espontaneidade típica de um pernambucano.
Detalhe: o presidente do banco, Marcelo Noronha, no cargo desde fim de 2023 e um dos protagonistas da fase recente, também é nativo da terra de Ariano Suassuna, Gilberto Freyre, Luiz Gonzaga e Clarice Lispector, para citar apenas alguns nomes bem conhecidos.
Minuto Varejo - O que vem mudando desde o fim de 2023?
José Ramos Rocha Neto -Estamos em uma transformação muito grande. Precisamos olhar o futuro do banco, pensar como vai ser o nosso negócio em cinco, dez anos. Fizemos diagnóstico, identificamos alguns pontos e definimos dez grandes pilares. O processo envolve dois grandes grupos: o do dia a dia, chamado de Run (do inglês, correr), que toca o banco, e o Change (do inglês, mudar), que é composto por executivos importantes, profissionais e diretores para fazer as mudanças, que já começam a aparecer. O primeiro trimestre foi super positivo, com desempenho muito melhor do que o do final do ano passado. O segundo trimestre repetiu o avanço, demonstrando uma rota de crescimento, que refletiu na valorização das ações do banco (na bolsa). Isso demonstra que o mercado, de fato, está entendendo o movimento que o Bradesco está fazendo e está apostando nele.
MV - Qual é o peso do agro?
Rocha Neto - O agronegócio é um dos setores de maior destaque do Brasil. Depois do Banco do Brasil, com 50% dos repasses, somos o maior agente, com mais de R$ 120 bilhões em uma carteira total de crédito de R$ 900 milhões. Atuar com o agro está no DNA do banco. Para estarmos mais próximos do agricultor, atuamos de duas maneiras. A primeira por meio de 15 plataformas no Brasil para suporte das agências onde o agronegócio está. A outra frente é o canal digital. Montamos, em 2023, o E-Agro, um marketplace com venda de maquinário, insumos e também de crédito. Fomos os primeiros a ter Cédula de Produto Rural (CPR) financeira online. O agricultor acessa o E-agro, escolhe o produto, fecha a compra e diz como quer pagar, avaliamos e aprovamos o crédito. São mais de R$ 500 milhões de CPRs contratadas pelo E-agro. A terceira onda será a especialização no atacado, com uma diretoria dedicada e agrupando os clientes, para capacitá-los e especializá-los para buscar produtos mais sofisticados.
MV - Como foi possível ter resultados positivos tão rápidos?
Rocha Neto - Um dos pilares foi a vertical de crédito, transformada em unidade de negócio. Revisitamos vários modelos, trouxemos mais analytics, engenheiros de dados e especialistas focados em modelagem. Conseguimos mais agilidade na concessão pela rede de agências. A percepção é linda. Nunca viajei tanto na minha vida de Norte a Sul do Brasil. As equipes da rede percebem essa mudança e preocupação que a matriz está tendo nos processos ao estarem melhor aparelhadas e instrumentadas. Isso vai melhorar a jornada do cliente.
MV - O que está sendo feito?
Rocha Neto - Outra vertical são os canais digitais. Precisamos cada vez mais de usabilidade de serviços financeiros. As agências estão com muito menos movimento. Também passamos por um processo de remodelação de jornada, a experiência do cliente melhora se ele achar facilmente as coisas de que precisa. Isso faz com que as pessoas também fiquem mais fiéis ao banco. A tecnologia derruba barreiras de entrada e vários novos entrantes chegaram das fintechs. Em pesquisas, clientes falam que foi bom ter investimento em uma plataforma e crédito em outra, mas que sentem falta de ter tudo junto. Estamos no rebundling, que é o reagrumento de serviços. É uma grande oportunidade para reformularmos processos e jornadas para conseguirmos, com a facilidade que as fintechs trouxeram, que o cliente tenha cartão, crédito imobiliário e para veículo e etc, num só lugar.
MV - Baixa ou alta renda?
Rocha Neto - Tínhamos muito foco na baixa renda, que sofreu mais no pós-pandemia, refletindo na nossa inadimplência (que cresceu). Identificamos oportunidade de atuar ainda mais forte com a alta renda. No private bank, crescemos a nossa fatia de 17% para 22%. Estamos disputando a liderança nesse setor. Vamos lançar um novo segmento para clientes wealth (alta renda) em novembro, com carteira entre R$ 1 milhão e R$ 10 milhões. Acima disso, já está no Prime 2.
MV - E qual é a estratégia para pequenos negócios?
Rocha Neto - Somos líderes em crédito para small business (pequena e média empresa). Estudos apontam que é o segmento que mais vai crescer nos próximos cinco anos. Diante dessa oportunidade, decidimos reformular. Pegamos todas as empresas de varejo que faturam de R$ 3 milhões a R$ 50 milhões, fizemos um corte e plataformamos essas clientes, que saíram do atendimento na agência. Criamos em abril 122 plataformas no Brasil, que vão chegar a 150 até dezembro. Esses clientes estão tendo um atendimento personalizado. Não fica misturado com o atendimento da rede e isso está dando um ótimo resultado. O volume de negócios tem aumentado em 20%, 30%, 40%. Tudo porque temos um atendimento mais personalizado.
MV - Como é fazer essas transformações em uma instituição com mais de 80 anos?
Rocha Neto - O Bradesco é uma corporação com uma cultura muito forte. Estamos fazendo uma pesquisa com todos os 84,7 mil funcionários para saber: o que eu faço que devo continuar fazendo? O que eu faço que devo parar de fazer? E o que eu não faço que deveria fazer? Estamos fazendo isso para reformular, melhorar e modernizar nossa cultura para perpetuar a organização nas próximas décadas.