A Via - para o futuro da humanidade, obra mais recente do parisiense Edgar Morin, nascido em 1921, um dos maiores pensadores contemporâneos, em síntese enfoca o caminho para a reestruturação de práticas e pensamentos coletivos na sociedade. Ao fim e ao cabo, Morin, autor de Cabeça bem-feita e A religação dos saberes, entre outras obras fundamentais, responde à seguinte pergunta: estamos caminhando para uma cadeia de desastres? Para dar conta da questão, o autor dividiu o volume em quatro partes. A regeneração das relações sociais e a busca de alternativas para reduzir a pobreza e a desigualdade; as bases da democracia cognitiva, da reforma e da educação, da formação de intelectuais policompetentes e multidimensionais; os problemas cotidianos e as reformas morais necessárias, no campo da medicina e relações familiares, por exemplo. Conflitos étnicos, religiosos, políticos, instabilidade econômica, degradação da biosfera, derrocada das sociedades tradicionais e, ao mesmo tempo, da modernidade, eis o cenário de nosso tempo. Mesmo com melancolia, mesmo sentindo que não estará presente num futuro breve, o velho mestre não desiste da esperança de um mundo melhor. Mesmo com as inúmeras crises e os vários conflitos, cujos responsáveis diretos são a mundialização, a ocidentalização e o desenvolvimento, Morin vê dois caminhos para a humanidade: o abismo ou a metamorfose. Para ir rumo ao primeiro, não é necessário muito esforço, pois nossas carências e incompreensões nos levam fácil para lá. Para ir na direção do segundo, é preciso muito cuidado na busca da direção certa. Para um futuro melhor, é preciso reestruturar práticas e pensamentos coletivos em nossa sociedade, algo que somente será viável quando se toma a metamorfose como meta prioritária, utopia realizável, sonho possível. “Boas ideias são raras, demoram muito tempo para se concretizar. É preciso, portanto, engajar-se com ardor, paciência e revolta nas vias reformadoras para que a Via se estabeleça e se concretize na contramão das desigualdades, das intolerâncias, dos tecnoprofetismos que se espalharam sobre a face da Terra-Pátria”, escreve Edgard de Assis Carvalho na apresentação. É isso, não podemos nos dispersar. “Eu reúno o disperso” é o mote de Morin, que pode ser o mote de todos. O autor pensa num segundo volume. Bertrand Brasil, 392 páginas, tradução de Edgard de Assis Carvalho e Mariza Perassi Bosco, mdireto@record.com.br.
Lançamentos
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A descoberta da cidade - Memórias em Porto Alegre, coletânea organizada pelo professor e escritor Luís Augusto Fischer, traz textos de vinte e quatro autores, alunos das oficinas de Fischer. São, como diz Rodrigo Rosp na introdução, polaroides de luxo e retratos com infinitas dimensões sobre vivências, afetos e lugares da cidade. Dublinense, 256 páginas, www.dublinense.com.br.
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Crônicas da surdez, de Paula Pfeifer, formada em Ciência Social e funcionária do Tesouro do Estado, mostra como venceu os obstáculos por sofrer de deficiência auditiva bilateral neurossensorial progressiva. O blog Crônicas da surdez tem milhares de acessos mensais, de vários países, e fala de tecnologia, preconceito e bullying de modo leve. Plexus Editora, 150 páginas, www.plexus.com.br.
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Contos de fadas sangrentos, de Rosana Rios com ilustrações de Jean-Claude R. Alphen, traz contos pouco conhecidos e muito mais assustadores, como O noivo ladrão e O pássaro de fogo. Os elementos primordiais das narrativas são mantidos e a autora resgata, com habilidade, a essência e o vigor dos contos de fadas mais antigos. Farol Literário, 80 páginas, www.editoradcl.com.br.
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O motorista, do jornalista e escritor norte-americano Duane Swierczynski, mostra Lennon, um motorista de fuga mudo, que se meteu com ladrões, em dia e banco errados. Traído, roubado e espancado até a suposta morte, não desiste e vai atrás do prejuízo. Máfias, policiais corruptores e matador de aluguel vão aparecer neste “trem-fantasma”. Editora Rocco, 224 páginas, www.rocco.com.br.
E palavras...
Páscoa, Papa Francisco e o carisma de todos nós
Páscoa é momento de pensar em renascimento, em Jesus Cristo e em carisma, palavra que tem origem cristã e que depois passou a ser usada por todos. O Papa Francisco está encantando o mundo com sua simplicidade, seu sorriso e seu carisma. É legítimo esperar muito dele e do seu carisma, especialmente nós, latino-americanos, habitantes do fim do mundo, como ele mesmo disse, brincando, depois de ser escolhido Papa. É bom que a gente o abençoe e passe carisma também como ele pediu. Semana passada, a revista Voto, dirigida pela jornalista Karim Miskulin que trata de política, cultura e negócios e tem como editora a Rosane Frigeri, promoveu um encontro com Germano Rigotto e Sérgio Zambiasi para falar sobre carisma. Durante mais de duas horas, Rigotto, Zambiasi e os convidados conversaram, animada e profundamente, sobre o tema. Antigamente, carisma era considerado dom divino e graça concedida pelo Espírito Santo, depois passou a ser o conjunto de qualidades inerentes a um certo tipo de líder e, finalmente, carisma hoje é aquela luz na testa, aquele brilho nos olhos e outros sinais que fazem qualquer pessoa se destacar e iluminar o ambiente. São Francisco de Assis, considerado o homem do segundo milênio pela revista Time, Napoleão Bonaparte e Madre Teresa de Calcutá são considerados carismáticos do bem, enquanto que Hitler, por exemplo, seria carismático do mal. O fundamental é o uso do carisma para coisas boas, seja em casa, na política, no trabalho, onde for. Mais importante é se dar conta de que todos nós temos a capacidade de, ao menos por alguns momentos e em alguns lugares, de sermos carismáticos. Carisma tem de ser democrático, universal e todo mundo deve ter direito a alguns minutos dele. Só os tais quinze minutos atuais de fama para cada um não bastam. Sempre é bom lembrar o que disse Madre Teresa: se te aproximas de alguém, é melhor sair do encontro melhor do que quando chegaste. É isso. Bom aproveitar a Semana Santa para fazer reviver coisas, pessoas, ações, emoções e pensamentos. Bom pensar que todas as pessoas e formas de vida merecem respeito e carregam algum carisma, ainda que escondido, aguardando o momento para se revelar. O carisma do Papa Francisco vai ajudar o mundo, mas temos que fazer a nossa parte. Não pergunte o que o carisma pode fazer por ti, pergunte o que tu podes fazer por ele. Por aí. Feliz Páscoa! (Jaime Cimenti)
E versos
Vocação
Mas para que tanta habilidade
em dizer a verdade
se eu mesmo tenho baralhado e distribuído
as palavras mais fáceis
vencendo o jogo com trapaças;
se as minhas palavras
como trunfos de cartas bem lançadas
fazem cócegas no ouvido
da multidão na praça?
Mas para que,
se eu conduzo a intriga e os negócios
com audácia,
se controlo nos cordéis a mão da massa
aquela raça que vota e me consagra
na urna casta?
Fernando Fortes, em
De olho na morte antes, Ateliê Editorial,
www.atelie.com.br.