Em um caso de enriquecimento ilícito - alvo de uma ação popular - o TJRS confirmou na semana passada a condenação de Marco Antônio Lopes Peixoto, Iradir Pietroski e Alexandre Postal, à devolução de valores recebidos indevidamente a título de supostas licenças-prêmios. As quantias individuais são R$ 447.943,85, R$ 300.593,90 e R$ 471.519,84 em valores nominais. Os três réus são, respectivamente, presidente, vice-presidente e corregedor do Tribunal de Contas do Estado do RS. A recente decisão judicial indeferiu o recurso de embargos de declaração interpostos pelos réus. As três cifras a serem devolvidas totalizam, em valores nominais, R$ 1.220.057,49. Cálculo extraoficial - via aplicativo “Calculadora do Cidadão” disponibilizado pelo Banco Central - indica o total atualizado de R$ 1.615.339,78. Os pagamentos feitos a Peixoto, Pietroski e Postal ocorreram em março de 2020. Na ocasião, conselheiros e funcionários da Corte de Contas receberam, no total, R$ 28 milhões, de uma só vez: foram pagamentos a título de férias, licenças-prêmios e penduricalhos supostamente atrasados.
Em reação, um mês depois, 16 pessoas ingressaram com uma ação popular. A iniciativa foi liderada pelos deputados Fábio Ostermann e Giuseppe Riesgo, do Partido Novo e pelo atual prefeito de Porto Alegre (PMDB) Sebastião Melo, que à época era parlamentar estadual. A ação questionou que “para atribuir suposta legalidade dos pagamentos a Peixoto, Pietroski e Postal, o Tribunal de Contas considerou retroativamente o período em que os três tinham sido deputados”.
Os três conselheiros réus, a seu turno, argumentaram que “não se pode imaginar uma atividade mais tipicamente associada à prestação de um serviço público do que a nobre atividade parlamentar”. Referiram também que no artigo 50 da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público “está a base legal da concessão da licença-prêmio, o que é compatível com o reconhecimento do tempo de atividade parlamentar para o cômputo do tempo de serviço que é requisito para a obtenção da vantagem”.
Em julho de 2022, sentença proferida pela juíza Cristina Luísa Marquesan da Silva, da 1ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre, referiu que os conselheiros do TCE/RS - assim como os magistrados - são considerados agentes políticos e não servidores públicos, possuindo direito à licença-prêmio por força da simetria com o Ministério Público Federal. Mas ressalvou expressamente “não haver condições legais para misturar dois regimes jurídicos distintos, a fim de embasar o direito ao tempo de cômputo de períodos de licença-prêmio não gozados”.
Os três conselheiros apelaram e seu recurso foi improvido em 19 de dezembro de 2024. A 3ª Câmara Cível reconheceu “a inexistência de autorização legal para o cômputo do tempo de mandato eletivo para fins de concessão de licença-prêmio”. Houve novo recurso (embargos de declaração) dos três ex-deputados e atuais conselheiros. Segundo sua peça processual, houve “omissão no acórdão quanto à falta de impugnação do ato originário de averbação do tempo de serviço, devendo ser reconhecida a inépcia da inicial”.
O voto do desembargador relator Leonel Ohlweiler, proferido na última quinta-feira (21), observou que “as três partes embargantes pretendem desnaturar a finalidade dos embargos de declaração, mas o seu recurso não se presta para modificar uma decisão em sua essência”. A ação popular já tem cinco anos e quatro meses de tramitação. Em outubro próximo, o TCE gaúcho elege sua nova direção para o biênio seguinte. A Corte usa, atualmente, o slogan “Fiscalizando o presente, orientando o futuro”. (Processo nº 5014699-48.2020.8.21.0001).
O País dos tribunais
O Judiciário brasileiro tinha em 31 de dezembro de 2024 mais de 84 milhões de processos. Foram 10% a mais do que no ano anterior e o triplo da média per capita europeia. Nas 91 Cortes do nosso País, a demora média é de quatro anos para o julgamento definitivo. E cada magistrado (com seus respectivos assessores) decide em média 2.000 demandas por ano.
No Brasil, existem 18.911 magistrados/as, considerando as esferas estadual e federal, informa o CNJ. O Poder Judiciário como um todo, incluindo servidores e outros membros, possui um total de 91 tribunais e 275.581 servidores, informa o STF.
Pilhas de milhões e ...
O Departamento de Imprensa do TJRS atendeu a um pedido do Espaço Vital e informou números atualizados até 30 de junho de 2025. No primeiro grau, há 4.263.479 processos em tramitação. E, no segundo grau, são 227.633. Total: 4.491.112.
E na sexta-feira (22), a OAB gaúcha fechou a semana com 99.939 advogados inscritos. São 52.467 do gênero feminino e 47.472 do masculino. Os estagiários são 529. As jovens também estão em supremacia: elas são 275; eles, 254.
Barreiras jurídicas
No Brasil, há um paradoxo significativo: apesar de o País contar com 1.456.157 advogados/as — cerca de um profissional para cada 164 habitantes, segundo dados da OAB nacional —, milhões de brasileiros das classes C, D e E ainda enfrentam dificuldades para acessar o sistema de Justiça. Tal realidade evidencia barreiras estruturais que vão além da simples (in) disponibilidade de profissionais. Há aspectos econômicos, sociais e burocráticos que dificultam o acesso à proteção legal para grande parte da população.
Dados da Defensoria Pública da União - e de entidades ligadas às defensorias do País - revelam que mais de 70 milhões de pessoas não têm acesso regular à Justiça. Seja por falta de conhecimento, por dificuldades financeiras ou por ausência de assistência pública, grande parte da população vulnerável convive com violações de direitos que jamais chegam ao Judiciário. Das 276 subseções da Justiça Federal no País, apenas 78 contam com atendimento regular da DPU, o que representa menos de 30% da cobertura necessária.
Esplêndidas mudanças
Depois de anunciar que não pretendia apresentar uma "proposta de reforma administrativa apocalíptica para evitar que ela fracassasse no Congresso", o coordenador do grupo de trabalho sobre tal tema na Câmara, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), mudou de ideia. Ainda bem! O seu parecer vai atacar alguns dos principais privilégios do Judiciário e do Ministério Público. Entre eles está o fim das férias de 60 dias e a proibição da venda de parte do período. A ideia, segundo o parlamentar, é que as férias de magistrados, procuradores e promotores passem a ser de 30 dias anuais de descanso. Como já é a regra para todos os profissionais dos setores público e privado.
Também há a intenção de defenestrar a aposentadoria compulsória (com dinheirama garantida) para juízes e desembargadores que cometem malfeitos - aqui empregando um substantivo suave.
Mais um ficha limpa
Transitou em julgado a decisão do ministro Dias Toffoli que livrou o doleiro Alberto Youssef de todos os atos da Operação Lava-Jato. Como a PGR não recorreu, Youssef é agora um... ficha limpa!
São voltas que o mundo dá.
Cidadãos inseguros
O Brasil é um dos países mais violentos do mundo, com 38 mil assassinatos em 2024. A taxa brasileira, de 19,2 mortes por 100 mil habitantes, é quase dez vezes superior à da Europa, que é de 2,1 óbitos violentos.
Além disso, nos últimos anos, as facções se espalharam pelos estados e fortaleceram as conexões internacionais.
Ué, e não foram presos?
Três secretários parlamentares, lotados nos gabinetes de três deputados federais diferentes, possuem mandados de prisão em aberto contra si há pelo menos dois meses. E, mesmo assim, exercem normalmente as suas atividades na Câmara. Esses três comissionados foram nomeados entre dezembro de 2024 e abril deste ano pelos parlamentares Josivaldo Melo (PSD-MA), Luciano Alves (PSD-PR) e Dagoberto Nogueira (PSDB-MS).
O jornal O Estado de S. Paulo cruzou as bases de dados de servidores comissionados da Câmara e do Banco Nacional de Mandados de Prisão. Este atualmente contabiliza mais de 250 mil ordens pendentes de cumprimento. Foram identificados 240 nomes iguais nas duas listas. Os casos identificados ilustram como a falta de comunicação entre órgãos públicos permite que pessoas com pendências no sistema de Justiça exerçam livremente as suas atividades e até recebam salários de instituições estatais sem serem identificados e levados a responder por seus atos.
Em tempo: o número de funcionários da Câmara Federal ultrapassa 11 mil.