Marco A. Birnfeld
O jovem juiz, em início de carreira, chegara à comarca havia cinco dias. Ele queria impor disciplina, ordem, respeito, controle das tarefas e intransigência nos prazos. E já na primeira semana marcou uma reunião virtual. Seria às 17h30min da sexta-feira seguinte. Todos deveriam estar em seus respectivos postos de trabalho, para pontualmente conversarem online com o chefe.
Não se poderia dizer que o magistrado estivesse contaminado pela juizite. Mas estava evidente que ele queria marcar território.
Depois de dois minutos de apresentação protocolar e rápidas mesuras, ele perguntou:
- Quem é o mais antigo servidor da comarca?
Um oficial de justiça levantou a mão e se apresentou com um gritado "Sou eu!"
- Diga-me seu nome! - falou o juiz, indo direto ao ponto.
- Beleza, excelência! - respondeu o meirinho.
Na tentativa de descontrair, mas pouco prudente, o magistrado perguntou em seguida:
- Com 'b' maiúsculo ou com 'b' minúsculo - é nome de gente?...
A resposta chegou por meio de outra pergunta, pronta, incisiva e sutil do oficial:
- Meritíssimo doutor ... e Pinto é sobrenome humano?...
Houve rápidas risadas em tempo real, que logo se transformaram em profundo silêncio.
Em menos de cinco minutos, encerrou-se a reunião, com os agradecimentos do magistrado "pela presença e cooperação de todos".
Para pensar
A inteligência artificial (IA) é uma tecnologia que permite que computadores e máquinas simulem o raciocínio e a aprendizagem humanas. Ela visa criar sistemas capazes de executar tarefas que, normalmente, exigem inteligência humana, como entender linguagem, reconhecer padrões e... tomar decisões!
Seus sistemas podem refletir e amplificar vieses presentes nos dados em que são "treinados". Isso leva a decisões injustas e discriminatórias. Advogados militantes e magistrados com regular prestação jurisdicional sabem disso.
Conduta corrupta
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a decisão da Controladoria-Geral da União (CGU) que aplicou multa de R$ 86 milhões à Vale S. A. por omitir informações sobre a estabilidade da barragem de Brumadinho (MG). Ali, o rompimento em 2019, resultou em uma tragédia ambiental com 272 mortes.
O tribunal indeferiu mandado de segurança interposto pela Vale. E confirmou a aplicação da Lei nº 12.846/2013 - a chamada lei anticorrupção, reforçando a responsabilização de empresas por condutas que atentem contra a administração pública. (Processo MS nº 29690).
Salários turbinados
O governo Lula está garantindo renda extra a 323 aliados que nomeou para conselhos de estatais ou de empresas privadas das quais a União é acionista. Esses cargos rendem remunerações apenas pela participação em reuniões dos colegiados, realizadas periodicamente.
Com os adicionais, os valores dos contracheques podem chegar a mais de R$ 80 mil. O benefício alcança ministros, secretários-executivos, chefes de gabinete, assessores do Palácio do Planalto, servidores comissionados, dirigentes do PT, ex-parlamentares do partido e até apadrinhados do Congresso.
República da toga
O Congresso aprovou um projeto de lei que poderá dificultar aos cidadãos o acesso a informações sobre os contracheques de magistrados e membros do Ministério Público. É evidente o drible à transparência. Esse projeto chancelado por deputados e senadores - e que aguarda a sanção, ou o veto, de Lula - altera um dispositivo da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). E passa a prever que a divulgação de "dados pessoais" dessas autoridades "sempre leve em consideração o risco inerente ao desempenho de suas atribuições".
Na prática, pode permitir que dados públicos sobre salários desses servidores sejam omitidos, num contexto de discussão sobre as altas remunerações no Judiciário.
É graças aos mecanismos de transparência que o brasileiro fica sabendo que, no fim do ano, ocorre a "dezembrada". É quando um integrante de carreira jurídica pode ganhar até R$ 700 mil por mês. É um jeitinho - ou até, mesmo "jeitão" - para extrapolar o atual teto constitucional de R$ 46.366,19. Tal em decorrência da profusão de penduricalhos autoconcedidos por decisões administrativas de conselhos superiores da magistratura e do Ministério Público.
Pirotecnia fatal
A 7ª Turma do TST manteve a indenização de R$ 400 mil à viúva e ao filho de um auxiliar de produção morto - por queimaduras - em explosão na Condor S/A Indústria Química, empresa de artigos pirotécnicos, com sede em Nova Iguaçu (RJ).
O julgado considerou a empregadora "responsável pela morte do trabalhador, em razão da falta de segurança no ambiente de trabalho e da ausência de comprovação de caso fortuito".
O acórdão assinalou que "trabalhadores que lidam com a fabricação de artigos pirotécnicos atuam com pólvora e estão expostos a riscos à sua integridade física superiores aos dos empregados de outras atividades". Detalhe: a empresa já havia passado por outros acidentes, sobretudo relacionados a incêndios e explosões". A ação tramita há sete anos. (Processo nº AIRR-101606-05.2018.5.01.0223).
Luz na rapidez jurisdicional
A Corregedoria-Geral de Justiça do Maranhão mantém a sindicância sobre a conduta do juiz Tonny Carvalho Araújo Luz, por suposto "uso inadequado de ferramentas de inteligência artificial". Sua rotina inflou acentuadamente a "produção" na 2ª Vara da Comarca de Balsas. O município tem 100 mil habitantes e fica a 810 quilômetros da capital São Luís.
A apuração preliminar indica que a estratégia do juiz Luz fez saltar sua média de 80 sentenças mensais nos primeiros sete meses de 2024 para 969 em apenas um mês (agosto). Foi um desempenho 12 vezes maior, com o uso de "pesquisas de precedentes jurisprudenciais por meio de ferramentas de inteligência artificial generativas abertas e não homologadas pelos órgãos de controle do Poder Judiciário". Detalhe admitido pela Corregedoria: "nas sentenças também estariam precedentes inexistentes".
O último em competitividade
O Brasil ficou em último lugar no mais recente ranking de competitividade industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI). O levantamento - que é realizado anualmente desde 2010 - comparou 18 nações das Américas, Europa e Ásia que disputam os mesmos mercados de exportação e importação. Os cinco países da América do Sul listados ocuparam as posições finais: Chile (14º), Argentina (15º), Colômbia (16º), Peru (17º); Brasil (18º). Os Países Baixos, os Estados Unidos e a Coreia do Sul estão na liderança.
No relatório Competitividade Brasil - 2023/2024, a mais recente versão do levantamento realizado desde 2010, houve mudanças metodológicas em relação a rankings anteriores. Mas o Brasil - que nunca saiu do terço inferior da classificação - desta vez caiu para a lanterna.
Frenesi automobilístico
Com um palavrório rebuscado, a Audi - empresa automobilística alemã fabricante de veículos de luxo, que faz parte do grupo Volkswagen - está informando que a terceira geração do modelo, agora chamado de "novo A5", chega no segundo semestre para substituir o "A4, irmão mais velho". Segundo o release, o novel combina dinâmica de condução, conforto, segurança e tecnologia embarcados em um patamar inédito. Produzidos na unidade fabril sediada na cidade de Neckarsulm, na Alemanha, "os veículos chegam com o seu interior centrado na experiência do ser humano, atendendo às necessidades dos usuários"... (entenderam?)
A versão mais econômica do A5 custará R$ 359.990 e o espécime mais completo chegará a R$ 863.990. A sempre atilada radiocorredor advocatícia gaúcha especula que a notícia do lançamento despertará emoções entre algumas cabeças pensantes do TribunAUDI justiça gaúcho.