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Cinema
Hélio Nascimento

Hélio Nascimento

Publicada em 30 de Outubro de 2025 às 18:06

A grande ameaça

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Hélio Nascimento
Kathryn Bingelow, a diretora de Casa de dinamite, domina amplamente todos os meios de expressão do cinema. Duplamente vencedora do Oscar, melhor filme e melhor direção, em 2008, por Guerra ao Terror, ela é interessada em levar às telas temas como o terrorismo e o papel vivido por seu país no cenário internacional. Seu cinema, além do compromisso de estar sintonizado com temas que fazem parte da atualidade, tem o objetivo de colocar o espectador diante de acontecimentos cujo conhecimento é obrigatório para que o painel atual seja contemplado em sua totalidade. Seu filme mais recente se difere, em termos realistas, de  tal tendência, mas não representa qualquer tipo de contradição, na medida em que, partindo de uma possibilidade, constrói uma ficção marcada pelo realismo, a ponto de seu filme se assemelhar, em muitas de suas passagens, a um documentário, focalizado em algo tão indesejável quanto possível. Muito bem assessorada por técnicos e conhecedores de meandros relacionados com a segurança numa fase em que são várias as potências nucleares, a cineasta realizou um filme que prende a atenção do início ao fim, inclusive pela forma adotada para contar esta história que coloca personagens diante de uma situação aterrorizante, talvez a última enfrentada pela civilização.
Kathryn Bingelow, a diretora de Casa de dinamite, domina amplamente todos os meios de expressão do cinema. Duplamente vencedora do Oscar, melhor filme e melhor direção, em 2008, por Guerra ao Terror, ela é interessada em levar às telas temas como o terrorismo e o papel vivido por seu país no cenário internacional. Seu cinema, além do compromisso de estar sintonizado com temas que fazem parte da atualidade, tem o objetivo de colocar o espectador diante de acontecimentos cujo conhecimento é obrigatório para que o painel atual seja contemplado em sua totalidade. Seu filme mais recente se difere, em termos realistas, de  tal tendência, mas não representa qualquer tipo de contradição, na medida em que, partindo de uma possibilidade, constrói uma ficção marcada pelo realismo, a ponto de seu filme se assemelhar, em muitas de suas passagens, a um documentário, focalizado em algo tão indesejável quanto possível. Muito bem assessorada por técnicos e conhecedores de meandros relacionados com a segurança numa fase em que são várias as potências nucleares, a cineasta realizou um filme que prende a atenção do início ao fim, inclusive pela forma adotada para contar esta história que coloca personagens diante de uma situação aterrorizante, talvez a última enfrentada pela civilização.
No que se relaciona ao estilo de narrativa adotado, Casa de dinamite é original na medida em que o tempo real é ampliado pelo fato de os acontecimentos, decorridos em pouco tempo, serem vividos por personagens cuja ação é acompanhada em partes diferentes, com o drama, sempre o mesmo, vivido por vários personagens.  Dessa forma o filme se afasta de obras como A hora final, de Stanley Kramer, dirigido em 1959, Limite de segurança, de Sidney Lumet, produzido em 1964, e Doutor Fantástico, de Stanley Kubrick, uma sátira tão brilhante como perturbadora realizada no mesmo ano, filmes que se assemelham pela escolha do tema. Além de concentrar a ação em poucos minutos, transformados em quase duas horas de projeção, a realizadora faz com que som e imagens só se completam depois de todas as partes do filme sejam vistas em tempos diferentes, como se aos poucos, mas não em ordem cronológica, as tentativas de proteção possam ser integralmente acompanhadas, processo no qual a memória do espectador exerce papel decisivo. Mas não há dificuldade em acompanhar o que acontece, pois o que é acrescentado apenas aumenta a compreensão do que antes havia sido registrado. E os planos que mostram pessoas procurando abrigos reforçam a constatação de que não apenas estamos vendo técnicos tentando evitar o pior. E também a diretora não esquece os brinquedos, entre eles um dinossauro, uma referência a um filme de Spielberg, e também uma lembrança de que pesquisas diversas, na medida em que empreendidas por humanos, podem levar a desastres.
Exibido nos cinemas de várias cidades, o filme de Bingelow, que tem entre seus produtores a Netflix, não está em Porto Alegre em salas exibidoras. O fato, mais um a evidenciar o atraso atual do sistema exibidor local, evita que o filme seja apreciado de forma mais apropriada. Quanto maior o espaço e os meios de exibição de um filme, mais os interessados ganham possibilidades de ver o que lhes interessa.  Mas o que merece reparo é a diminuição de tais espaços, principalmente quanto à forma original, até hoje insuperável, é abandonada. A própria produtora citada admite tal fato, a ponto de adquirir cinemas e até mostrar interesse em adquirir o controle de empresas cinematográficas. Além disso, em outros centros, antes de lançar cópias para uso doméstico, providencia exibições em cinemas, de modo geral com grande sucesso. Os cinemas, é claro, já não possuem absoluto controle sobre a imagem em movimento, mas perderão ainda mais se não valorizarem a programação e não apresentarem condições exemplares de projeção. Eis outro perigo que está ameaçando o cinema, uma forma de arte-indústria que não poderá viver apenas de festivais e exibições especiais. A imagem reduzida não deverá ser o símbolo de um tempo, cumpre que o espaço maior seja um cenário de resistência. A ameaça não é apenas nuclear.

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