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Cinema

- Publicada em 07 de Setembro de 2023 às 18:20

O desafio

O diretor Guy Nattiv, que tem em sua filmografia um curta-metragem, Skin, premiado com o Oscar da categoria, no mesmo ano de 2018 servindo de base para um longa-metragem, se integra ao grupo de cineastas que colocaram na tela figuras importantes do século passado com o filme Golda - A mulher de uma nação, dedicado àquela que foi a primeira-ministra de Israel entre os anos de 1969 e 1974. O período foi marcado pelo atentado contra a delegação de Israel durante as Olímpiadas de Munique, em 1972, e pela Guerra do Yom Kippur, em 1973. O conflito ocorrido há cinquenta anos teve início quando Síria e Egito, apoiados pela então União Soviética, atacaram o país. Ao contrário do que se poderia esperar, o filme não privilegia aspectos políticos e nem procura se deter em detalhes destinados a colocar em cena temas relacionados a aspectos históricos. Em alguns momentos, como na exigência que o governo egípcio deixe de utilizar o termo "estado sionista" e trate o estado agredido pelo nome certo, o relato se aproxima de questões políticas, mas a grande maioria das cenas é dedicada a uma mulher que, ao mesmo tempo, enfrenta um câncer e uma agressão armada à nação por ela governada. São duas batalhas focalizadas de forma a evitar qualquer canto de louvor, substituído por uma série de sequências que paralelamente reconstituem a guerra acompanhada em gabinetes e o sofrimento gerado pelas mortes de combatentes, que não são apenas peças movidas sobre mapas, cenário que transforma o horror numa espécie de jogo.
O diretor Guy Nattiv, que tem em sua filmografia um curta-metragem, Skin, premiado com o Oscar da categoria, no mesmo ano de 2018 servindo de base para um longa-metragem, se integra ao grupo de cineastas que colocaram na tela figuras importantes do século passado com o filme Golda - A mulher de uma nação, dedicado àquela que foi a primeira-ministra de Israel entre os anos de 1969 e 1974. O período foi marcado pelo atentado contra a delegação de Israel durante as Olímpiadas de Munique, em 1972, e pela Guerra do Yom Kippur, em 1973. O conflito ocorrido há cinquenta anos teve início quando Síria e Egito, apoiados pela então União Soviética, atacaram o país. Ao contrário do que se poderia esperar, o filme não privilegia aspectos políticos e nem procura se deter em detalhes destinados a colocar em cena temas relacionados a aspectos históricos. Em alguns momentos, como na exigência que o governo egípcio deixe de utilizar o termo "estado sionista" e trate o estado agredido pelo nome certo, o relato se aproxima de questões políticas, mas a grande maioria das cenas é dedicada a uma mulher que, ao mesmo tempo, enfrenta um câncer e uma agressão armada à nação por ela governada. São duas batalhas focalizadas de forma a evitar qualquer canto de louvor, substituído por uma série de sequências que paralelamente reconstituem a guerra acompanhada em gabinetes e o sofrimento gerado pelas mortes de combatentes, que não são apenas peças movidas sobre mapas, cenário que transforma o horror numa espécie de jogo.
Talvez o diretor Nattiv, nascido no ano da guerra, talvez tenha visto em alguma retrospectiva o clássico Almas em chamas, realizado em 1949, no qual o diretor Henri King reconstituía o cotidiano de aviadores americanos sediados em Londres durante a segunda Guerra Mundial e no qual Gregory Peck interpretava um comandante abalado emocionalmente pelas perdas de vidas durante ataques ao território alemão. O filme foi um dos primeiros a dar mais ênfase aos conflitos humanos no interior da base do que aos combates, que eram inseridos na narrativa em cenas captadas por documentaristas durante os ataques. No filme de Nattiv, as cenas de guerra também são poucas e detalhes são omitidos. O essencial é realçar a dor das perdas, simbolizada no sofrimento de uma funcionária que perde o filho nos combates, numa cena em que o primeiro plano cumpre de forma exemplar a função primordial de registrar a dor materializada no rosto da atriz Helen Mirren, em outro desempenho marcante. E no pesadelo, quando o telefone se transforma em instrumento que capta o som e a fúria que transformam o ser humana em alvo e vítima, é registrada a agressividade no seu ponto mais extremado, quando então a personagem principal se transforma numa figura que é perseguida por um monstro, cuja forma não é revelada,
Em um filme dedicado a uma protagonista envolvida em duas batalhas, não podem passar despercebidos os momentos em que a dirigente é levada para sessões de quimioterapia, passando por salas onde a morte é significativamente representada. E há também o caderno no qual Golda vai anotando o número de mortos em combate e mais dois momentos em que uma exposição de contradições aparece. O primeiro é o diálogo entre Kissinger e Meir, quando o primeiro deixa claro a sua hierarquia pessoal e lembra a nacionalidade de Tolstoi, oportunidade para a primeira-ministra citar Dostoievski. E a sequência final, marcada pelo encontro de líderes após o conflito, quando gentilezas e sorrisos dominam a imagem, talvez involuntariamente é banhada de alguma ironia, após todo o sofrimento registrado. Esta harmonia superficial é amenizada pela dedicatória que o cineasta insere antes dos créditos finais de um filme que procura escapar da simples exaltação, o que seria um elogio à agressividade. Em vez disso, Nativ procura fazer o espectador contemplar angústias e compulsões, registradas nas imagens, como na quase constante presença do cigarro, algo do qual a protagonista não consegue se livrar. O filme, sem dúvida, é um retrato de uma figura incomum, que, por ser humana, é imperfeita. E até por isso não imune à ação da justiça suprema de seu país, como o filme também registra.