O Projeto de Lei 4/2025, de autoria do senador Rodrigo Pacheco (PSD), tramita atualmente no Senado. A proposta pretende fazer uma reforma profunda no Código Civil brasileiro alterando mais de 1.200 dos 2060 artigos existentes. As mudanças vão abranger temas como direito da família, sucessões, contratos e direito digital. Dentre as alterações, estão 13 que vão interferir no método como as arbitragens jurídicas são realizadas atualmente. A arbitragem é um método alternativo de solução de disputas privado, que através de uma figura imparcial acordada entre as partes, o árbitro, busca resolver impasses de forma célere, sem precisar passar pelos trâmites legais tradicionais. Para o vice-presidente do Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr), o advogado Guilherme Nitschke, a parte da reforma que toca no tema vai gerar insegurança jurídica. ‘’As alterações propostas criam figuras que não existem na arbitragem, além de reverter normas alteradas recentemente’’, afirma.Dentre as figuras que ele entende que foram inseridas indevidamente está a citação. ‘’Citação arbitral não existe. O que temos atualmente é uma notificação pela Câmara de arbitragem para que a parte compareça por meio do seu advogado’’, explica. Segundo ele, este é um ponto que demonstra desconhecimento dos proponentes do PL sobre o tema. Nitschke também alerta para a alteração na base de cálculos para juros moratórios. ‘’O país viveu mais de 20 anos sob a incerteza de qual índice era aplicável a esses casos. Ano passado foi aprovada a lei 14.905/2024 que alterou o Art. 406 do Código Civil, consolidando a jurisprudência do STJ para o uso da taxa Selic’’, explica. O PL 4/2025 propõe que a taxa volte a ser de 1% ao mês. Para o vice-presidente da CBAr, mudanças tão próximas em um ponto tão importante vão gerar desinteresse dos investidores estrangeiros que não sabem se a lei que vige hoje vai ser a que vige amanhã.Outro ponto para o qual advogado chama a atenção na proposta, são as mudanças referentes às indenizações, os valores poderão ser fixados em até quatro vezes o valor do dano. Na visão de Nitschke ‘’O custo dessas mudanças é atroz para a economia brasileira. Vai gerar desinvestimento e insegurança jurídica’’. Os riscos da Inteligência ArtificialA rápida evolução das inteligências artificiais generativas, faz com que essa tecnologia seja testada em cada vez mais funções. Como era de se imaginar, isso também tem acontecido nos processos jurídicos, e a arbitragem não escapa dessa realidade. A doutora e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Giovanna Benetti entende que a inserção das IAs pode ser produtiva, mas é necessário entender que os limites do seu uso sejam bem delimitados, o que não acontece no cenário atual. Recentemente a associação que trata de arbitragens nos Estados Unidos, a American Arbitration Association criou uma ferramenta que chamaram de AI Arbitrator. Ela funciona como uma espécie de assistente jurídico que analisa aspectos práticos do caso, faz resumos das manifestações e redige um rascunho de decisão. Só então, essa decisão vai ser submetida a um árbitro humano. Segundo a AAA a ferramenta vai reduzir de 20% a 25% o tempo de resolução de casos, tendo uma economia de cerca de 35% dos custos envolvidos. Se por um lado existem esses possíveis ganhos, para Benetti, essas tecnologias também trazem muitos riscos. A doutora chama atenção para o cuidado com a qualidade das decisões, ‘’Nós não temos acesso às informações que alimentam esses sistemas’’, isso pode gerar um viés específico para uma corrente jurídica em detrimento de outra. Ainda mais preocupante é o que ela chama de ‘alucinação algorítmica’, quando a IA cria algo que não existe. ‘’Nós já tivemos aqui no âmbito do poder judiciário algumas situações em que o recurso não foi admitido porque tinha decisões inexistentes. Ou o juiz recebeu uma repreenda da corregedoria porque utilizou também de procedimentos ineficientes’’. Para a professora o uso mais adequado da IA no sistema judiciário seria nos trabalhos administrativos, aqueles mais braçais, e não os mais subjetivos e que dependem de uma análise mais aprofundada, como são as decisões. Mas mesmo nesses casos, ainda é necessário uma análise quanto à segurança de dados, já que as informações inseridas no sistema são muitas vezes sensíveis, e a sustentabilidade. Cada vez mais os órgãos refletem sobre esse ponto, já que as IAs consomem muitos recursos. O assunto foi tema do Meeting Jurídico da Federasul, “Arbitragem em Transformação: os Impactos da IA e da Reforma do Código Civil”, no dia 5 de dezembro.
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