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Publicada em 05 de Maio de 2025 às 19:58

Novas regras para transporte aéreo de pets avançam na Justiça

Caso de cão que faleceu após embarcar em voo errado expôs falhas no sistema de proteção aos animais

Caso de cão que faleceu após embarcar em voo errado expôs falhas no sistema de proteção aos animais

Instagram/Reprodução/JC
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Gabriel Margonar
Gabriel Margonar
A morte do cão Joca, em abril de 2024, após ser embarcado por engano em um voo da Gol com destino errado, comoveu o País e expôs as falhas nas regras de transporte aéreo de animais no Brasil. A repercussão levou à criação de um projeto de lei que estabelece diretrizes mais rígidas para o setor. Aprovada pelo Senado há duas semanas, a proposta — batizada de Lei Joca — retorna agora à Câmara dos Deputados, onde precisa ser votada novamente devido às alterações feitas pelos senadores.
A morte do cão Joca, em abril de 2024, após ser embarcado por engano em um voo da Gol com destino errado, comoveu o País e expôs as falhas nas regras de transporte aéreo de animais no Brasil. A repercussão levou à criação de um projeto de lei que estabelece diretrizes mais rígidas para o setor. Aprovada pelo Senado há duas semanas, a proposta — batizada de Lei Joca — retorna agora à Câmara dos Deputados, onde precisa ser votada novamente devido às alterações feitas pelos senadores.
O texto determina que as companhias aéreas ofereçam condições apropriadas para o transporte de cães e gatos, com equipes capacitadas, monitoramento contínuo e comunicação transparente com os tutores. Um dos pilares do projeto é a responsabilização objetiva das empresas: elas poderão ser cobradas por danos aos animais mesmo sem comprovação de culpa.
Relatora do projeto, a senadora Margareth Buzetti (PSD-MT) consolidou propostas de quatro diferentes iniciativas legislativas. "Até hoje, o transporte era regulado apenas por normas internas das companhias. Agora, teremos uma legislação clara, que deverá ser cumprida", afirmou. Ela citou ainda o caso da cadela Pandora, extraviada por 45 dias entre 2021 e 2022, como outro exemplo da urgência por regulamentação.
Entre os pontos centrais da Lei Joca está a exigência de que as empresas mantenham informações atualizadas sobre os serviços oferecidos, respeitando protocolos de segurança. A versão original do projeto previa a presença de veterinários nos aeroportos de grande porte, mas a proposta foi retirada após avaliação da relatora, que a considerou excessiva.
A legislação também amplia as possibilidades de transporte na cabine, desde que respeitados os limites de peso e tamanho estabelecidos pelas companhias. Já para o compartimento de carga, passa a ser obrigatório um sistema de monitoramento constante. "A empresa não poderá mais alegar desconhecimento ou isenção de culpa. A responsabilidade será objetiva, independentemente de dolo ou negligência", explica o advogado Rodrigo Alvim Pereira, especialista em Direito dos Passageiros.
Para a defensora dos animais Paola Saldivia, fundadora do Instituto Eu Salvo Vidas, a nova legislação traz alívio para tutores e mais dignidade para os animais. "Já é bastante estressante para os pets entrar em um bagageiro, ficar confinados e longe de seus tutores por horas. A possibilidade de mantê-los na cabine representa um ganho significativo para o bem-estar deles e para a segurança emocional de quem cuida", avalia.
Ela destaca que a nova legislação representa um reconhecimento da sensibilidade dos animais. "Eles sentem dor, medo e afeto. Não podem ser tratados como malas ou objetos. A Lei Joca é um passo importante porque reforça que essas vidas importam e merecem respeito", afirma. Casos de recusa ao transporte seguem previstos, desde que justificados por razões técnicas ou de segurança, como risco à tripulação ou problemas de saúde que inviabilizem o voo. Situações consideradas abusivas, no entanto, poderão ser questionadas judicialmente.
Apesar dos avanços, há pontos que ainda exigem regulamentação complementar. "A lei define os princípios, mas os detalhes técnicos, como o tipo de monitoramento ou a capacitação das equipes, dependerão de normas infralegais futuras. Esse é um ponto vulnerável do texto", observa Pereira. Outro aspecto sensível é o impacto econômico: embora a proposta não autorize expressamente o repasse de custos aos passageiros, esse efeito colateral é considerado provável.
Ainda assim, o advogado avalia que o Brasil dá um passo relevante em direção a padrões internacionais. "Países com políticas mais maduras já adotam protocolos de segurança, monitoramento e acompanhamento rigoroso do transporte de animais. Não se trata apenas de logística, mas de respeito à vida. A Lei Joca se alinha a essa visão", afirma.
A proposta se insere em um processo histórico de quase cem anos de consolidação dos direitos dos animais no Brasil. Desde o Decreto 24.645, de 1934 — um marco pioneiro de proteção animal —, passando pela Constituição de 1988, pela Lei de Crimes Ambientais de 1998 e pela Lei Sansão, de 2020, que endureceu as penas para maus-tratos contra cães e gatos, o arcabouço jurídico tem se ampliado. Em julgamentos recentes, o Superior Tribunal de Justiça também reconheceu os animais como seres sencientes, ou seja, com capacidade de sentir e perceber sensações, reforçando esse entendimento.
"Mais do que nunca, os animais estão ganhando a visibilidade que sempre mereceram", afirma Paola. "Anos atrás, raramente se falava em Direitos dos Animais e muitos viviam acorrentados, no fundo dos pátios. Hoje, temos leis que permitem resgatá-los em situação de maus-tratos e oferecer a eles qualidade de vida. A Lei Joca mostra que eles estão, pouco a pouco, ocupando seu espaço como parte da sociedade", finaliza.
 

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