Lançado oficialmente na semana passada, o aplicativo Lulu permite que mulheres avaliem aparência, comportamento, desempenho sexual e nível de comprometimento dos homens. Todas as avaliações são anônimas. Uma nota é calculada e fica visível a qualquer mulher que o utilize e a qualquer pessoa que acesse o site do aplicativo (
www.onlulu.com). O Brasil é o vice-campeão de downloads, atrás apenas dos Estados Unidos, onde o Lulu existe desde fevereiro.
Qualquer homem que possua um perfil no Facebook está sujeito às avaliações. Para a advogada Virgínia Matte Chaves, do Cabanellos Schuh Advogados Associados, o aplicativo já começou errado desde a concepção. “A ideia de privacidade é bastante flexível atualmente. No Lulu, os perfis são criados sem permissão, e todos os comentários e as avaliações são anônimos. Isso viola a Constituição Federal”, explica. Para o advogado Maurício Tavares de Almeida, do PPCS Advogados Associados, além de ferir o artigo 5º da Constituição, o Lulu também infringe o Código do Consumidor. “O aplicativo é um serviço consumido que obtém lucro, mesmo que não se pague por ele”, explica.
O artigo 5º da Constituição Federal de 1988, que expõe garantias e direitos individuais e coletivos dos cidadãos, prevê, no inciso IV, a livre manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. No inciso X, está explícito que a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas são invioláveis. O Lulu garante a proteção da identidade da pessoa que avalia e comenta nos perfis. Entretanto, exibe opiniões que podem vir a denegrir a imagem de quem estiver sendo avaliado e prejudicar relacionamentos profissionais e pessoais. O Lulu garante que quem preferir pode deletar o perfil na rede. Para Virgínia, isso apenas atenua a questão. “Mesmo que o perfil tenha ficado ativo por pouco tempo, a velocidade da internet é absurda. Poucos minutos podem ser muito nocivos”, esclarece a advogada.
De acordo com Almeida, o Facebook também é responsável pela situação. “O Facebook violou termos de privacidade ao permitir que o Lulu se apropriasse dos dados lá expostos”, aponta. “A falta de consentimento é a principal infração. Fotos e nomes não poderiam ser divulgados sem autorização.”
O Marco Civil da Internet, ainda sem previsão de voto, regulamentaria diversas dessas questões, funcionando como uma espécie de constituição para a internet. Situações irregulares de uso de imagem, redes sociais, ofensas em sites de domínio público, criação de perfis falsos e plágio serão regulamentadas pela lei, caso aprovada. Virgínia acredita que muitas dessas questões acerca do Direito Digital podem ser resolvidas com a devida orientação, uma vez que as pessoas precisam entender os riscos e as consequências do mau uso da internet.
A advogada atribui o sucesso do aplicativo no Brasil a questões culturais. “Nossa sociedade está cada vez mais fraca emocionalmente. É surpreendente que tantas pessoas percam tempo com isso”, comenta. Almeida e Virgínia creem que o Lulu deveria ser opcional e com assinaturas. “O anonimato deveria ser excluído. É impossível comprovar a veracidade das opiniões expostas no Lulu. A pessoa avaliada tem o direito de se defender das acusações”, reitera o advogado. Almeida explica que o homem que se sentir lesado ou humilhado pelo aplicativo pode entrar com ação judicial contra o Lulu e também contra o Facebook e exigir que o perfil seja retirado do ar e que uma indenização pelos danos morais causados seja negociada.
Como resposta ao aplicativo criado só para mulheres, está sendo desenvolvido o Tubby-
App, com a mesma proposta, só que inversa: é a vez de os homens avaliarem as mulheres. É provável que o estudante de Direito de São Paulo que processou o Lulu ao descobrir que o nome dele constava como opção para ser avaliado tenha sido apenas o primeiro dos muitos incomodados pelas possíveis difamações e calúnias geradas pelo aplicativo.