As negociações da COP30 (conferência das Nações Unidas sobre mudanças climáticas) começaram a dar forma a um item que pode se juntar à lista das grandes entregas do evento na visão dos representantes brasileiros, o chamado mecanismo de transição justa.
Nas conversas a portas fechadas, China e outros 77 países se uniram e já expressaram apoio ao instrumento, que busca implementar uma transição justa para a descarbonização da economia. O objetivo é garantir que o avanço das energias limpas promova inclusão social e proteção no mercado de trabalho, além do combate aos poluentes climáticos.
O mecanismo debatido é uma proposta voltada a garantir que a transição global para uma economia de baixo carbono ocorra de forma socialmente equilibrada, levando em conta trabalhadores, comunidades e setores econômicos que podem ser afetados pela descarbonização.
A ideia de transição justa foi incorporada ao Acordo de Paris e reconhece a importância de proteger empregos e meios de subsistência durante a transição climática. O tema ganhou força especialmente nas COPs recentes com o apoio de países em desenvolvimento. Em Belém, o apoio cresceu com o G77 China (principal grupo de negociação de países em desenvolvimento nas Nações Unidas).
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O objetivo seria canalizar recursos financeiros, tecnológicos e de capacitação para apoiar regiões e populações mais vulneráveis à transição energética, como trabalhadores de indústrias fósseis e comunidades dependentes desses setores.
Ainda há divergências, no entanto, sobre como operacionalizar o mecanismo, quais indicadores usar para medir progresso e como ele se articularia com outros fundos climáticos existentes. Países desenvolvidos, em geral, pedem clareza sobre sua governança e critérios de elegibilidade, enquanto países do chamado Sul Global defendem que ele deve ser robusto, acessível e com financiamento novo e adicional.
De acordo com observadores, está sendo rejeitada pelos países a proposta do BAM (Mecanismo de Ação de Belém, na sigla em inglês), sugerido pela Climate Action Network (coalizão global de ONGs) e que difere da proposta oficial por ter forte participação da sociedade civil.
Ana Toni, CEO da COP30, afirma que a discussão agora será dedicada a detalhar como esse mecanismo funcionaria na prática e qual sua complementariedade com outros mecanismos similares.
"É um debate mais técnico, não tem um posicionamento de sim ou não. O debate está sendo consistente sobre o que ele significa", afirma à reportagem.
Os países estão discutindo o mecanismo nos braços técnicos da COP. São eles o Órgão Subsidiário de Assessoramento Científico e Tecnológico (SBSTA), responsável por fornecer informações científicas e metodológicas, e o Órgão Subsidiário de Implementação (SBI), encarregado de avaliar a execução dos compromissos assumidos pelos países.
"Esperamos que, no final dessa semana, tenha um relatório técnico para aí sim mandar para o nível mais político, que é na semana que vem", disse Toni, em relação à etapa da reta final com a presença de ministros de cada país.
Na terça-feira passada (11), a China manifestou apoio verbal à proposta. Um representante chinês afirmou que o princípio da transição justa deve ser aplicado não em nível regional ou nacional, mas em nível global e que é um foco dos diplomatas do país na COP30.
Vários outros países fizeram defesas verbais do instrumento, como Egito e Arábia Saudita. O representante da Etiópia, país que receberá a COP32, também exaltou o mecanismo, dizendo que ele financiará países em desenvolvimento na ampliação do acesso a energia limpa e barata.
O avanço das negociações foi comemorado por ambientalistas. "Essa proposta do G77 inicia as negociações sérias para evitar que as ações climáticas acidentalmente joguem as pessoas na pobreza", afirma Teresa Anderson, líder global em Justiça Climática na ActionAid Internacional, em nota.
"Agora é hora de agir para uma transição justa. Os países estão finalmente discutindo de forma séria como os trabalhadores, as mulheres e as comunidades podem moldar os planos climáticos para garantir que suas vidas melhorem, em vez de piorar".
Anfitrião da COP30, o Brasil se destacou e ficou em 1º lugar no Programa de Descarbonização da Indústria (PID), segundo resultado divulgado pelo Fundo de Investimentos Climático (CIF) na última em junho.
Com isso, o País terá acesso ao financiamento de R$ 1,3 bilhão para ampliar tecnologias limpas e circulares, como hidrogênio e materiais de baixo carbono. O Ministério de Minas e Energia (MME) participou da elaboração da proposta aprovada pelo CIF. A partir de agora, deve ser desenvolvido um plano de investimento detalhando os projetos prioritários, instrumentos financeiros e estratégias para atrair investimentos do setor privado, com foco em soluções que contribuam para a transição energética global.
Parte dos recursos será destinada aos projetos de hubs de hidrogênio de baixa emissão de carbono, que serão selecionados pelo MME na chamada pública aberta em outubro de 2024.
"O resultado é fruto do comprometimento do Brasil com políticas voltadas para transição energética e com a construção de ambiente confiável e atrativo para investimentos. Estamos empenhados em promover uma indústria mais limpa, inovadora e competitiva, capaz de gerar empregos de qualidade, movimentar a economia e melhorar a vida da população brasileira. Com apoio do CIF, iremos fortalecer ainda mais nossas ações rumo a um futuro mais sustentável", afirmou o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira.
Descarbonização da indústria
Essa é a primeira iniciativa global de financiamento dedicada à redução de emissões industriais de gases de efeito estufa (GEE) em países em desenvolvimento. A indústria é responsável por um terço das emissões globais de GEE. Serão disponibilizados, ao todo, US$ 1 bilhão, o equivalente a R$ 5,5 bilhões.
26 CANDIDATOS - Para ter acesso aos recursos, 26 candidatos enviaram propostas e o Brasil recebeu a pontuação mais alta. Também foram convidados Egito, México, Namíbia, África do Sul, Turquia e Uzbequistão. Os países selecionados demonstraram forte engajamento do setor privado, prontidão institucional e claro compromisso com a descarbonização industrial, conforme o comunicado do CIF.
A participação do Brasil no Programa de Descarbonização da Indústria (PID) do CIF é coordenada pela Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, com participação dos ministérios de Minas e Energia, do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) e da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
Folhapress