O Dia do Contador, celebrado em 22 de setembro, chega em um momento de profundas transformações para a profissão. Mais do que elaboradores de balanços, os contadores passaram a ocupar papel estratégico nas decisões empresariais. Esse novo cenário é impulsionado pelas Diretrizes Curriculares Nacionais de Ciências Contábeis (DCNs), aprovadas em 2024, que exigem da formação acadêmica uma abordagem centrada em competências analíticas, visão ética e domínio das tecnologias digitais. Para entender como as instituições de ensino estão aplicando essas mudanças, o JC Contabilidade ouviu representantes de quatro universidades gaúchas: Pucrs, Feevale, Ufrgs e Unisinos.
Na Pucrs, a coordenadora do curso de Ciências Contábeis, Sandra Belloli de Vargas, explica que a instituição reformulou o currículo a partir do projeto Trajetórias, que envolveu alunos, ex-alunos e profissionais de mercado para identificar demandas e expectativas. “Passamos de um currículo baseado em disciplinas para um modelo por competências. Isso significa formar o estudante para ser capaz de analisar, propor soluções e compreender o impacto das decisões no negócio, e não apenas acumular conteúdos”, afirma Sandra.
Segundo a professora, a tecnologia também ocupa lugar central no novo modelo pedagógico, com softwares e sistemas sendo utilizados em sala de aula para aproximar os futuros contadores da realidade de mercado. Essa mudança, acrescenta, reflete a necessidade de formar profissionais com visão sistêmica e capacidade de atuar além da elaboração de balanços. “O contador está envolvido em todo o processo de gestão, do planejamento estratégico às decisões de negócios. Ele é um agente fundamental para a sustentabilidade e crescimento das empresas”, ressalta.
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Na Feevale, o coordenador dos cursos de Ciências Contábeis, Gestão Financeira e Ciências Econômicas, João Batista Nast de Lima, lembra que a universidade atualizou em 2024 seu Projeto Pedagógico de Curso para alinhar-se às novas diretrizes, antecipando tendências que só se tornarão obrigatórias em 2026. “O ponto de partida agora não são mais os conteúdos, mas as competências. O aluno assume protagonismo em sua trajetória, sendo instigado a resolver problemas reais com visão analítica e integrada”, explica o coordenador.
O professor ressalta que o curso está estruturado em módulos baseados em competências, metodologias ativas e interdisciplinaridade, integrando ensino, pesquisa, extensão e inovação. “O estudante vivencia desde o início situações concretas do mundo do trabalho, articuladas a temas emergentes como tecnologias digitais, ESG e governança corporativa, construindo uma formação crítica, inovadora e alinhada à missão institucional de produzir informações econômico-financeiras que agreguem valor e contribuam para o desenvolvimento da sociedade”, afirma.
Para ele, a contabilidade precisa ser entendida como instrumento de fortalecimento das empresas diante de um mercado cada vez mais complexo. “O contador deixou de ser apenas registrador do passado. Ele precisa compreender o presente de forma ampla e contribuir com o futuro dos negócios, subsidiando gestores com informações assertivas”, complementa.
Na Ufrgs, a professora do Departamento de Ciências Contábeis e Atuariais e coordenadora da Comissão de Graduação, Caroline de Oliveira Orth, destaca que a universidade tem uma trajetória de ajustes curriculares que antecedeu a Resolução de 2024. Em 2017, já havia sido feita uma ampla atualização, a partir de pesquisas com estudantes, egressos e grupos temáticos, resultando em mudanças implementadas em 2018. “Com a publicação das novas diretrizes, revisamos o Projeto Pedagógico do Curso, mapeando competências e ajustando planos de ensino, sempre com transparência e diálogo com os alunos”, explica Caroline.
Segundo a professora, as mudanças incluem a valorização da extensão, com projetos como Educação Financeira para Todos e Contadores em Ação, que aproximam o estudante da comunidade e estimulam habilidades de comunicação, empatia e engajamento social. Além disso, o curso fortalece o uso de laboratórios de prática contábil, softwares e tecnologias digitais, aproximando os alunos da realidade empresarial.
“As novas DCNs representam uma oportunidade de formar não apenas técnicos, mas agentes de transformação social. O contador precisa ser crítico, criativo e socialmente responsável, capaz de moldar a profissão para uma sociedade mais ética e justa”, defende Caroline.
Na Unisinos, o coordenador do curso de Ciências Contábeis, Jonas Ismael da Silva, lembra que a instituição já vinha estruturando seu currículo por competências antes mesmo da atualização das diretrizes, o que facilitou a adequação. O modelo contempla práticas de laboratório e atividades aplicadas, aproximando o aluno da realidade profissional desde o início da graduação.
“A elevada taxa de empregabilidade dos nossos estudantes, em torno de 92,3%, reflete essa sintonia entre formação e mercado. Optamos por substituir o estágio obrigatório por Laboratórios de Prática, em áreas como Contábil, Fiscal, Financeira, Controladoria e Análise de Dados, que proporcionam uma vivência aplicada e integrada”, explica.
Segundo Silva, outro ponto forte do curso é a ênfase no Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), reformulado para gerar maior aplicabilidade prática. “Esse formato permite ao aluno compreender melhor a relação entre pesquisa e os desafios do dia a dia da profissão”, afirma.
Ele destaca ainda que a Unisinos insere a extensão como eixo central, com projetos desenvolvidos no Núcleo de Educação Financeira e Contábil (Nefic), que abriga iniciativas como o NAF – Núcleo de Apoio Fiscal e Contábil – e o Sufin – Espaço de Sustentabilidade Financeira. “O contador precisa vivenciar não apenas a prática técnica, mas também o impacto social de sua profissão”, ressalta.
Apesar das diferentes trajetórias, as quatro universidades convergem ao apontar que a profissão vive uma transformação histórica. Mais do que dominar normas e técnicas, o contador de hoje é chamado a desenvolver competências analíticas, visão ética e capacidade de dialogar com diferentes áreas do conhecimento. “O futuro já chegou”, resume Sandra, citando o lema da Convenção de Contabilidade do Rio Grande do Sul. Para Lima, esse futuro já está em curso: “o contador estratégico é exigência de mercado, e a formação universitária precisa estar em sintonia com essa realidade”.
Caroline acrescenta que o desafio é ainda maior: “Não basta responder às demandas do mercado, é preciso formar profissionais que ajudem a transformá-lo”. Silva concorda e complementa: “A contabilidade se afirma como ciência aplicada à gestão, e o contador do futuro será cada vez mais protagonista no desenvolvimento das organizações e da sociedade”.
O JC Contabilidade, que completa 23 anos de circulação ininterrupta nesta quinta-feira (18) , tem acompanhado e registrado cada um desses movimentos, reforçando seu papel de ponte entre a academia, os profissionais e o mercado. Neste mês de setembro, ao lado da celebração do Dia do Contador, o suplemento renova seu compromisso de trazer à categoria análises qualificadas, tendências e debates que ajudam a entender o presente e a construir o futuro da profissão.