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Publicada em 15 de Julho de 2025 às 15:39

Tributação Transformadora: um novo pacto fiscal para um mundo em crise

José Andrés Lopes da Costa é mestre em Direito Tributário Internacional pelo IBDT-SP e sócio do DCLC Advogados

José Andrés Lopes da Costa é mestre em Direito Tributário Internacional pelo IBDT-SP e sócio do DCLC Advogados

DCLC Advogados/Divulgação/JC
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José Andrés Lopes da Costa
José Andrés Lopes da Costa
Mestre em Direito Tributário Internacional pelo IBDT-SP e sócio do DCLC Advogados
A crise climática, o aumento da desigualdade e a deslegitimação progressiva do Estado exigem uma nova gramática para o Direito Tributário. Tributação Transformadora (Lumen Juris, 2025) nasce desse diagnóstico e propõe uma reconstrução da arquitetura normativa e institucional do sistema tributário, orientada por valores constitucionais como justiça social, sustentabilidade ambiental e responsabilidade fiscal. Não se trata de utopia, mas de um projeto técnico e juridicamente viável, ancorado na compreensão de que o tributo é mais do que instrumento arrecadatório: é uma forma de moldar a realidade, construir riqueza e moldar o futuro.
A obra parte de uma constatação incômoda: o sistema tributário brasileiro e, em muitos aspectos, o sistema tributário global foi desenhado para uma outra época. Favorece a concentração de riqueza, ignora os custos sociais e ambientais das atividades econômicas e naturaliza a desigualdade sob a justificativa da neutralidade fiscal. Esse modelo não apenas se esgotou como passou a produzir efeitos regressivos. A promessa de eficiência cedeu lugar à corrosão do pacto social e à fragmentação regulatória.
Contra essa lógica, o livro propõe uma virada de chave. Em vez de pensar a tributação apenas como técnica, ela deve ser compreendida como linguagem normativa capaz de induzir comportamentos, reforçar valores e gerar externalidades positivas. O tributo deixa de ser apenas um ônus para se tornar um instrumento de transformação civilizatória. Para isso, é preciso que ele dialogue com os princípios constitucionais materiais, incorpore a dimensão ambiental e reconheça formas econômicas orientadas por finalidades públicas.
A obra desenvolve a ideia de que uma tributação justa é aquela que leva em conta não apenas a capacidade contributiva, mas também a forma como a riqueza é gerada e distribuída. Empresas que atuam com propósito, que internalizam os custos ambientais de suas atividades ou que contribuem para o adensamento institucional da democracia econômica não devem ser tratadas da mesma forma que estruturas exclusivamente voltadas à maximização do retorno financeiro.
O novo sistema tributário permite essa diferenciação, desde que haja critérios objetivos, métricas verificáveis e mecanismos de controle. No plano internacional, o livro propõe uma governança fiscal global baseada na cooperação, na transparência e na justiça intergeracional. Critica a hegemonia dos fóruns técnicos dominados por países desenvolvidos e defende uma normatividade construída com base na criação de um organismo multilateral, dotado de mandato específico para a questão climática, com enforcement progressivo e respeito à soberania fiscal responsável. O modelo de organismos multilaterais como ONU e OCDE é analisado com rigor, mas também com ceticismo. A proposta é mais ambiciosa: criar um arcabouço institucional em que a tributação ambiental global seja possível, legítima e eficaz.
Tributação Transformadora é, no fundo, um chamado à coragem normativa. Um convite para que juristas, formuladores de políticas públicas, empresas e cidadãos repensem o papel do tributo em um mundo que já não tolera soluções parciais. Em tempos de emergência climática e de tensões sociais agudas, não basta tributar mais ou tributar menos. É preciso tributar melhor e com propósito.
A ideia de propósito vai além da clássica função extrafiscal atribuída ao tributo. No modelo tradicional, a extrafiscalidade é tolerada apenas como efeito colateral, um desvio temporário da lógica arrecadatória em nome de alguma finalidade pública secundária. Propósito, aqui, não é sinônimo de intenção política, mas de compromisso jurídico com a transformação de estruturas. Trata-se de uma inversão de paradigma: estruturar o sistema a partir de finalidades legítimas, mensuráveis e permanentes. O tributo, nesse horizonte, deixa de apenas reagir ao mercado e passa a projetar um futuro possível.
 

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