Com a sanção presidencial da Reforma Tributária por meio da Lei Complementar (LC) nº 214, de 16 de janeiro de 2025, que regulamenta o Projeto de Lei Complementar (PLP) 68/2024, todos os segmentos econômicos têm que iniciar o mais rápido possível o processo de transição.
A vice-presidente de gestão do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul (CRCRS) e empresária contábil Patrícia Arruda destaca que algumas normativas ainda estão para serem publicadas, porém, o empresariado não deve perder tempo, porque o início da mudança começa no próximo ano.
De acordo com Patrícia, o CRCRS, através de um grupo de trabalho coordenado por ela, iniciou, em 2024, a Jornada Reforma Tributária - série de eventos pelo Interior do Rio Grande do Sul para oferecer atualização qualificada aos profissionais da contabilidade, empresários e demais interessados no tema.
"Essas visitas só foram pausadas por conta do trabalho do segmento contábil voltado ao período destinado à entrega do Imposto de Renda, porém, neste mês de junho, o grupo retorna às atividades pelo interior gaúcho", informa.
A especialista explica que, entre as mudanças proporcionadas pela reforma tributária, há a introdução de novos impostos e contribuições, como o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo (IS), substituindo tributos existentes como ICMS, ISS, PIS, Cofins e IPI.
Isso, segundo Patrícia, vai promover mudanças a partir de 2026, quando estas novas regras entrarem em vigor e exigirá muito planejamento. "Na realidade, o planejamento deve ocorrer desde agora", alerta.
Em entrevista ao JC Contabilidade, a especialista abordou alguns dos pontos da reforma tributária que podem impactar o setor produtivo gaúcho.
JC Contabilidade – Como a reforma tributária vai impactar os diferentes setores da economia gaúcha?
Patrícia Arruda – A reforma representa uma verdadeira revolução no sistema fiscal brasileiro. A partir de 2026, todos os segmentos da economia, como o agronegócio, a indústria, e os serviços precisarão se adaptar, pois entrará em vigor a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota de 0,9%, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com alíquota de 0,1%. Esse total de 1% poderá ser compensado com tributos do sistema atual. No caso do setor agroindustrial, a mudança será significativa. Será essencial compreender o novo modelo de não cumulatividade plena, especialmente porque produtores que antes não eram contribuintes de determinados tributos passarão a ser. A indústria precisará reavaliar toda a sua cadeia produtiva, incluindo fornecedores. O setor de serviços enfrentará mudanças importantes na forma de tributação e possivelmente na carga tributária. Cada setor deverá realizar adaptações operacionais, tecnológicas e estratégicas específicas. Empresários que não se prepararem adequadamente podem enfrentar aumento da carga tributária e perda de competitividade.
Contab – Qual será o cronograma de transição e como os empresários devem se preparar?
Patrícia – O cronograma de transição foi elaborado para permitir uma adaptação gradual. Em 2026, terá início a cobrança do novo imposto com alíquota de 1%, sendo 0,9% de CBS e 0,1% de IBS. Em 2027, a CBS será cobrada com alíquota cheia, e os tributos PIS e Cofins serão extintos. Também será instituído o Imposto Seletivo. É importante destacar que, em 2026, as empresas que estiverem em conformidade com suas obrigações acessórias estarão dispensadas da obrigatoriedade de recolher o novo imposto. Entre 2029 e 2032, haverá substituição progressiva do ICMS e do ISS pelo IBS. Essa etapa será especialmente relevante para os estados, já que o ICMS representa uma importante fonte de arrecadação estadual. Em 2033, o ICMS e o ISS serão completamente extintos. Durante a transição, o Senado definirá alíquotas de referência, e as empresas precisarão acompanhar atentamente os impactos sobre operações interestaduais e sobre sua competitividade.
Contab – Como a mudança do princípio da origem para o destino afetará empresas gaúchas?
Patrícia – Essa é uma das mudanças mais expressivas da reforma. Hoje, quando uma empresa gaúcha vende para o estado de São Paulo, parte da arrecadação do imposto permanece no Rio Grande do Sul. Com a reforma, essa arrecadação será destinada ao estado de destino do consumo, ou seja, São Paulo nesse exemplo. Para as empresas gaúchas exportadoras, a mudança exigirá sistemas mais sofisticados de controle tributário, capazes de identificar com precisão o destino de cada operação. O impacto será relevante especialmente para o agronegócio e a indústria gaúcha, setores com forte vocação exportadora. Essas empresas precisarão reavaliar suas estratégias logísticas e comerciais, uma vez que a tributação deixará de ser um fator de competitividade regional. Ainda dependemos do Comitê Gestor do IBS para definir como será feita a distribuição dos valores arrecadados.
Contab – Quais setores enfrentarão maiores desafios na gestão de fornecedores?
Patrícia – A gestão de fornecedores se tornará um aspecto estratégico para todos os setores, uma vez que o direito ao crédito tributário será gerado a partir do pagamento dos tributos na cadeia. O setor agroindustrial, que possui uma cadeia extensa envolvendo desde os produtores rurais até fornecedores de insumos, precisará de sistemas de gestão mais robustos. O setor da construção civil também enfrentará dificuldades devido à grande variedade de fornecedores envolvidos. Um dos principais pontos de atenção será a transição dos créditos acumulados. O texto atual da reforma não define regras específicas para compensação dos saldos de PIS e Cofins acumulados até 2026, o que preocupa especialmente as empresas exportadoras. A gestão de compras, que muitas empresas antes não priorizavam, passará a ser essencial. Será fundamental saber de quem comprar e verificar se o fornecedor está em dia com o Fisco, pois isso impactará diretamente na geração dos créditos tributários.
Contab – Que oportunidades a reforma pode trazer e qual o papel da tecnologia?
Patrícia – Apesar dos desafios, a reforma tributária abrirá grandes oportunidades para os profissionais da contabilidade. As empresas precisarão de suporte técnico especializado para enfrentar essa transição, e os profissionais que se qualificarem no novo sistema tributário terão um mercado em expansão. O Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul (CRCRS), por meio da Jornada Reforma Tributária e das palestras realizadas no interior do estado, está preparando os profissionais contábeis para aproveitarem essas oportunidades e oferecerem o melhor suporte possível. A tecnologia terá papel central na reforma, tanto durante o período de transição quanto na consolidação do novo sistema. A apuração correta dos tributos dependerá fortemente de ferramentas tecnológicas, como a Calculadora da CBS, os sistemas de apuração assistida e o próprio sistema de Split Payment, que permitirá o recolhimento do tributo, para alguns segmentos ainda não definidos, no momento do pagamento da prestação de serviço ou do fornecimento da mercadoria. A tecnologia será fundamental para operacionalizar esse modelo de pagamento do tributo.
Conhecer o texto da nova legislação é fundamental, alerta especialista
O objetivo do Conselho Regional de Contabilidade do Rio
Grande do Sul (CRCRS) com a Jornada Reforma Tributária é o de orientar os profissionais da contabilidade e o empresariado, explicando a eles sobre a importância de conhecerem os detalhes da nova legislação. Isso, na visão da vice-presidente de gestão do CRCRS, Patrícia Arruda, vai ajudar os mais variados segmentos da economia para que possam fazer as adaptações operacionais e estratégicas necessárias exigidas pelo novo sistema fiscal.
Para o governo federal, a reforma tributária é fundamental para promover a reestruturação do sistema de impostos sobre o consumo no Brasil. O objetivo central da reforma é simplificar, modernizar e tornar mais justo o sistema de arrecadação de tributos, além de aumentar a eficiência econômica do Brasil.
Patrícia explica que em 2026, o IVA começará a ser implantado com alíquota de 1%, sendo 0,1% do IBS e 0,9% da CBS. Em 2027, por exemplo, iniciará a cobrança da CBS pela alíquota cheia e haverá a extinção do PIS e Cofins. Também será instituído o Imposto Seletivo.
Entre os anos de 2029 e 2032, haverá uma gradual substituição do ICMS e ISS, pelo IBS, então em 2033 esses dois impostos serão extintos e o novo modelo entrará em vigência integralmente. Durante o período de transição, o Senado Federal fixará as alíquotas de referência dos tributos, que serão adotadas automaticamente pela União, Estados e Municípios.
A especialista lembra que, no momento, o empresariado deve conhecer a LC 214, em vigor, que detalha o funcionamento dos novos tributos - CBS e IBS - e as regras de transição para sua adoção completa até 2033. "Há muitos pontos para serem normalizados ainda", enfatiza. Patrícia cita que esta transição é um desafio para os empresários de todos setores econômicos e também para o segmento contábil, que agora têm de atuar em uma nova realidade. Ela também vê novas oportunidades para os contadores e que o uso de tecnologia será fundamental para enfrentar este período.
As empresas terão de fazer mudanças operacionais, tecnológicas e estratégicas para enfrentar a transição para o modelo IVA-Dual. Segundo ela, os empresários que não estiverem preparados poderão correr o risco de enfrentar aumento da carga tributária, falhas de conformidade fiscal e perda de competitividade.
Unificação de uma ampla gama de impostos traz facilidades
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Por outro lado, a vice-presidente de gestão do CRCRS, Patrícia Arruda, explica que, de modo gradativo, com a extinção de tributos federais, estaduais e municipais, haverá a unificação de uma ampla gama de impostos, o que irá tornar mais fácil o entendimento da legislação por parte das empresas e contribuintes no geral.
A especialista também vê desafios na transição dos créditos tributários na reforma tributária. Segundo Patrícia, o texto atual não inclui normas específicas para a compensação dos saldos de créditos de PIS/Cofins acumulados até o final de 2026. "Vai ser muito importante o empresário saber de quem irá comprar; quem será o seu fornecedor. Então, esta gestão de compras, que antigamente nem todas as empresas davam muita atenção, a partir da reforma tributária se torna um ponto muito importante", cita. Mas regulamentações futuras deverão ser estabelecidas por meio de Lei Complementar ou de Instruções Normativas, para diminuir as dúvidas.
A reforma tributária prevê o ressarcimento ou a compensação dos créditos acumulados dos tributos atuais, e traz ainda a não cumulatividade plena, para os créditos e para os débitos, na apuração do imposto.
Outro aspecto da reforma tributária será a adoção do princípio do destino, a arrecadação passará da produção para o consumo, ou seja, para os estados e municípios em que estão localizados os consumidores. "A partir da reforma tributária, a tributação vai ser no destino e não na origem. Então, se a empresa está localizada em Porto Alegre, o tributo deverá ser pago para a cidade que estiver comprando (a mercadoria ou o serviço). E, reforçando que este ponto depende ainda do Comitê Gestor do IBS, que deverá deixar claro, através de normativos, como será a distribuição dos valores arrecadados", elucida.
Patrícia também explica o surgimento, no Brasil, do método criado pela EC 132/23 e regulamentado pela LC 214/24, chamado de "Split payment". Neste sistema, o recolhimento dos tributos se dará no momento do pagamento pelo bem ou serviço, ainda pendente de regulamentação do percentual e dos segmentos da economia que utilizarão essa forma de pagamento de tributo.