Pesquisa sobre mulheres e inovação no agronegócio aponta desafios de gênero

Profissionais ainda enfrentam desafios para serem ouvidas e respeitadas

Por JC

Dalana destaca que participantes do levantamento da PwC atuam do campo à mesa do consumidor
A fim de identificar e construir, de forma propositiva, um agronegócio mais inclusivo, a pesquisa #MulheresQueInovamOAgro chegou à sua segunda edição em 2023. Iniciativa do hub de inovação AgTech Garage - parte do network PwC, que é referência em inovação no agro na América Latina - a pesquisa contou com a participação de 838 respondentes de todo o Brasil, que puderam expressar sua visão sobre a atuação feminina no setor por meio de um questionário virtual com 25 perguntas de múltipla escolha, que ficou disponível de 15 de agosto a 10 de setembro. Entre elas, 47,1% residem no Estado de São Paulo, 14,2% em Minas Gerais, 6,6% em Mato Grosso, 5,7% no Paraná e 4,8% no Rio Grande do Sul.
Dalana de Matos, Estrategista de Inovação do AgTech Garage (PwC) e uma das idealizadoras da pesquisa, afirma que o recorte proporcionou um panorama amplo da cadeia do agronegócio, com participantes que atuam do campo à mesa do consumidor. "Estamos falando de uma amostra de 838 respondentes que atuam inovando o agro antes da porteira, dentro da porteira e depois da porteira. Um sinal de que a tecnologia tem contribuído para criar novas oportunidades de carreiras, atrair e reter talentos femininos no setor", diz.
"Tivemos uma excelente receptividade da pesquisa no Rio Grande do Sul na fase de captação de resultados, e podemos afirmar que esta será fundamental para o ecossistema de inovação se aprofundar no contexto das mulheres que atuam no agronegócio gaúcho e nacional. Igualmente, os dados levantados dão possibilidade de se proporem ações afirmativas de mudança em prol de uma maior equidade de gênero no segmento", esclarece Elisa Simão, Sócia e Líder do Centro de Excelência para Cooperativas de Crédito da PwC Brasil.

Elisa destaca receptividade da pesquisa entre as gaúchas
"Tivemos uma excelente receptividade da pesquisa no Rio Grande do Sul na fase de captação de resultados, e podemos afirmar que esta será fundamental para o ecossistema de inovação se aprofundar no contexto das mulheres que atuam no agronegócio gaúcho e nacional. Igualmente, os dados levantados dão possibilidade de se proporem ações afirmativas de mudança em prol de uma maior equidade de gênero no segmento", esclarece Elisa Simão, Sócia e Líder do Centro de Excelência para Cooperativas de Crédito da PwC Brasil.

Quem são elas

.

As mulheres de 25 a 55 anos foram a maioria entre as respondentes, 85,7% da amostra. Assim como as profissionais casadas (54,4%), autodeclaradas brancas (76,3%), que se identificam como cisgêneras (90,4%) e que não têm filhos (52,2%). Como identificado na edição 2021 da pesquisa, as #MulheresQueInovamOAgro são altamente instruídas e 64,5% delas têm, no mínimo, pós-graduação. Como área de formação, 35,6% vêm das Ciências Agrárias; 32,3% das Ciências Humanas; 19,1% das Ciências Exatas e 8,1% das Ciências Biológicas. Apenas 4,9% informaram não ter formação técnica. Além disso, 55,3% das respondentes afirmam ter iniciado suas carreiras no setor, enquanto 44,7% fizeram transições de carreira.

Em relação à cadeia do agronegócio, elas se fazem presentes em todas as etapas produtivas. Das áreas administrativas do setor (37%) à prestação de serviços (34%), desenvolvimento de tecnologias (22,9%), produção agrícola (19%), P&D (18,6%), pecuária (12,9%), produção de insumos (11,9%), comercialização e distribuição (9,8%), agroindústrias (9,7%), tradings (4,4%) até o mercado consumidor (6%). E trabalham a partir de empresas de diversos portes: grandes (500+ colaboradores) 41,8%; médias (100 a 499 colaboradores) 13%; micro ou pequena empresa (até 99 colaboradores) 11,6%; propriedade rural 11,7%; startup 8,2%; consultoria 5,3%; academia ou instituto de pesquisa 1,4%; ONGs e terceiro setor 1,4%.

Entre as respondentes, há uma predominância ainda de mulheres em cargos de liderança e gestão. Quase um quarto delas se identifica como proprietária ou co-fundadora de empresas (21,1%), gerente (18,9%) e especialista (16,8%). As coordenadoras (10,7%) e diretoras (6,6%) também têm representatividade na amostra. As estagiárias são 1,8% e as estudantes, 3,2%. As mulheres na operação somam 12,1% e 8,8% se identificam na categoria outros.

Cenário e desafios


Contudo, independentemente do seu grau de instrução, tamanho da corporação, do elo da cadeia ou da posição hierárquica, as mulheres que decidiram fazer carreira no agronegócio estão sujeitas a desafios. Na pesquisa, 9 em cada 10 relataram já terem passado por situações de machismo ou constrangimento no ambiente de trabalho.

A exemplo das situações abaixo:
•Interrupção masculina em uma conversa (Manterrupting): 53,7%
•Pouca representação em eventos e reuniões: 50,4%
•Explicação de algo óbvio por pessoas do sexo masculino (Mansplaining): 47,5%
•Falta de serem chamadas para contribuir em assuntos que dominam: 45,3%
•Apropriação de ideias (Bropriating): 37,7%
•Dominação da conversa/sequestro de assunto por homens (Manologue): 37,7%
•Repetição da explicação dada anteriormente (Hepeating): 36,7%
•Elevação do tom da voz de um terceiro para provar seu ponto:30,9%
•Anulação em uma discussão: 26,5%
•Violência psicológica com distorção da realidade (Gaslighting): 23,2%
•Julgamento pela maneira como estava se vestindo: 18,3%
•Xingamentos ou comunicação desrespeitosa: 11,3%
•Outros: 2,6%
•Apenas 12,6% responderam não ter sido impactadas por nenhuma dessas situações.
LEIA TAMBÉM: Qualificação profissional no agronegócio cresce nível de exigência

Comportamento e capacitação

.
Quando perguntadas se encontram acolhimento trabalhando no agronegócio, 76,7% disseram que sim, versus não (13,3%) e não sei dizer (10%). Para Dalana, esta ambiguidade demonstra o quão complexo é o cenário. "Ao mesmo tempo em que 9 em cada 10 mulheres enfrentam situações de machismo ou constrangimento no ambiente de trabalho, 8 em cada 10 afirma se sentir acolhida trabalhando no agronegócio. A união feminina apareceu na pesquisa como uma grande força para seguirmos avançando rumo à equidade de gênero e acredito que ajude a explicar essa ambiguidade", diz.
Quando o assunto é a origem da transformação no cenário em que vivemos hoje, a esmagadora maioria credita os avanços recentes à mudança no comportamento das mulheres, com maior independência (84,4%) e à maior união entre as mulheres (54,1%). Outros 40,7% são atribuídos a ações de inclusão em empresas privadas; 24,2% à transformação social desde as escolas; 24% a políticas públicas de equidade de gênero e 22,7% ao apoio financeiro ao empreendedorismo feminino. Somente 13,7% das entrevistadas acreditam que a transformação em curso também tenha relação com a mudança no comportamento masculino.
Na pesquisa, as mulheres relataram se apoiar em cursos de capacitação (56,5%); grupos de mulheres (52,2%); apoio psicológico (36,9%); mentoria de carreira (36,3%); comitês de diversidade (17,5%); políticas de inclusão (13,4%) e canais de denúncia (6,4%) para suportarem sua atuação frente os desafios do setor.
Inovação e Tecnologia
Na visão das respondentes, o principal desafio para promover a inovação no agronegócio está na mudança cultural (69,8%) e na capacitação das pessoas (58,7%), estruturais para edificar o futuro do setor. Em relação aos movimentos que terão maior impacto a longo prazo para o agronegócio, as #MulheresQueInovamOAgro enxergam a tríade avanços tecnológicos (75,9%), mudanças climáticas (71,4%) e pessoas, com a mudança comportamental e geracional (55%), direcionando os passos que serão percorridos nos próximos anos.
"Mais do que nunca, as características que, por muito tempo, foram entendidas como sinais de fraqueza e incapacidade de uma gestão firme por parte das mulheres, hoje são vistas como forças que nos permitem olhar com sensibilidade e integridade para os desafios da humanidade. Não foi por acaso que o empoderamento das mulheres tornou-se um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU", afirma Dalana.