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Turismo

- Publicada em 23 de Julho de 2022 às 15:00

Pampa gaúcho busca se tornar polo turístico de vinhos e olivas

Pampa gaúcho se transforma para fomentar eno e olivoturismo

Pampa gaúcho se transforma para fomentar eno e olivoturismo


/Vinícola Peruzzo/Divulgação/JC
Lívia Araújo, especial para o JC*
Lívia Araújo, especial para o JC*
As paisagens vastas, o frio intensificado pelo inclemente vento minuano, as grandes distâncias entre municípios e uma cultura econômica exclusivamente focada na agropecuária fizeram com que o Pampa gaúcho, apesar de sua beleza, fosse um pouco negligenciado em investimentos no turismo. No entanto, nos últimos anos, diversas iniciativas têm provado que a região tem um potencial a ser aproveitado, justamente a partir das culturas agrícolas e das atividades-fim das propriedades pampeanas.

Pousada Villa Toscana funciona como uma espécie de 'casa-hospedagem' para turistas em Bagé

Pousada Villa Toscana funciona como uma espécie de 'casa-hospedagem' para turistas em Bagé


Villa Toscana/Divulgação/JC
Cada vez mais turistas têm vindo aos dez municípios do Pampa gaúcho para percorrer os terroirs onde há produção de azeite e vinhos, mas também para participar de eventos, conhecer a cultura geográfica e histórica da região, e de bônus, esticar sua viagem até os freeshops de Aceguá, no lado uruguaio.
O centro desse fluxo é Bagé, a cerca de 380km de Porto Alegre. É lá que fica sede da Associação Pampa Gaúcho de Turismo (Apatur), que representa atualmente dez municípios: Aceguá, Bagé, Caçapava do Sul, Candiota, Dom Pedrito, Hulha Negra, Lavras do Sul, Pedras Altas, Pinheiro Machado e Santana do Livramento, que recentemente se uniu ao Pampa.
As iniciativas turísticas tiveram um espaço exclusivo para expor as atrações da região no início do mês de junho: foi a Expopampa, primeira feira especializada em turismo na região, que trouxe expositores e participantes dos dez municípios integrantes da Apatur. Municípios e empresas apresentaram roteiros com foco em turismo rural, enoturismo, olivoturismo, turismo urbano e turismo de natureza, além das diferentes estruturas de hospedagem existentes na região.
Até então, o maior afluxo de público de outras regiões e estados se dava principalmente por causa do setor de eventos, como feiras agrícolas e do setor de pecuária.
"A história do Rio Grande do Sul começou no Pampa Gaúcho. Apesar disso, os órgãos públicos sempre priorizaram iniciativas de outras regiões, como a da Serra", situa a empresária Clori Peruzzo, presidente da Apatur. "No entanto, temos várias qualificações: produzimos carnes premium, temos vinhos e azeites de alta qualidade... por isso começamos a tentar entender esse território e seu potencial", explica.
Segundo Peruzzo, a associação tem se aproximado do Poder Público em cada município, buscando parceria nas iniciativas e a divulgação dos roteiros. Igualmente, a própria Apatur já funciona como uma instância de governança regional, de acordo com as normas e critérios do ministério do Turismo, podendo ser incluído em roteiros oficiais.
Uma das atrações é a Rota dos vinhos da campanha gaúcha, existente desde 2015. "É ela que representa o maior fluxo de turistas de todo o Brasil: Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e outros estados além, principalmente, da Região Metropolitana de Porto Alegre, que vêm visitar as 18 vinícolas que estão numa área que abrange de Candiota a Santana do Livramento", apresenta Peruzzo.
"O nosso turismo é muito ligado aos produtos da agricultura e da agropecuária, é esse nosso diferencial". Segundo Peruzzo, esse "clique" para o turismo veio a partir de uma maior busca de diversificação nos negócios dos produtores rurais.
A região também está atenta para modalidades turísticas pouco comuns não só no Pampa, mas no Brasil como um todo, como o cicloturismo. "Estamos criando, em parceria com a Secretaria do Desenvolvimento de Bagé, uma rota de cicloturismo internacional que irá de Bagé a Aceguá, no Uruguai, passando por paisagens de tirar o fôlego", promete.
Peruzzo também ressalta o crescimento do interesse na própria área urbana de Bagé e dos outros municípios do Pampa, que contam com um casario de relevância histórica, museus, monumentos e outras atrações.
"O patrimônio arquitetônico de Bagé é impressionante e faz parte do roteiro das vinícolas. Os visitantes pousam em Bagé em fazem um city tour pelo centro histórico".
Outra atração bageense citada pela empresária tem um vínculo com o cinema e a literatura, mais notadamente a do autor Erico Verissimo: é o Parque do Gaúcho. "É lá que está localizada a cidade cenográfica de Santa Fé, onde se passa a história O Tempo e O Vento. O Poder Público está nos ajudando em um projeto de restauro desse espaço, que é muito lindo", revela.
Como empresária, a própria presidente da Apatur participa dos roteiros propostos na região. Ela é proprietária de uma vinícola familiar, a Peruzzo, inaugurada em 2008, cuja área fica a 10km no Centro de Bagé. "Nós mesmos, quando construímos a vinícola, não pensávamos muito em turismo. Queríamos produzir bons vinhos e vendê-los", admite.
Porém, a empresária, com o tempo, viu que atrair visitantes era também uma oportunidade de impulsionar a vinícola comercialmente, e a empresa investiu para se tornar um espaço especialmente atrativo para enoturistas. Junto com a visita aos vinhedos e à produção, a empresa realiza agendamentos para almoços e jantares. Clori Peruzzo também já está construindo cabanas para receber hóspedes e está nos planos a construção de um museu na propriedade, com temática automobilística.
"A família possui uma pequena coleção de carros antigos e queremos abrir esse patrimônio à visitação do público", revela. De acordo com a empresária, o investimento em turismo representa um grande aprendizado para o empresariado dos pampas.
 

Bagé trabalha para ampliar disponibilidade de hotéis e pousadas e oferecer novas vagas

Empreendimentos investem em cada detalhe para receber bem o público

Empreendimentos investem em cada detalhe para receber bem o público


/Villa Toscana/Divulgação/JC
A maior parte da oferta hoteleira da região do Pampa está em cidades maiores como Bagé e Santana do Livramento, mas o número atual de apartamentos disponíveis não tem sido suficiente para dar conta de uma demanda crescente do setor de eventos, mas também do turismo - mas isso não deixa de ser um motivo de comemoração por parte das iniciativas de fomento da área.
Segundo Clori Peruzzo, da Apatur, só Bagé tem disponíveis cerca de 1.700 apartamentos. Por ocasião de alguns eventos da região, o público que aflui divide sua hospedagem entre Bagé e Santana do Livramento, a 160km de distância. "Mas temos hotéis sendo construídos, outros reformados, além de projetos de cabanas e pousadas. Então creio que, em breve, isso vá se resolver", garante a empresária.
Uma das ações da Apatur foi na qualificação do potencial receptivo, principalmente durante a pandemia, quando o fluxo de público do turismo e eventos empresariais teve uma grande diminuição.
"Apesar da desmotivação trazida pela pandemia, buscamos junto a instituições como Senac e Sebrae, cursos de aperfeiçoamento em todas as áreas", pontua Peruzzo. E, mais recentemente, as melhorias têm sido constantes, tanto com o aprimoramento de locais e serviços, quanto com a criação de novos espaços. "Um hotel com 100 apartamentos está em construção, há outro com 50 apartamentos está sendo reformado, outro empreendimento está construindo cabanas que poderão receber entre 30 a 40 pessoas ao todo", enumera, projetando que até o fim do ano essa oferta de vagas estará operante.
Um dos estabelecimentos presente nesse movimento, que abriu para hospedagem há cerca de dois meses, é a pousada Villa Toscana, localizada a 7km do centro de Bagé - 15 minutos de carro - e que, segundo a gerente-geral Marinei Paiva Sá, funciona como uma "casa-hospedagem". "É por ser uma operação mais íntima, realmente como uma casa, em que todos os cômodos podem ser acessados. E é hospedagem, porque, como em hotel, servimos café da manhã e temos serviço de camareira", explica.
A casa histórica, que tem quase 600m² e 11 quartos e que está localizada em uma propriedade com cerca de 45 hectares e que conta com plantações de oliveira, dedicou-se, nos últimos sete anos, a receber grupos para eventos particulares como casamentos e aniversários e, dada a demanda por locais de hospedagem, citada por Clori Peruzzo, investiu em receber um público que deseja permanecer na região principalmente para fazer turismo.
Por enquanto, aponta a gerente-geral, a operação tem sido abrir para grupos de pessoas, com reservas de, no mínimo, três dias de antecedência, para locar o espaço. "Essa tem sido a experiência, mas poderemos, ao longo dos meses, experimentar um funcionamento de hotel, com recepção 24 horas". Os agendamentos para o segundo semestre estão quase esgotados.
O Villa Toscana busca também ele mesmo ser um atrativo para quem se hospeda, oferecendo atividades na propriedade, como passeios aos olivais, e um happy hour com tábua de frios, e espumante, em um deck diante do lago da propriedade, com a ampla vista do pôr do sol do Pampa.
 

Experiência de conhecer oliveiras pela primeira vez surpreende visitantes, conta produtor

Propriedade Cerros de Gaya produz para a fábrica de azeites Terra Pampa

Propriedade Cerros de Gaya produz para a fábrica de azeites Terra Pampa


/Rodrigo Severo/Divulgação/JC
Acostumados com azeites espanhóis e portugueses, e azeitonas em conserva, quem mora em cidade grande e não está habituado ao ambiente rural, muitos visitantes dos lagares do Pampa têm a experiência de ver um olival pela primeira vez.
É o que conta o produtor André Previtalli, sócio do lagar - local destinado à produção de azeites - Terra Pampa, e proprietário dos Cerros de Gaya, área rural com parreiras e olivais e aberto à visitação. "Tem gente de São Paulo e Minas Gerais que nunca nem sequer viram uma azeitona no pé", relata. São turistas que ficam fascinados pela a vasta terra do Pampa Gaúcho e a vista ampla do horizonte em 360 graus, alcançado até a fronteira com o Uruguai.
Entre os meses de março e abril, período em que se dá a safra das azeitonas, a Terra Pampa recebe grandes grupos de visitantes que podem acompanhar todo o processo, que vai da colheita à produção do azeite. "Nosso lagar já é preparado para esse tipo de visita. Todo o local já foi pensado de forma a expor a produção para quem vem de fora", explica Previtalli.
Segundo o produtor, a Terra Pampa, que fica ao lado do Aeroporto de Bagé, recebe uma média de cinco grupos do 30 pessoas por mês, além de grupos pequenos nos fins de semana, que agendam para conhecer a fábrica. Tanto ele quanto os outros 10 produtores associados na Terra Pampa realizam atividades para o público externo, que incluem cursos de harmonização, degustação de azeites e receitas que envolvem a iguaria.
Especificamente na propriedade Terra Gaya, de Previtalli, a vista privilegiada do pampa atrai um público que vem contemplar, a partir do fim da tarde, o exuberante pôr do sol pampeano, regado aos próprios vinhos produzidos pelos terroirs da região.
Tanto a produção de azeitonas quanto de uvas vieram de programas de incentivos à fruticultura na região, que investe também na produção de pêssego. "A questão do clima nos diferencia do resto do Estado. Temos verões com dias escaldantes e, no inverno, a temperatura é muito baixa. É isso o que a cultura da oliveira e da parreira querem, e por isso estamos produzindo azeites e vinhos de alta qualidade", evidencia Clori Peruzzo, da Apatur.
Previtalli concorda, e acrescenta que os planos são de expansão. O produtor conta que a Terra Pampa, na safra 2022, produziu 160 toneladas de azeitona, dos quais o rendimento para a extração do azeite é de 10% a 12%. "São entre 16 a 18 mil litros, o que ainda é pouco para atender a um mercado tão grande", admite. Previtalli diz que os olivais ainda são novos, que passaram até agora por uma média de quatro a cinco safras.
Contudo, somente em sua propriedade, são 35 hectares plantados, cuja produção está concentrada ainda em 12 hectares - ou seja, é uma questão de tempo. "Com o maquinário que temos, há condições de atendermos 100 hectares, que são as áreas que temos reunidas. Portanto, para o ano que vem, está nos nossos planos, além de comprar outras máquinas, também ampliar nossa planta, senão não conseguiremos suprir os pedidos", detalha. Atualmente, a Terra Pampa vende para o Rio Grande do Sul e está expandindo o fornecimento também para outros estados, com produção para terceiros, inclusive.
Certamente, a expansão desses negócios vem atrelada ao turismo. No caso dos lagares, pontua Clori Peruzzo, todos os municípios abrangidos pela Apatur têm propriedades com olivais, que devem atrair mais e mais visitantes nos próximos anos a partir dos investimentos realizados.
 

*Lívia Araújo é jornalista formada pela Unesp, no Estado de São Paulo. Trabalhou na editoria de política do JC entre 2014 e 2020 e atualmente é editora de livros e sócia na Diadorim Editora, de Porto Alegre.