O novo Código Estadual do Meio Ambiente (Cema) - que deve ser sancionado pelo governador Eduardo Leite (PSDB) nos próximos dias - retira o poder de decisão dos conselhos das Unidades de Conservação (UCs). O novo Cema transforma em órgãos consultivos os conselhos deliberativos existentes no Rio Grande do Sul. Ou seja, apenas poderão dar sugestões à diretoria das UCs, que é indicada pelo governo.
O Estado tem 23 UCs, além de duas reservas particulares. Conforme o professor do Instituto de Biociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) e coordenador-geral do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (Ingá), Paulo Brack, o Rio Grande do Sul é o estado da região sul com menor área coberta por UCs - apenas 2,5% do território gaúcho.
As UCs se dividem em dois tipos: as de Proteção Integral, cujo objetivo é a preservação da natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais; e de Uso Sustentável, cujo objetivo é compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais.
Hoje, parte das UCs tem conselhos deliberativos na sua estrutura administrativa, com o poder de vetar, através do voto da maioria dos seus representantes, medidas propostas pelo próprio governo. Também podem apontar ações. Os colegiados são compostos por representantes do setor agropecuário, de indústrias, entidades de pesquisa da área ambiental, órgãos ambientalistas, membros do governo do Estado, das prefeituras onde as unidades estão localizadas, entre outras entidades.
O novo código prevê que apenas dois tipos de Unidades de Uso Sustentável podem ter conselhos deliberativos: as Reservas de Desenvolvimento Sustentável e as Reservas Extrativistas. Contudo, o Estado não possui nenhum desses dois tipos de Unidades de Conservação no Rio Grande do Sul. Por isso, na prática, a medida extingue os conselhos deliberados das UCs gaúchas.
A retirada de poder dos conselhos é criticada por especialistas, como o geólogo Sérgio Cardoso, que representa o Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí no colegiado da Área de Proteção Ambiental (APA) do Banhado Grande. Esta APA é a maior do Rio Grande do Sul, englobando os municípios de Glorinha, Gravataí, Viamão e Santo Antônio da Patrulha. É uma Unidade de Conservação de Uso Sustentável, com atividades como produção de arroz, por exemplo.
"O novo código quer transformar os conselhos em algo parecido com um grupo de amigos, que se reúne uma vez por mês, apenas para assistir ao que o gestor fez ou deixou de fazer. É um absurdo. Os colegiados devem ter poder de definição das políticas públicas. Não pode ser só o gestor de plantão quem decide. O gestor tem que deliberar com a sociedade, inclusive para definir sua corresponsabilidade na preservação do meio ambiente", analisa.
E complementa: "No momento em que tira do órgão colegiado a competência de ser deliberativo, tira a capacidade da sociedade de influenciar na política pública. O esvaziamento dos espaços de participação da sociedade vai dar margem para o governo fazer da unidade o que for do seu interesse".
'Estamos apenas nivelando a legislação estadual às normas federais', diz Lemos. Foto: Luiza Prado/JC
O secretário estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura, Artur Lemos (PSDB), justifica a mudança nos conselhos: "A legislação federal prevê as duas UCs que podem ter conselho deliberativo (Reservas de Desenvolvimento Sustentável e as Extrativistas). Para as demais, prevê conselhos consultivos. Estamos apenas nivelando a legislação estadual às normas federais)".
Lemos reconhece que os conselhos deliberativos são úteis à gestão das Unidades de Conservação, mas sustenta que a manutenção desses colegiados traria insegurança jurídica ao Estado, porque a legislação estadual manteria órgãos deliberativos em unidades que não estão previstas na legislação federal.